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01/08/08

A TENTAÇÃO NUCLEAR (*)

Mário Martins

Sala de controle de energia nuclear


A actual crise do petróleo está a provocar graves problemas económicos e sociais e a desorientar o mundo político, mas a impressionante subida do seu preço torna economicamente lógica a aposta no desenvolvimento das energias alternativas, renováveis e limpas e, por essa via, constitui uma possibilidade real de gradual diminuição da poluição humana do planeta.

No entanto, não se pode escamotear que, a par disso, a tentação nuclear ganha um novo fôlego. Procurarei, a seguir, alinhar alguns prós e contras, bem como incógnitas da exploração da energia nuclear, como se o debate nacional que alguns analistas consideram necessário e inevitável já tivesse começado…

Prós:

  • Diminui a dependência energética.
  • Emite menos CO2 do que as centrais a combustíveis fósseis 1.
  • Abre vias para a produção de hidrogénio.
  • Incentiva a construção de centrais hidráulicas de bombagem, utilizando a electricidade excedentária.
  • Desenvolve competências e dá-nos experiência para a evolução nuclear esperada (novos reactores e fusão 2).
  • Aproveita as nossas reservas de urânio.
  • Incrementa o sector produtivo e cria emprego.
  • Já sofremos os impactos ambientais e os riscos das centrais nucleares espanholas.
  • Estatísticas do período de 1970 a 1992 referem que o número de mortes imediatas provocadas por acidentes no uso do gás natural como fonte de energia atingiu as 1.200, na energia hidroeléctrica 4.000, no carvão 6.400 e no nuclear 31 (exceptuando a catástrofe de Chernobil, cujo número de vítimas directas e indirectas não se conhece ao certo).
  • As centrais a combustíveis fósseis e as refinarias de petróleo também têm efeitos nefastos na saúde pública e na qualidade de vida das populações.

Contras:

  • Representa apenas 20 a 25% da oferta de energia em Portugal (produção de electricidade).
  • Produz resíduos perigosos (que libertam calor e radiação durante milhares de anos), para os quais não existe ainda uma solução satisfatória.
  • Apesar da segurança das centrais e dos novos reactores ter melhorado depois da catástrofe de Chernobil, as incógnitas ainda são grandes. Não se sabe, por exemplo, se o hidrogénio explodirá em caso de acidente grave num EPR (European Pressurized Reactor). Mas sabe-se que o mesmo não está preparado para resistir ao embate de um avião.
  • Pode afectar a aposta no desenvolvimento de energias menos perigosas e mais limpas e abundantes.
  • Pode esmorecer ou subalternizar a concretização dos inadiáveis planos de eficiência energética ou de utilização racional da energia.
  • O risco sísmico é mal conhecido em Portugal.
  • Implica uma reestruturação da rede eléctrica de transporte e uma interligação com Espanha.
  • O actual governo espanhol anunciou, oportunamente, que o país vai abandonar progressivamente a energia nuclear a favor das renováveis.
  • O enriquecimento do nosso urânio só seria possível fora do país.
  • A localização perto de zonas habitadas será sempre impopular.
  • Não será possível construir uma central a tempo de contribuir para as metas do Protocolo de Quioto relativas à emissão de CO2 (2012).
  • Está em curso o desenvolvimento de tecnologias de captura e armazenamento do CO2 nas centrais térmicas a combustíveis fósseis.

Incógnitas:

· Os custos de investimento incluem ou não os custos de desmantelamento no fim da vida; os custos de reestruturação da rede eléctrica; os custos de gestão e tratamento dos resíduos radioactivos; os custos dos sistemas de segurança; os custos de investigação e desenvolvimento; os custos do risco sísmico?

· Quem paga estas “externalidades”: a indústria, os consumidores ou o Estado?

· O preço da electricidade para o consumidor dependerá da inclusão ou não destas “externalidades”. Em todo o caso, em Portugal será sempre mais elevado do que nos países onde já decorreram vários anos de amortização dos investimentos.

Como se vê, não há só contras e incógnitas na opção nuclear. Há também prós. Parece-me, no entanto, que a primeira coisa que Portugal tem que fazer é apostar nessa “nova energia” que se chama eficiência energética, a qual, segundo os especialistas, pode levar à redução de cerca de 20% da energia utilizada no país.

* Baseado no livro “NUCLEAR-O debate sobre o novo modelo energético em Portugal”, de Jorge Nascimento Rodrigues e Virgílio Azevedo, Ed. Centro Atlântico – Nov2006.

1 “No seu funcionamento, as centrais nucleares não emitem praticamente CO2. Todavia, os processos de extracção e enriquecimento do urânio que lhes serve de combustível têm emissões de CO2 tanto maiores quanto menor for o teor do minério. Considerando os minérios de urânio actualmente explorados, as emissões associadas ao funcionamento da central nuclear podem representar cerca de 40% dos de uma central térmica de ciclo combinado. Este valor deve entender-se como indicativo, pois depende de um conjunto complexo de factores, como sejam a cadeia de tecnologias utilizadas e o teor do minério”. (Prof. Delgado Domingos, in NUCLEAR, de JNR e VA).

2 “O primeiro grande reactor experimental, o ITER (Internacional Thermonuclear Experimental Reactor), está a ser construído no Centro de Investigação de Energia Nuclear em Cadarache, no sul de França. É o maior projecto científico do mundo depois da Estação Espacial Internacional e custa dez mil milhões de euros, financiados por um consórcio onde participam a União Europeia (que suporta metade do investimento), os EUA, a Rússia, o Japão, a Coreia do Sul e a China. Prevê-se que a primeira central de fusão nuclear para exploração comercial comece a operar em 2045, depois de uma fase experimental de cinco anos de funcionamento de um reactor de primeira geração. Portugal está também envolvido no ITER, através do Centro de Fusão Nuclear do Instituto Superior Técnico, que tem realizado trabalhos de investigação e desenvolvimento e assumido funções de coordenação em áreas específicas do projecto” (NUCLEAR, de JNR e VA).

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