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01/05/13

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CONFISSÕES

Alcino Silva

http://intermezzo.typepad.com/intermezzo/jordi_savall/


Era uma dessas tardes calmas de Primavera, sol ameno e uma brisa ligeira que ajudava a manter a atenção desperta. Estávamos ambos calados, mas por razões diferentes. O meu companheiro porque desejava dizer algo e eu porque o pressentia. Já não nos víamos há muito e o acaso levou-nos até ao litoral naquele dia. Após o balanço dos tempos de afastamento ali ficamos nessa contemplação muda do oceano. Mais tarde, interroguei-me se aquela conversa chegou a existir ou simplesmente foi um desses momentos que tantas vezes me acontece, ao deitar, alguém liga um rádio que funciona no interior da minha cabeça e começo a ouvir conversas tipo conferência. Não, música é muito raro. Uma vez, ou outra, consigo escutar essa música espantosa de Jordi Savall sobre a tragédia cátara, mas esta música é antiga, vive em mim há já oitocentos anos. Não, quase sempre são conversas, diálogos, e algumas são interessantes e chego a parar a leitura para as escutar. Por fim adormeço e de manhã quando acordo alguém já desligou aquele rádio e na cabeça só restam recordações, pensamentos e algumas ideias. Mas não, aquela conversa aconteceu mesmo. Pensando bem não tenho dúvidas sobre aquele encontro e tudo se ajusta à vivência daquele meu amigo. «Já foste feliz? Sabes o que é a felicidade?». As perguntas vieram assim como um desembarque quando estava com as defesas em descanso, mas não respondi, julguei compreender que só as fazia para procurar as respostas e não para conhecer a minha opinião. «Por mim nunca fui feliz, não porque não o desejasse e não pudesse, mas porque não sei. Não sei chegar a esse sentimento tão exaltante. Nunca soube dançar, nem naqueles tempos em que dançar significava sentir o outro e quando percebia que a felicidade se aproximava, recuava para junto do reposteiro vendo-a chegar junto dos outros. Foi sempre assim, desde criança. A timidez ajudava, é verdade, mas não era apenas isso, era também algo que cresceu em mim, cresceu com o corpo e ganhou essa dimensão devastadora de calar as emoções. Mas um dia apareceu-me, a felicidade. Assim, sem mais nem menos, quando estava desarmado. Foi no mês de Maio, creio. Era uma Terça-Feira, isso lembro-me. Não sei porque me lembro, mas sei que era esse dia da semana. E foi pela hora do almoço. Seriam talvez umas doze e trinta. Estava na cozinha a preparar a refeição, andava naquele vai e vem de leva prato, traz guardanapo, tira a sopa, quando bateram à porta e nem ouvi à primeira. Só quando soaram mais duas pancadas, parei. Sim parei, recordo bem, no meio da sala com um prato na mão, a pensar. Bateram à porta quem me procurará! Deve ser engano. E abri assim com aquele ar de quem vai dizer, não tem mal, esteja à vontade, mas é na porta ao lado. Não, não disse isto, apenas pensei, pois ao abrir a porta, fiquei assim, como se tivesse a assistir pasmado a um acontecimento gigantesco, como uma dessas ondas do Pacífico que nos cobre de cima para baixo. Na minha frente estava um desses rostos espantosamente belos que nos deixam os pés colados ao chão, como antigamente ao atravessarmos a rua nos dias de calor e com o alcatrão a derreter, as sandálias ficavam presas. Os minutos passavam e eu com a mão agarrada ao fecho e sem uma palavra, preso naqueles olhos que traziam o sol a nascer mas como já era meio dia, brilhavam muito, quando ouvi dizerem-me com um desses sorrisos que vêm ter connosco e fazem com que se ligue dentro da nossa cabeça uma máquina de lavar no ponto de centrifugação, olá, sou a felicidade! E eu só saí daquele pasmo quando ouvi que me pediam para entrar. Naturalmente que sim, esteja à vontade, pode sentar-se, quer um chá? Um chá e o almoço para servir! Creio que ficamos assim, a dizer tolices, quando a felicidade chega até nós. Tentou conversar, mas percebi que alguém me tinha levado as palavras todas, ainda tentei o dicionário, mas não adiantou. Fui respondendo, sim, não, como os miúdos quando vão à televisão, gostaste? Gostei, e o diálogo termina. Passado algum tempo, despediu-se, com o mesmo sorriso a mesma alegria, mas em silêncio. Deixei a porta aberta, mas porque já não sabia se a casa tinha porta. Assim foi o meu contacto com a felicidade». Ficamos calados, nessa mudez que se escuta e perturba e nos faz humedecer as mãos à procura de fazer ou dizer algo. O mar continuava a chegar de mansinho até à praia e eu a perguntar-me sobre o que se deve dizer nestes momentos e arrisquei aquela pergunta que sai sempre como se estivéssemos a falar de outra coisa. E não voltaste a encontrá-la ou a procurá-la? «Sim, procurei, dias a fio, durante anos. Via-a ao longe e ficava eu nesse querer ir sem saber como. Uma vez telefonou, disse para não me afastar que gostava de mim. Mas sabes como é, continuei a não saber o que lhe dizer e acabou por desistir. É assim a vida, não chega desejarmos ser felizes, é importante saber usufruir da felicidade. Para que tal aconteça, não basta querermos ou necessitarmos, é preciso sabermos oferecer aos outros o que desejam receber de nós, e eu não soube». Era melhor não prosseguir pensei eu, e quanto às perguntas que me fez, preferi não responder, tive medo da minha resposta. Optei por pensar que era melhor pedir para me ligarem aquele rádio que às vezes se acende dentro da minha cabeça, mas de preferência, com música, a da tragédia cátara.

 

 

FRANCISCO

Mário Martins



Não me apetece falar de política. Direi apenas que a “espuma dos dias” a que ela, a política, se reduziu, me parece, nestes dias sombrios, uma espécie de maré negra a poluir as nossas praias, que ameaça roubar-nos o cheiro a maresia. Falarei antes, “não de touradas”, como sugeriu João Magueijo no seu inspirado artigo, mas da surpresa refrescante que é o novo Papa. Como é possível que uma hierarquia dominante tão afastada da prática dos valores cristãos tenha escolhido um papa com o gesto e a mensagem do “filho de Deus” será, com certeza, um segredo do “Espírito Santo”. Trata-se de uma jogada calculada para salvar o prestígio da Igreja Romana? Ou não se esperava que o cardeal Bergoglio adoptasse osignificativo nome de Francisco? É, em qualquer caso, impressionante que tal como, aliás, acontece nos partidos políticos (perdoe-se-me esta breve mas irresistível comparação), a “linha correcta” na Igreja seja sempre a que está. Quer dizer que o Bem e o Mal são, afinal,relativos ao que cada tempo pede? Como se estivéssemos perante a materialização do Yin e do Yang tauistas, é indubitável, para lá das legítimas interrogações, que o Papa Francisco é uma fonte de esperança para crentes ou não crentes, que, a seu modo, vem compensar este momento tão estúpido e perigoso que a humanidade vive. Que outros “budas” renasçam.

 

MÁQUINAS DE CONTROLO

Manuel Joaquim

Biblioteca Almeida Garrett



Realizou-se no passado dia 13 de Abril, no Auditório da Biblioteca Almeida Garrett, no Porto, uma conferência sobre Soberania e Independência Nacional, promovida no âmbito das comemorações do centenário do nascimento de Álvaro Cunhal, onde César Príncipe, jornalista e escritor, apresentou um importante trabalho, intitulado “Máquinas de controlo social”, no qual denuncia a comunicação dita social que actualmente existe em Portugal, quem a domina e a sua função que é a da “formatação do publicado e controlo do público. Imposição do uniforme, sob a capa do colorido e do ruidoso, e de algum contraditório de baixa intensidade. O chamado arco do poder é assessorado pelo arco do dizer”. Transcreve a seguinte frase de Joseph Pulitzer, patrono de prémios de imprensa dos Estados Unidos: “Uma imprensa cínica, mercenária, demagógica ecorrupta formará um público vil como ela mesma”.

A denúncia da existência destas “máquinas de controlo social” é muito importante, pois desperta o pensamento crítico e permite perceber quem são os seus utilizadores e reais beneficiários. Impregnando toda a sociedade com a sua ideologia, através da manipulação da comunicação, aclasse dominante e seus serventuários, consideram-se os senhores do mundo, uma elite a quem está reservada a inteligência e o culto da razão.

Criticam os valores de outras classes sociais e sociedades à imagem dos seus valores e em função dos seus interesses económicos. O colonialismo, o racismo, o fascismo e o imperialismo têm na sua base esse tipo de valores particulares e desenvolveram teorias para se justificarem.

Estas “máquinas de controlo social” “preparou”, “formatou” a opinião pública mundial para aceitar a guerra no Iraque, com a justificação da existência de armas químicas, que depois se veio a confirmar que foiuma grande mentira. O objectivo da guerra, hoje claramente conhecido, foi e é a espoliação do petróleo. As centenas de milhares de mortos não contam para a história, são acontecimentos vulgares, do dia-a-dia, segundo a comunicação dita social.

A guerra no Afeganistão foi justificada pelo ataque terrorista em Nova York, que terá causado mais de três mil vítimas. As investigações sobre a autoria do ataque ainda não foram conclusivas mas o que se sabe é que já morreram centenas de milhares de pessoas.Acontecimentos sem importância, vulgares, segundo a comunicação dita social.

A guerra na Líbia desapareceu dos noticiários. Nada se sabe sobre a actual situação. Como também nada se sabe sobre os milhões que financiaram partidos da direita e sobre os milhões depositados pela Líbia em bancos portugueses e estrangeiros que não deixaram, por enquanto, qualquer rasto.

Sobre a guerra na Síria, existe uma formatação da comunicação, a informação dos agressores. Nada se diz sobre os 70.000 mercenários existentes no terreno, sobre o fornecimento de armamento e sobre o seu financiamento. Países como Arábia Saudita e Qatar são grandes exemplos de democracia e dos chamados valores ocidentais. Nada se diz sobre os interesses e cobiças que alimentam esta guerra.

O Presidente da República Portuguesa, Cavaco Silva, dias atrás, referiu-se que se as condições de vida das pessoas não forem respeitadas não viveremos em democracia. O actual governo foi eleito com um programa eleitoral que nunca respeitou. Tenta governar desrespeitando a legalidade constitucional e insurge-se contra um órgão de soberania que é o Tribunal Constitucional, ataca as condições de vida dos cidadãos e põe em causa a soberania nacional. A comunicação dita social tem apresentado “sob a capa do colorido e do ruidoso, e de algum contraditório de baixa intensidade” estas situaçõessem questionar a sua essência. “É o arco do dizer” do “arco do poder” como refere César Príncipe. Portugal é um bom exemplo da democracia ocidental.

A Máquina de Controloestá a cumprir, neste momento, um caderno de encargos que lhe foi encomendado, que tem como objectivo “preparar” a opinião pública para algo de muito importante e que poderá levar a uma guerra de consequências imprevisíveis. Não referindo o que se está a passar nos chamados países ditos ocidentais e referindo apenas o que se está a passar em Portugal, verifica-se que está em curso uma campanha contra a República Popular e Democrática da Coreia que atinge a paranóia. Todos os jornais, rádios e televisões dão notícias ou programas sobre a Coreia do Norte. José Pacheco Pereira fala sobre a ditadura na Coreia, o passo de ganso dos militares, o país mais fechado do mundo, etc. As televisões transmitem programas da BBC sobre um espião que se faz passar por turista, que descreve o país mais fechado do mundo, que está instalado num hotel de luxo com água no chão das casas de banho e com cortes de energia, que almoça no restaurante do hotel que é uma gaiola dourada e que falasobre hospitais sem doentes e sobre as estátuas de Kim II Sung. É estranho que sendo o país mais fechado do mundo como é que consegue viajar como turista integrado numa excursão e consegue realizar um filme sem ser apanhado. Outros, de forma mais subtil, falam de ditadura, do regime fechado, do domínio da razão da população, insinuandoque os cidadãos coreanos são pessoas desprovidas de inteligência. Historicamente não dizem nada. O que lhes interessa é a diversão, quer seja primária e ridícula quer seja pretensamente intelectualizada, desde que leve a água ao seu moinho.

Com pensamento crítico é fácil concluir que todos estes estão a desempenhar, de forma coordenada, a tarefa que o imperialismo lhes cometeu na luta ideológica.

Para se perceber um pouco mais sobre a situação da Coreia deve dizer-se que Kim II Sung fundou o Exército Popular Coreano, o Partido do Trabalho da Coreia e a República Popular Democrática da Coreia em 9 de Setembro de 1948. Liderou o povo coreano na luta de libertação contra o imperialismo japonês e depois contra o imperialismo norte-americano a quem impôs a sua primeira derrota na história. Na guerra morreram mais de três milhões de coreanos. Em 1954 o general McArthur, com o apoio da extrema-direita fascista americana, pretendeu lançar bombas atómicas sobre a Coreia mas foiimpedido de o fazer e foi demitido pelo presidente dos Estados Unidos. Os Estados Unidos mantêm oficialmente 50.000 militares na Coreia do Sul, armas atómicas e as mais sofisticadas armas da actualidade.

A RDPCoreia foi um dos países que resistiu às mudanças contra revolucionárias que destruíram a URSS e outros países socialistas da Europa.

É preciso estar vigilante e manter o pensamento crítico.

 

10 NORMAS PARA A SAÍDA DA CRISE!

Mário Faria

(Photo of Little State Festival)



Micro Estado é a solução certa para a sua refundação e em linha para resolver a actual crise política, saída da intromissão abusiva do TC. Proponho para o efeito :

1. Que todo o património e serviços públicos sejam objecto de privatização e alienados, segundo concurso, aberto a investidores estrangeiros;

2. Que o Parlamento seja dissolvido, bem como as demais instituições enquadradas como forças de bloqueio, conforme calendário que o governo transitório estabelecerá;

3. Que a Câmara Corporativa, formada pelos Grémios, que serão (re)constituídos, tenha as funções antes atribuídas ao parlamento, competindo-lhe definir uma Constituição, os limites do Estado e os meios para a sua administração ;

4. Que aos trabalhadores caiba trabalhar, recebendo segundo os seus méritos, que a cada empresa caberá decidir, num quadro geral favorável à mobilidade e flexibilidade;

5. Que sempre que a entidade patronal o entenda, possa ser eleito um representante dos trabalhadores, conforme regulamentação a definir;

6. Que o valor das pensões e reformas seja indexado ao PIB, e as condições gerais possam ser revistas sempre que sustentabilidade do sistema o exigir;

7. Que todos os serviços prestados à comunidade tendam a ser pagos. Os menos favorecidos serão dotados de cheques de saúde, ensino e outros serviços sociais, de acordo com os seus rendimentos familiares;

8. Que transitoriamente, o Presidente da República junte às suas funções as de primeiro ministro, até ao fim do seu mandato, e o governo seja constituído por senadores da sua exclusiva confiança;

9. Que Vítor Gaspar se mantenha como ministro das finanças, dado o colossal prestígio que goza na UE e arredores e Medina Carreira abrace a pasta da Solidariedade e da Segurança Social, em função da enorme sensibilidade demonstrada para o exercício do cargo;

10. Que a Constituição fique suspensa, ate que a plena soberania possa ser acomodada democraticamente.

A nova Constituição tenderá a reforçar o estatuto das empresas que se constituirão como os motores do desenvolvimento: à democracia não basta acomodar quem cria riqueza, tem de estar em linha com esse mérito maior e saber integrá-lo nas normas constitucionais, com o peso e o reconhecimento que lhes são devidas. Os mercados harmonizarão os conflitos e promoverão uma ajustada distribuição da riqueza, a bem da Nação.

 

 

O SISTEMA DESLIGADO

António Mesquita

 

"Poderá haver alguma dúvida de que os omnipresentes retratos do líder nacional em sociedades ditatoriais não só transmitem a sensação de que o 'Big Brother Está a Ver' mas que também conduz a uma efectiva redução do pensamento espontâneo e da acção independente?"

(Daniel Kahneman. "Pensar, depressa e devagar")


Parece que Kim Jong Un é considerado um semi-deus pelos seus compatriotas. Não é que as pessoas realmente pensem isso. O segredo está em que o ambiente circundante 'desliga' o pensamento crítico (do eu consciente, ou 'Sistema 2'), quanto mais não seja por economia de forças, e o 'Sistema 1', como Kahneman lhe chama, isto é, a intuição e os processos 'automáticos', fornece todo a 'regulação' necessária aos indivíduos.

Não é uma novidade das ditaduras modernas. A Idade Média viveu mil anos nesse condicionamento. Porque, na verdade, pensar não é o natural, o que é natural é procurar-se uma vida sem problemas. A Idade Média tinha todas as respostas e vigiava com zelo inquisitorial as perguntas 'políticas'. E o modelo da polícia política deve procurar-se na religião prepotente.

Por isso é que esses regimes se fecham sobre si mesmos. Formam o seu 'todo' (totalitário vem daí) e a sua imunidade à influência exterior. Ora essa prática e essa mentalidade são incompatíveis com o mundo da instantaneidade e da comunicação global.

Não deixam de ser o exemplo vivo de que é sempre possível condicionar os homens através do seu ambiente. Não se duvida que as atitudes mais irracionais possam parecer justificadas num ambiente de complexidade artificialmente reduzida.

O pensamento crítico e o culto da razão pertencem à tradição de uma elite e só alcançaram uma espécie de superstição popular através dos 'milagres' da ciência e, sobretudo, das suas aplicaçōes práticas. Não é coisa profunda, nem garantida. Como se viu no colapso da Alemanha, no século passado.

 

 

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