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02/09/18

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APONTAMENTOS SOBRE O INTERIOR

Manuel Joaquim


(www.flickriver.com)



Depois de concluída a discussão pública sobre o “Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território", no passado mês de Julho, o Governo realizou uma reunião extraordinária do seu Conselho de Ministros, em Pampilhosa da Serra, para aprovar medidas para o seu “Programa de Valorização do Interior “e para os seus “Programas Regionais de Ordenamento Florestal”. Programas cujos nomes impressionam.

Não sei se a decisão de realizar a reunião em Pampilhosa da Serra teve como elemento inspirador as presidências abertas de Mário Soares ou de Santana Lopes ou se foi a oportunidade dos incêndios que levou os ministros a aproveitarem a ocasião para aparecerem publicamente com as conclusões de trabalhos.

Aproveitando a oportunidade da publicidade governamental para o início daqueles trabalhos, um grupo de “amigos do peito”, autointitulado “Movimento para o interior” apresentou publicamente em Maio passado um trabalho com propostas “radicais” para levar vinte cinco serviços públicos para fora de Lisboa, designadamente para a Guarda, Castelo Branco e Beja, além de outras propostas. Teve honras de comunicação nas TVs, rádios e jornais e até um artigo de fundo, nomeadamente de um novel director de um jornal dito de referência, propriedade (?) de uma menina que já foi banqueira (?) e agora vai ser a principal (?) administradora de um grupo económico muito importante.

O relator do grupo, cumprindo as tarefas que lhe foram atribuídas, para justificar os lugares que já desempenhou e que vai desempenhando principescamente, lá deu a cara por tal documento. O que teve o trabalho sobre impostos, fez copy paste de textos de quando foi ministro e dirigente de um grupo de borboletas economistas, que voavam à sua volta, que na altura tiveram coimo tarefa iniciar a destruição do sector público financeiro. Outro é o presidente dos autarcas do seu partido e presidente da Câmara, que certamente está gulosamente à espera de serviços transferidos de Lisboa. Outro tratou do problema da educação. Há ainda um outro, que estudou medidas para a ocupação do território do Estado. Não sei se propõe a venda do território do Estado a nacionais e/ou estrangeiros, ou se pretende aumentar a área de pastagens para aumentar a produção de leite para a sua queijaria ou para estaleiros para obras em parcerias públicas e privadas, provavelmente para participar nos resultados financeiros do empreiteiro.

Sobre o interior do país, como se o país tivesse interior, quando tem cerca de duzentos quilómetros desde a fronteira até ao mar, com rigor, nada se diz. Os incêndios, o papel dos bombeiros, a desertificação, a floresta, os eucaliptos, é que são objecto de notícias. As causas que estão na origem de tantos problemas são ignoradas.

Quando alguém questionava e alertava para as consequências da adesão de Portugal à CEE, designadamente sobre a PAC – Política Agrícola Comum, para Trás-os-Montes e Alto Douro, era imediatamente acusado de catastrofista. Os produtores eram aliciados a abandonarem as suas produções, para o que recebiam bons dinheiros para não produzirem e não trabalharem. Os excedentes produzidos na Europa acabaram por fazer o resto. O dinheiro gasto em novas vias serviu para os camiões trazerem esses excedentes para a distribuição.

As aldeias em Trás-os-Montes estão abandonadas há muitos anos. Os jovens continuam a emigrar procurando emprego e sustento. O encerramento de escolas, de serviços públicos, a falta de trabalho compensador são causas que continuam a agravar a situação. O Bispo de Bragança e Miranda acabou de fazer um apelo para a necessidade de estancar a emigração. Alfaião, uma aldeia próxima de Bragança, hoje não tem escola. As pessoas lembram-se de ter existido quatro classes na escola.

No verão, quem circula nas aldeias, são os emigrantes e familiares. Acabam as férias, as ruas ficam desertas, os negócios acabam. Os que retornaram investiram em habitações e estabelecimentos de restauração e hospedagem, aproveitando os produtos dos seus terrenos. Mas tendencialmente em desfalecimento.

Em Trás-os-Montes a terra ainda está trabalhada. A produção de castanha é ouro. O azeite alarga a sua produção. O vinho também. Os jovens são aliciados para a produção de carne. Mas quem se dedica a estas actividades tem de ter propriedades, capitais e rendimentos compensadores. Os intermediários determinam os preços e o escoamento dos produtos.

Ainda Não se vislumbram eucaliptos e outra florestação que alimentam as celuloses como se vê cada vez mais noutras zonas do país. Ouvimos nas reportagens sobre os incêndios em Monchique que arderam cerca de trinta mil hectares de floresta e mato onde o eucalipto tinha uma presença muito significativa. Sabemos que no início do século XX ainda não existiam eucaliptos naquela zona. Raúl Proença, na sua obra “Portugal – A Terra e o Homem” descreve o arvoredo que existia na serra do Algarve:”… sobreiros, azinheiras, medronheiros, os castanheiros e os carvalhos…”

O eucalipto é uma árvore relativamente recente na Europa. Gustave Flaubert, na sua obra “Bouvard e Pécuchet”, 1881, refere que aqueles dois “artistas” tentaram melhorar a sua propriedade: “…se as árvores mais raras prosperam nas hortas da capital, também deviam resultar em Chavignoles – e Pécuchet arranjou lilases das Índias, a rosa da China e o eucalipto, então nos primórdios da sua reputação. Todas as experiências falharam.”

Aqui, em Portugal, se muitos tiveram prejuízos com os eucaliptos, outros tiveram muitos lucros, até com os incêndios dos mesmos. Os suecos, que dominavam a pasta do papel, em tempo, passaram a pasta para outro(s), agora outras. E são apontadas como sendo detentoras de uma das maiores fortunas de Portugal, alimentada e desenvolvida já no “antigamente”.

Voltando a Trás-os-Montes. De vez em quando são publicados livros que são estudos sobre os Judeus. Praticamente não existem referências a essas publicações. Em 2017 realizou-se em Bragança, durante quatro dias, um Congresso Internacional sobre “Terras de Sefarad”, onde foram apresentados trabalhos muito importantes e esclarecedores sobre o papel dos judeus em Trás-os-Montes. Paulo Mendes Pinto, professor da Faculdade de Letras de Lisboa, onde existe a Cátedra dos Estudos Sefarditas, coordenador do Congresso, referiu que “No caso de Bragança, há 500 anos toda a zona de Trás-os-Montes não era em termos de desertificação, nem de economia o que nós hoje temos como estereótipo. Existiam aqui numerosos empreendedores tinha lugar aqui inovação, existiam centros culturais”.

Vítimas dos senhores poderosos e de toda uma máquina de destruição humana criada pela Igreja católica, as famílias judaicas foram sistematicamente destruídas, pela perseguição, pela tortura e pela morte. Através do medo, foi criada uma rede de denunciantes, de bufos, que não respeitava ninguém, nem os próprios familiares. Bastava que alguém vestisse ao sábado uma camisa lavada, que cozinhasse à sexta-feira, que dissesse que a chegada do Messias estava para breve, que fosse acusada de fazer comentários críticos sobre alguém ou sobre religião para ser denunciada, presa, julgada e condenada. Todos os seus bens eram perdidos. As torturas, as condenações, as galeras, a deportação, o uso do sambenito, a morte de crianças pela destruição dos seus corpos, as mortes na fogueira, tudo feito em nome da fé católica. Em Abril de 1506, em Lisboa, deu-se um massacre, onde mais de quatro mil pessoas, homens, mulheres e crianças foram torturadas e queimadas vivas junto à igreja de S. Domingos. A matança durou três dias, instigada pelos frades dominicanos, acusando os judeus de todos os males, desde a seca, à peste e de tudo o mais. Os métodos dos nazis contra os judeus no decurso da 2ª guerra mundial, não foram inventados por eles. A inquisição da Igreja católica usou-os dezenas de milhares de vezes. Na Torre do Tombo existem milhares de processos dos tribunais da Inquisição.

“Judeus em Trás-os-Montes – A Rua da Costanilha”, de António Júlio Andrade e de Maria Fernanda Guimarães, Editora Âncora, e “Os Judeus – no noroeste da Península Ibérica”, de João Domingos Gomes Sanches, da mesma editora, são dois livros que revelam as vicissitudes de muitas famílias judaicas no tempo da inquisição. A destruição sistemática das estruturas económicas, sociais e culturais na região ainda hoje se faz sentir. Actualmente, as comunidades judaicas ainda não se assumem como tal. Famílias guardam, quase secretamente, pertences religiosos herdados de antepassados e que usam em determinadas cerimónias. A diáspora mantém-se, sobretudo, através da emigração.

Alexandre Herculano, Oliveira Martins, António José Saraiva e outros, estudaram e escreveram sobre o tema, pouco conhecido da generalidade das pessoas e que, em certos círculos, é vedado abordar.



01/09/18

NO CORRER DOS DIAS

Marques da Silva







Houve sempre um sonho em mim, mapear a vida. Estendia os mapas nas paredes do tempo e deixava-me seduzir pelas pequenas estradas a cores entre duas linhas paralelas, os cruzamentos, as encruzilhadas, as sinuosidades das vias que muitas vezes são idênticas às da vida, os vermelhos, os verdes e os amarelos, as indicações de destino, os rios, os lagos, as vias-férreas, tudo aparecendo em minúsculo formato que produz uma atractividade ímpar. Olhando horas seguidas para o mundo representado imaginava vales, gargantas, desfiladeiros, planícies e a mancha azul do mar infinito. Procurava adivinhar o pormenor e o que seria possível encontrar em cada lugar. Seriam de pedra nua ou verdejantes as encostas das montanhas que cresciam no olhar da minha fantasia? Havia dias que encetava viagens, caminhava pela berma de uma qualquer Nacional que me aparecia como mais sedutora, entrava e saía de aldeias cujo nome gravava em pedras douradas na minha memória. Ao fim de alguns anos pensava já nada ter para encontrar nos imensos mapas que se estendiam na minha frente. Quando tudo parecia concluído, surgiu o teu corpo no horizonte do meu destino. Viajava então entre duas galáxias, uma morta e outra moribunda, escondidas nos buracos negros da humanidade. Acreditei que o poderia atravessar como uma ponte, em contemplação do êxtase, mas sucumbi à tentação de ver nele o mapa que nunca tinha percorrido. Desisti da gravação das estradas por onde viajar, ignorei os sinais, sobretudo os de proibição, e fui como se houvesse um sentido único, sem limite. Exagerei, por vezes, na velocidade, mas havia uma sensação de liberdade no vento que deslocava na passagem. Em cada desvio, optei pela estrada mais estreita e consenti que o risco me envolvesse, pois o assombro que me chegava da natureza inebriava os sentimentos e descomandava as emoções. Seduziu-me a rosa-dos-ventos que orientava os horizontes, mas preferi acreditar no movimento do sol. À noite vadiava pelo mapa do teu corpo guiado pelas constelações. Era noite e tudo brilhava. Nas margens das estradas que subiam e desciam, havia lugares de descanso, jardins de rosas que floresciam o ano inteiro. Estendia-me nos campos de algodão que imaculavam a terra e deixava que a fadiga adormecesse horas sem fim. Uma noite, inverti o mapa e deixei-me levar pelo infinito. Invertendo os pólos, o cruzeiro do sul passou a estrela da manhã. Desenrolei o mapa em toda a extensão e permiti que o olhar se extasiasse com a sensação de loucura nas estradas imaginadas que apareciam diante do olhar. Tacteei uma vez, e outra e ainda uma outra, desenhei novas rotas, caminhos novos, semeei florestas, desbravei as colinas que desciam sobre o mar dos teus olhos. Saciei a sede nas fontes nascentes do rosto e repousava sempre exausto de cada caminhada encetada. Um dia, ao acordar, percebi que este mapa era apenas um sonho, um esboço fulgurante do desejo e da imaginação e apenas uma estrada aparecia no horizonte visível. Estreita, curvilínea e de naturezas mortas, e o nevoeiro que se abriu diante dos meus passos acabou apagando todos os mapas restantes que ainda guardava no bolso interior de um casaco usado. Voltei ao caminho, mas de passo incerto e indiferente ao destino.

Mui estimado Javier Cercas não conhecendo eu a sua obra literária tão premiada (ler um livro é demasiado escasso), não podem ser estas palavras de crítica, antes apenas de espanto e surpresa. Abordar o tema da Guerra Civil não é fácil e só os grandes escritores o podem fazer com a riqueza das palavras com que a História deve ser contada. Retenho-me pois, em algumas frases contidas na entrevista que concedeu ao JL. Sem dúvida, que em todas as guerras, os bons e os maus, estão de ambos os lados, ou não fossem elas, acções humanas, quando esgotadas ou negligenciadas as palavras. Mas, a liberdade com que a guerra permite matar, não isenta os crimes, antes pelo contrário, devem ser apurados e justiçados os responsáveis. O que perturba nas suas palavras é afirmar que a República tinha a razão política mas não a razão moral (“Fiz a distinção entre razão política e razão moral (…). A República tinha razão política (…). Significa que todos os republicanos eram boas pessoas?”). Meu estimado estremenho de Ibahernando, a República tinha a razão política e a razão moral, era democrática e legítima, e como se poderia ter uma sem a outra? Ser boa ou má pessoa não diz respeito às instituições, mas aos crimes que cada um decide cometer, mesmo que em defesa dessas mesmas instituições. E a separação que pretende fazer não «irrita» apenas “todos os fanáticos”, irrita-me a mim que nada tenho de fanático. Francisco Franco não foi apenas sedicioso e golpista, foi um criminoso, um analfabeto boçal, uma diarreia da humanidade, mergulhou o Estado espanhol numa espiral de violência que enterrou um milhão de pessoas e quarenta anos depois, o ditador ainda matava. Morreu sem pagar os seus crimes. O seu tio-avô pode ter sido um jovem cheio de generosidade que se deixou iludir pelo discurso, como diz e parece acreditar o meu caro Javier Cercas, “anti-capitalista, anti-sistema, jovem e rebelde” da Falange, mas o que não pode agora, é desculpar a responsabilidade dos seus crimes, apenas porque do lado dos republicanos também haviam homens maus, deixando que por aí se esvaia a razão moral da República. Ignorar essa Falange que gritava, «Abaixo a Inteligência», «Viva a Morte» ante a grandeza e a estatura intelectual de Miguel de Unamuno?, essa Falange que só na Galiza, onde quase a guerra não chegou, passeou, fuzilou, matou, torturou e assassinou cerca de 8 mil galegos? Diz-nos que os maus da República “mataram mais de sete mil membros da igreja”, mas olvida ou omite, dizer-nos quem eram e o que faziam esses «membros da igreja», pois não pode ignorar que a maioria era contrária à República, membros da Falange e participaram activamente nos crimes. Mas se a acção dos homens maus da igreja, não belisca a ideia de Deus, também não serão os homens maus da República a retirar a esta a sua legítima razão moral. Os crimes são outro aspecto da guerra, para serem julgados e condenados os responsáveis, não apenas do lado dos vencidos, como também do lado dos vencedores, e os destes últimos, ficaram impunes, até hoje.
  

O LUBRIFICANTE

António Mesquita

(www.lci.fr)



Já todos fomos "massajados" pela música de uma esplanada.

Às vezes, apetece-nos levantar e seguir a cadência, outras, deixar-nos flutuar como se o mar estivesse ali e nos envolvesse, e não tranquilamente deitado no horizonte.

A música modifica em nós o humor e o regime do movimento. E há até quem estenda a sua influência aos animais e às plantas.

A música é pois demasiado importante para ficar confinada aos músicos e aos melómanos.

Com quantas "estratégias" musicais nos confrontamos em sociedade?

Desde a indústria do rock e do seu papel retribalizador da juventude, ao fundo anestesiante dos centros comerciais e ao lubrificante sonoro dos elevadores, de que modo, verdadeiramente subliminar, não determina este tipo de música alguma coisa do nosso comportamento?

Por outro lado, como o silêncio, sob o assédio comercial, nos deixaria desamparados e sobreconscientes no acto da compra! E como sem essa escapatória, teríamos outros e talvez mais graves problemas de polícia, de desadaptação e disfuncionalidade!

Já Platão reconhecia a importância da música na vida da cidade e defendia a proibição de certos ritmos de origem oriental.

Mas é evidente que esse controlo não é desejável.

É preciso compreender a música, neste contexto, como um sistema auto-regulado, cuja semântica está ainda por enunciar.

NOSSA SENHORA DA SAÚDE

Mário Faria





A manhã ia fresquinha e pouco respeitosa das previsões anunciadas. Dei a corda aos sapatos e desaguei junto da capela da Nossa Senhora da Saúde quando decorria a missa campal. Acabou pouco depois e a imagem da nossa padroeira voltou para a sua casa. Notei no seu rosto um ar atormentado. Provavelmente inquieta com o nosso SNS. De tarde, havia a procissão que fiz a questão de acompanhar. Muita gente e muitos andores com imagens de santos e santas e, obviamente, da Nossa Senhora da Saúde. Uma banda a fechar, direcionada para a música de perfil religioso e uma outra no comando para definir o ritmo da marcha. O ambiente era respeitoso e assumido com simplicidade. Uma ligeira fricção ocorreu quando um homem se virou para um acompanhante e disse: “vai trabalhar para as obras, ó malandro” e continuou a resmungar até se perder de vista. O calor, o som ritmado dos tambores, a caminhada sincopada e a coreografia que os diferentes actores compunham, remeteram-me de uma forma instintiva, automática, para uma cena de um dos filmes da saga O Padrinho.

Como não poderia deixar de ser todas as noites houve muita animação com a melhor música pimba. Dançava-se ao som de canções populares. As bandas de música e o coro de Paranhos também actuaram. Havia comes-e-bebes para todos os gostos, mas as sandes de chouriça, quentinhas, quentinhas arrasaram. Na despedida dei comigo a pensar se a Nossa Senhora da Saúde não andaria preocupada com os maus tratos que o nosso jardim de Arca de Água sofre e como a terra poeirenta vai tomando conta do verde que era dominante.

A greve dos enfermeiros, obrigou ao adiamento de mil cirurgias nos hospitais de Santa Maria e São José, em Lisboa, e no São João, no Porto, conforme disse à Lusa um dirigente da Federação Nacional dos Sindicatos de Enfermeiros (FENSE). Nesses cinco dias [de greve] 1000 cirurgias vão ser adiadas" nestes três hospitais, porque "os blocos cirúrgicos normais estão parados", adiantou José Correia Azevedo. Tive a oportunidade de ver e ouvir na TV este dirigente sindical a anunciar o adiamento dessas cirurgias como se fosse uma grande vitória pessoal (não escondia o seu contentamento) absolutamente alheio aos danos que poderá ter provocado aos doentes. A greve é uma arma, mas como todas as armas não deve magoar mais do que é preciso: na saúde por maioria de razão.

ONDE ESTÃO?

Mário Martins

CosmoNerd


"Existem duas possibilidades: ou estamos sozinhos no universo ou não estamos.
Ambas são igualmente aterrorizantes"

Arthur C. Clarke, escritor e inventor inglês

“Onde estão?”, foi esta a famosa pergunta que, em 1950, o não menos famoso físico italiano Enrico Fermi (prémio Nobel da Física em 1938) fez aos seus colegas quando trabalhava no Laboratório Nacional de Los Alamos, nos Estados Unidos, a propósito da contradição (designada desde então como o paradoxo de Fermi) entre as estimativas que afirmavam haver uma alta probabilidade de existirem outras civilizações no universo observável e a falta de evidência delas.

Agora, mais de meio século depois de o astrónomo e astrofísico norte-americano, Frank Drake, ter publicado a sua célebre equação para estimar o número de civilizações extraterrestres na nossa galáxia, com as quais poderíamos ter chances de estabelecer comunicação: N = R* ∗ fp∗ ne∗ fl∗ fi∗ fc∗ L - em que R* é a taxa de formação de estrelas na nossa galáxia; fp a fracção de tais estrelas que possuem planetas em órbita; ne o número médio de planetas que potencialmente permitem o desenvolvimento de vida por estrela que tem planetas; fl a fracção dos planetas com potencial para vida que realmente desenvolvem vida; fi a fracção dos planetas que desenvolvem vida inteligente; fc a fracção dos planetas que desenvolvem vida inteligente e que têm o desejo e os meios necessários para estabelecer comunicação; e L o tempo esperado de vida de tal civilização (Wikipédia) - e dela extrair (baseado nas suas próprias pesquisas de vida inteligente extraterrestre de que foi um precursor) o resultado de 2,31 civilizações alienígenas na Via Láctea, três académicos da Universidade de Oxford, Anders Sandberg, Eric Drexler, e Tod Ord, revendo a equação de Drake “com distribuições mais realistas de incerteza”, concluíram que "há uma probabilidade de 39 a 85% de que os seres humanos estejam sozinhos no Universo observável". Note-se, no universo observável e não apenas na nossa galáxia, mas como uma garrafa tanto é meia vazia como meia cheia, também poderíamos dizer que, de acordo com o novo cálculo, há uma probabilidade de 15 a 61% de que os seres humanos não estejam sozinhos no Universo. De resto, nas declarações vindas a público, os cientistas tanto afirmam que "encontramos uma probabilidade substancial de que não haja outra vida inteligente em nosso universo observável e, portanto, não deveria haver surpresa quando não detectamos quaisquer sinais disso", como admitem que “se, apesar da baixa probabilidade, for detectada vida extraterrestre inteligente no futuro, não devemos surpreender-nos muito"…

Entretanto, cientistas da Nasa apontam para a possibilidade de, nas próximas décadas, se confirmar a existência de ETs, previsão que, no entanto, não deixa de ser conveniente para garantir os elevados investimentos públicos nos dispendiosos programas de busca…

Uma coisa parece certa: apesar da descoberta, nos últimos anos, de um número crescente de exoplanetas (planetas que orbitam outras estrelas) e, sobretudo, de exoplanetas com potencial de terem água líquida; apesar da recepção, em 1977, de um sinal de rádio extraterrestre surpreendentemente forte, apelidado de sinal Wow!, mas que não foi mais detectado; apesar das notícias mais ou menos sensacionalistas sobre Ovnis; apesar, enfim, da redução das probabilidades de existirem outras civilizações, o paradoxo de Fermi continua a desafiar-nos. 

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