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01/12/18

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NO CORRER DOS DIAS

Marques da Silva
https://alunosonline.uol.com.br/historia/civilizacao-persa.html


Há momentos na vida em que as palavras que nos amparam se apagam, parecem jazer adormecidas no cemitério da humanidade, caladas entre os cedros das áleas onde só resta a terra do piso onde caminhamos. Silenciadas, deixam-nos naufragados entre as ruínas do tempo, vogando sem rumo, acreditando no infinito, mas com a certeza de que esse ponto onde se unem as linhas marginais da vida e no qual termina a esperança se torna visível como um radar cujo feixe se mostra cada vez mais perceptível. Sem palavras, queda a memória na procura de recordações. Tendo aprendido a perceber o mundo através dos teus olhos, tornando-os refúgio da alma face às calamidades da vida, regresso às lembranças do passado nas asas de aves andinas. Não resisto em regressar ao deserto levantino onde as palavras se tornam inúteis quer pela beleza dos seus murmúrios, ou pela tempestade de violência que os homens semeiam sobre as suas areias. Alepo vive em mim. Mesmo agora, um espectro de si mesma e um esqueleto da sua glória, impressiona-me, deixa-me nesse mutismo em que ficamos quando a grandeza supera a nossa imaginação. Por momentos, parece que a ternura voltou a inundar as areias do deserto, mas o fragor das bombas para além do Eufrates, ainda interrompe esta melodia melancólica. É verdade que são bombas democráticas, bombas com direitos humanos, bombas com justiça, fogo dos bons contra os maus, mas quando procuramos melhor, percebemos que os ladrões matam os seus infames servidores. Apesar do êxtase que gera em mim a quietude da paisagem, da brisa que não chega a desacomodar-nos, dos oásis onde descansamos a sede e a fadiga, levas-me pela mão para lá desta loucura humana, fazes-me atravessar o Tibre, percorrer caminhos solitários até te deteres no palácio de Persépolis. No entardecer encantador de um passado longínquo acredito que os únicos sons que escuto são marítimos, como se o golfo estivesse espreitando para além dos seus muros que resistem soberbos ao passar da história. Falas-me em farsi e acredito encontrar na doçura desta língua, as palavras que se me secaram em latim. Falas-me do tempo, do pretérito, da maldade, da beleza e da violência que a humanidade leva no seu caminho. Percorres em passo vagaroso as áleas outrora soberbas deste reduto real e escuto em silêncio magoado essa evolução mental que nos leva desde as pedras lascadas até ao espaço extragaláctico. Continuam a faltar-me as palavras e sem elas, deixamos de amar, pois mais do que com os gestos, amamos com as palavras, são elas que nos expressam perante os outros e o que nos rodeia. Sem palavras, sem esse som em que modelamos os sentimentos e os afectos o amor esconde-se, como eu agora me oculto nas ruínas deste símbolo de um poder grandioso. Da humanidade chegam-me sussurros, tudo mais são gritos que me recuso a ouvir. Berros dos senhores, dos que sempre mandaram e impuseram a docilidade dos seus servos e cultivaram a obediência a que chamam ordem. E a cada rugido senhorial, uma bomba rebenta sobre a terra dos seres humanos, os que acreditam que com uma cruz no interior de um quadrado podem mudar o mundo, mas apenas mudam os que mandam no mundo, os que impõem, os que bombardeiam. E assim vamos perecendo, seja ontem, será amanhã. O dia declina e persistes em falar numa língua que decides ser ela própria, ao mesmo tempo, poesia e jardim de rosas. Desconheço a língua, mas compreendo tudo o que me dizes. Falas-me de humanidade, da ternura humana, das odisseias que engrandecem a vida e da esperança que um dia sem data se sobreporá sobre o estrume de qualquer comunidade internacional que quotidianamente nos esmaga a alma. Disse-te que se me esgotaram as palavras.

Desde a Idade Média, a morte por enforcamento ou decapitação, ou mesmo nas fogueiras inquisitoriais, era motivo de mobilização popular. Em torno do lugar da morte, juntava-se uma turba, maioritariamente para desfrutar do gáudio de ver morrer. Em qualquer das situações, sobretudo na decapitação e no enforcamento, a morte não ocorria ao primeiro golpe o que aumentava o sofrimento do supliciado e projectava ainda mais o deleite da assistência. Não era um acto censurável. Era normal e tradicional. Na Revolução Francesa, Guillotin, impressionado com o padecimento das vítimas, inventou um aparelho eficaz e rápido, a guilhotina, cujo uso diminuía a ansiedade e a dor da morte. Das primeiras vezes, a multidão aumentou para ver a eficácia do aparelho, mas um ah! de desolação percorreu a massa embrutecida, pois o espectáculo era demasiado rápido para o seu gosto e a tortura em que se tornava a morte, praticamente desaparecia. A pena de morte encontra-se hoje quase erradicada do hábito humano, mas muita dessa maldade foi transferida para lutas de morte entre animais e, uma outra turba, em tudo idêntica à medieval, junta-se para de novo erguer os seus instintos maldosos, sentindo-se agora menos culpada, pela exclusão do sofrimento humano. No Paquistão é uma tradição cultural colocar um urso ao qual previamente foram extraídas as garras, a lutar com seis cães selvagens, até à morte, naturalmente. Faz parte da cultura tradicional. Por cá, neste território de nome Portugal, temos algo parecido mas mais civilizado, a que chamamos touradas, em defesa das quais apareceu Manuel Alegre com um conjunto de frases como emblema, nomeadamente quando nos diz que, «que aqueles que não compreendem as touradas não compreendem a literatura nem a poesia», acrescentando que é «preciso compreender a relação sagrada que existe entre o toureiro e o touro». Definitivamente, a idade não perdoa. 

O PCP, o PSD, o CDS e uma parte do PS, aprovaram na Assembleia da República que os impostos de todos nós vão subsidiar a assistência às touradas. É a política no seu esplendor.

“Vivemos na sociedade do conhecimento mas sem conhecimentos suficientes. Olhamos para a Prodata e verificamos que um dos índices mais dramáticos é o da população activa sem ensino secundário ou superior. Em Portugal 52% não tem escolaridade suficiente. Na Europa, a média é de 22%. É uma catástrofe.”, diz-nos Carlos Fiolhais em entrevista ao suplemento educação do JL. Depois admiramo-nos quando deixamos ruir pontes, famílias morrem inteiras em condições sub-humanas por não pagarem atempadamente a energia eléctrica enquanto um crápula recebe 3 milhões por ano de prémios. Por fim, deixamos que uma estrada desapareça no fundo de uma vala com 80 mts e, tal como há 20 anos os areeiros se apressaram a afastar a sua responsabilidade, agora apareceram na primeira fila os marmoristas no mesmo clamor: «eu não»! E pensar que são aqueles 52% que decidem sobre a vida e o futuro dos restantes 48%, democraticamente, naturalmente.

O presidente da Câmara de Borba não se demite porque nunca imaginou que a estrada pudesse ruir. O dono da pedreira também não imaginou. As vítimas mortais certamente não imaginaram, pelo que não há responsáveis. A não ser que imputemos a responsabilidade a alguém que possa ter imaginado!



UMA FAMÍLIA DE PEQUENOS LADRÕES

António Mesquita
Shoplifters: Uma Família de Pequenos Ladrões
de Hirokazu Kore-eda



Eis a história de uma estranha família a que faltam laços de sangue, mas em que o maior desejo de grandes e pequenos é merecerem o nome de pais e filhos. A família típica acaba por ser a ideia que une estes seres cujo encontro parece dever-se ao acaso.

Num tugúrio com a avó, Hatsue, vivem Osam, um ser esquivo e amoral, dado às artes da sonegação, a companheira Noboyu, que, por um tempo, trabalhou numa lavandaria, a jovem irmã, Aki, que contribui para o mealheiro com sessões de pornografia 'soft', Shota, um rapaz de 12 anos que não conhece os pais e Yuri, uma menina de 6, recolhida na rua. 

Começamos por assistir ao 'modus operandi' de Osamu e de Shota num supermercado. Enquanto um faz cair os artigos na mochila, o outro cobre   o ângulo de visão da vigilância. O grupo sustenta-se da pensão da avó e destes pequenos furtos.

Mas a avó morre depois de um momento de graças e de contemplação diante do mar. Para não faltar a principal fonte de pecúnia, é enterrada em casa e a vida segue em frente com mais um espírito do lar.

Shota começa a reparar nos seios femininos e tem a primeira erecção. Isso coincide com um rebate de independência. Ao iniciar a menina na manobra  do furto, é surpreendido pelo logista que oferece uma guloseima a Yuri e aconselha o rapaz a não ensinar a criança a roubar. A partir daí, a autoridade de Osuma é posta em causa. Já não basta que os roubos não provoquem a falência, espécie de justificação do chefe. A dúvida corrói o pequeno delinquente que parte una perna na fuga e se deixa apanhar.

A família, temendo a perseguição, faz as trouxas e tenta escapar durante a noite. São surpreendidos pelos faróis da polícia.

Noboyu é presa, assumindo as culpas de Osuma, que é reincidente. Yuri é entregue à família verdadeira (que a maltratava), Shota inicia a sua reeducação institucional.

Um dia encontra-se com Osuma e dorme em sua casa. Mas já nada é como dantes. Aquele já não pretende o título da paternidade, nem Shota acredita nele.

É assim que este filme complexo, baseado numa notícia, nos leva a interrogar algumas das nossas certezas e, sem parecer fazê-lo, mostra através de uma célula atípica, como é esta convivência feita de afectos e de práticas marginais, a ideia de uma sociedade em crise de identidade.

Hirokazu Kore-eda, que obteve a Palma de Oiro no Festival de Cannes deste ano, é também o realizador, entre outros filmes, de "Ninguém Pode Saber" (2004), "O Que Eu Mais Desejo" (2011), "Tal Pai Tal Filho" (2013).

LIÇÕES PARA O PRESENTE

Mário Martins


http://www.elsinore.pt/livros/21-licoes-para-o-seculo-xxi



Os seres humanos pensam através de narrativas e não através de factos, números ou equações, e quanto mais simples a narrativa, melhor.”

“As políticas democráticas, os direitos humanos e o capitalismo de mercado livre pareciam destinados a conquistar o mundo inteiro; mas, como de costume, a História tomou um rumo inesperado, e, depois de o fascismo e o comunismo colapsarem, agora é o liberalismo que está em apuros.”

“Se o liberalismo, o nacionalismo, o Islão ou qualquer outro credo novo quiser moldar o mundo do ano 2050, terá não só de conseguir explicar a inteligência artificial, os algoritmos da Big Data* e a bioengenharia como também de os integrar numa nova narrativa com sentido.”
Yuval Noah Harari

Este novo livro de Harari anda à volta de uma preocupação central: “a crise ecológica iminente, a crescente ameaça das armas de destruição maciça e o surgimento de tecnologias disruptivas” tornam premente o debate sobre “as limitações da democracia liberal, e de que modo podemos adaptar e melhorar as suas instituições actuais”, já que, se não o fizermos, “a mão invisível do mercado vai impor-nos a sua resposta cega”. Explica o autor que “grande parte do livro analisa as falhas da mundividência liberal e do sistema democrático, não por julgar a democracia liberal particularmente problemática, e sim por pensar que se trata do modelo político mais bem-sucedido e versátil que os seres humanos já desenvolveram para enfrentar os desafios do mundo moderno.”

Harari preocupa-se, desde logo, com a questão do trabalho ou do emprego. Embora ironize - “quando fores grande, talvez não tenhas profissão” -, reconhece que não tem a menor ideia de como será o mercado de trabalho em 2050. Em todo o caso, defende que “para lidarmos com as disrupções tecnológicas e económicas inéditas do século XXI, há que desenvolver novos modelos sociais e económicos o quanto antes; estes modelos devem reger-se pelo princípio da protecção das pessoas e não dos postos de trabalho”, conceito que, segundo o autor, está já a ser posto em prática na Escandinávia. “E se apesar de todos os nossos esforços uma percentagem significativa da Humanidade for empurrada para fora do mercado de trabalho, podemos ter de explorar novos modelos para sociedades pós-trabalho, economias pós-trabalho e políticas pós-trabalho”. Com efeito, Harari admite que “em 2050 pode surgir uma classe ‘inútil’ não apenas devido a uma total falta de empregos ou de habilitações relevantes, mas também devido a uma falta de resistência mental (às mudanças abruptas e cada vez mais aceleradas a que as pessoas serão sujeitas)”. Neste quadro, profissões como as de psicólogo e de psiquiatra não correrão perigo de extinção…

Outra preocupação do autor é a vaga nacionalista em curso: “Hoje temos uma ecologia mundial, uma economia mundial e uma ciência mundial – mas ainda estamos presos a políticas nacionais (…) Não sendo possível desglobalizar a ecologia e a marcha da ciência, e dado que o desglobalizar da economia teria custos proibitivos, a única solução viável é globalizar a política. Isto não implica, no entanto, o estabelecimento de um ‘governo global’ (…) significa apenas que as dinâmicas políticas dentro dos países – e até cidades – deveriam colocar muito mais ênfase nos problemas e interesses globais.”

Harari alerta que “os algoritmos da Big Data  podem criar ditaduras digitais em que todo o poder se concentra nas mãos de uma pequeníssima elite, enquanto a maioria das pessoas sofre não devido à exploração, mas devido a algo muito pior: a irrelevância.”; e conclui: “Se o futuro da Humanidade se decidir na nossa ausência – porque estávamos demasiado ocupados a alimentar e a vestir os nossos filhos -, tanto eles como nós não ficaremos imunes às consequências. Isto é muito injusto; mas quem disse que a História é justa?”

O autor aconselha, enfim, que não entremos em pânico (que, para ele, é uma forma de soberba de quem “sabe” que nos espera o fundo do poço) e que, em vez disso, adoptemos uma atitude de perplexidade, própria de quem não compreende o que se passa no mundo. Afinal de contas, a crédito de uma razoável confiança no futuro, podemos convocar o extraordinário poder de adaptação da Humanidade revelado até agora e as previsões apocalípticas de todo o tipo que ficaram pelo caminho. 

*grande conjunto de dados que só as novas tecnologias da informação permitem recolher, armazenar a analisar.

ALGUMAS NOTAS SOBRE AS GREVES

Mário Faria



O protesto nacional dos juízes contra a revisão "incompleta" do Estatuto, por não contemplar reivindicações remuneratórias e de carreira, espoletou uma greve geral, que levou ao cancelamento de muitos julgamentos e outras diligências processuais.

O presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) previu que a greve geral terá uma "adesão muito forte", culpando o Governo por não deixar outra alternativa aos magistrados judiciais ao apresentar uma proposta de revisão do Estatuto que "não é aceitável".

Os enfermeiros iniciam uma greve inédita às cirurgias programadas em cinco blocos operatórios de hospitais públicos que durará até ao último dia do ano. Hospital de Setúbal, hospital de Santa Maria, hospitais de Santo António e São João e no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra aderiram a esta greve; “A adesão dos enfermeiros que trabalham nos blocos operatórios estará muito perto dos 90%. 

Os estivadores em protesto no Porto de Setúbal bloquearam a passagem de um autocarro que transportava os trabalhadores que os vão substituir no carregamento de um navio com viaturas da Autoeuropa. Ao todo, há 150 precários em Setúbal, um porto que tem sido notícia exatamente pelo número excessivo de trabalhadores sem vínculo laboral (90%) que asseguram, ali as operações diárias. "Restam uns 30 trabalhadores efetivos, o que não é suficiente para assegurar o movimento de navios em todos os turnos, até porque a par da indisponibilidade para trabalhar dos precários, também, está em curso uma greve às horas extraordinárias", diz o sindicato.

Agora, numa altura em que a troika deixou o país há quatro anos e com um novo Governo em funções, o cenário não é muito diferente, sobretudo entre os trabalhadores da administração pública. Quando o Executivo liderado por António Costa assumiu funções, em 2015, começou-se a assistir a uma redução nas greves gerais e setoriais. Só nesse ano houve 87 paralisações em todos os setores da administração pública, de acordo com os números do Ministério das Finanças. No entanto, desde o ano passado que os ânimos entre os funcionários públicos voltaram a aquecer e o número de paralisações voltou a subir. No total, em 2017 houve 144 greves, e tudo indica que este ano o número de paralisações seja superior. Em 2018, face aos indicadores já conhecidos, vão aumentar os números de paralisações face ao ano anterior e muito provavelmente ultrapassar os valores registados no tempo da troika. 

O Privado em contraciclo: ao contrário da administração pública, entre os trabalhadores do privado o número de greves tem vindo a reduzir nos últimos anos. Segundo dados oficiais do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, dos 488 pré-avisos de greve entregues em 2016 pelos trabalhadores do privado, apenas 76 se concretizaram. Os números revelam ainda que o número total de paralisações entre os trabalhadores do privado tem vindo a reduzir. O sector dos transportes é o mais reivindicativo.

Os sindicatos têm milhares de funcionários cujo trabalho não é outro senão esse, e os meios de comunicação social têm formas de trabalhar que são sempre iguais: directo à porta do protesto, conversa previamente combinada com o sindicalista de serviço, números de adesão estratosféricos, jornalistas a debitar a cassete do trabalhador oprimido, discussão do tema nos canais por cabo à noite, e por aí fora. Esta coreografia está altamente rotinada e não é nada fácil de quebrar. Se a esquerda não dança, a comunicação social fica sem par – e a direita não conhece os passos. Esta foi a grande fragilidade de PSD e CDS nos últimos três anos. Ao mostrarem-se incapazes de ocupar o espaço que PCP e Bloco deixaram ao abandono, a direita ficou não só sem governo, mas também sem oposição. (João Miguel Tavares)

Apenas a esquerda e o PAN votaram a favor da recomendação do PCP para aumentar o Salário Mínimo Nacional (SMN) para 650 euros mensais em Janeiro. PS, PSD e CDS votaram contra e consideraram que o assunto deve ser tratado em sede de concertação social, que servirá (como habitualmente) de refúgio para adiar esta reivindicação mais do que justa. Os salários no nosso país são baixos e o salário mínimo deve constituir-se como objectivo primeiro da acção sindical. E o período pré eleitoral deve servir para denunciar o que o governo não vai ser capaz de propor e negociar. Se a greve dos estivadores se percebe tão bem (e até faz parte do nosso imaginário (quem não se lembra do "Há lodo no Cais"?), acho que a greve dos enfermeiros e a dos juízes apelam a um estatuto elitista e não deveriam ser autorizadas. 


PELA PAZ

Manuel Joaquim



A necessidade de se trabalhar para a construção de um mundo melhor, sem miséria, sem fome, com mais e melhores empregos, com mais educação, mais saúde, o que, ao fim e ao cabo, Sérgio Godinho sintetiza numa canção sua, obriga-nos a ter presente os problemas da Paz, pois, sem ela, tudo o que sonhamos vai por água abaixo, com muita dor e sofrimento. 

Existem pessoas que pensam que a civilização após uma guerra nuclear voltaria a uma situação idêntica à que existia na Idade Média. Nada mais falso. As imagens das cidades do Japão que foram bombardeadas na segunda guerra mundial e das cidades da Síria, do Iraque e do Afeganistão que estão neste momento em guerra, demonstram que as pessoas, só por si, não têm meios de sobrevivência. A Idade Média foi um período de reconversão e de reorganização da sociedade, onde se deu o desenvolvimento do ensino e criação das universidades, das artes e ofícios, avanços acentuados nas ciências e nas técnicas, o renascimento.
Uma guerra entre as grandes potências pode ser o fim da nossa civilização. Normalmente as guerras começam quando estão em causa poderes que são liderados por cabeças perturbadas.

As arrogâncias que observamos em alguns líderes, os gastos em armamentos, suficientes para acabar com a fome em todo o mundo, obriga-nos a meditar.

No passado dia 20 de Outubro, realizou-se o Encontro pela Paz, no Pavilhão Paz e Amizade, na cidade de Loures, com a presença de mais de 700 pessoas, representantes dos vários núcleos existentes no país do Conselho Português para a Paz e Cooperação, das Câmaras Municipais de Évora, de Gaia, de Montemor-o-Novo, de Palmela, do Porto, do Seixal, de Soure, Movimento Municípios pela Paz, diversas Juntas de freguesia, diversas organizações sindicais, diversas colectividades, associações de estudantes do ensino secundário e superior, Juventude Operária Católica, Liga Operária Católica, Movimento de Trabalhadores Cristãos, Pastoral Operária, URAP, Associação Nacional dos Sargentos, Liga Portuguesa dos Direitos Humanos-Civitas, Movimento Erradicar a Pobreza, Organização dos Trabalhadores Científicos e muitas outras instituições. 

As intervenções, todas elas exprimindo uma grande sensibilidade para as questões da vida das pessoas e para a necessidade de abrir caminhos para a Paz através da solidariedade e cooperação entre os povos, da defesa do desarmamento, foram muito bem recebidas. Duas intervenções registei com particular atenção: A do padre católico local e do jovem representante da Frente Democrática Brasileira de Lisboa. 

Foi uma grande iniciativa mas como já sabemos a comunicação dita social não noticiou.

No final do Encontro a Presidente da Juventude Católica Portuguesa, apresentou o seguinte documento que foi muito aplaudido por todos os presentes.

Apelo à defesa da PAZ

No encerramento deste Encontro pela Paz, que consideramos de grande oportunidade e importância, e em nome das organizações que o promoveram, saudamos todos quantos participaram e contribuíram para a sua realização e afirmamos o nosso empenho para que prossiga e se alargue ainda mais a convergência de vontades e a acção em defesa da paz, considerando-a essencial à vida humana e uma condição indispensável para a liberdade, a soberania, a democracia, o progresso social, o bem-estar dos povos – para a construção de um mundo melhor para toda a Humanidade.

Reconhecendo que a defesa do espírito e dos princípios da Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional é base fundamental para o fim do militarismo, da corrida aos armamentos e da guerra, assim como para defender e promover a paz e o desenvolvimento de relações mais justas e equitativas entre os povos de todo o mundo, afirmamos o nosso empenho e apelo à promoção de uma cultura de paz e de solidariedade entre os povos, dando particular atenção aos povos vítimas de ingerência, de agressão e de opressão, incluindo os refugiados, e desenvolvendo uma acção de incentivo à paz e à cooperação em alternativa à guerra e à rivalidade nas relações internacionais.

Considerando da maior importância a educação para a paz, nomeadamente junto das novas gerações, em prol dos valores da paz, da amizade, da solidariedade, da cooperação, da dignidade e da equidade – valores que devem caracterizar as relações entre os Estados e entre os povos –, afirmamos o nosso empenho e apelo a que se promovam iniciativas neste âmbito, designadamente, com escolas, associações e autarquias, nomeadamente em torno do Dia Internacional da Paz (21 de Setembro) e dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Conscientes da premência do fim das armas de extermínio em massa, nomeadamente de todas armas nucleares, afirmamos o nosso empenho e apelo a que se promovam iniciativas públicas que não esqueçam os bombardeamentos atómicos de Hiroxima e Nagasáqui e o Dia Internacional para a Abolição Total das Armas Nucleares (26 de Setembro) e pugnem pela assinatura e ratificação por Portugal do Tratado de Proibição das Armas Nucleares.

Recordando que em 25 de Abril de 2019 se comemoram os 45 anos da Revolução de Abril, que acabou com 48 anos de fascismo e 13 anos de guerra colonial, e que consagrou na Constituição da República Portuguesa importantes princípios de relações internacionais para Portugal e o povo português – como a independência nacional e a igualdade entre os Estados, o respeito dos direitos humanos, dos direitos dos povos, a solução pacífica dos conflitos internacionais, o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares ou a criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos – afirmamos o nosso empenho e apelo a que se promovam as suas comemorações.

Conscientes de que a paz é um direito fundamental da Humanidade, sem o qual nenhum outro estará garantido, e alertando para os perigos que a ameaçam, consideramos que este Encontro pela Paz foi um passo importante para o movimento da paz no nosso País e afirmamos a vontade de continuar a unir esforços em Portugal na defesa da paz no mundo, assumindo o compromisso de realizar um novo Encontro pela Paz, pois, pela paz, todos não somos demais!

Encontro pela Paz, Loures, 20 de Outubro de 2018

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