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01/11/23

2050

Mário Martins



https://www.google.com/search?q=ponto+de+interrogação




Em 2023, 2050 parecia um ano distante, mas as projecções e cenários já davam uma ideia do que podíamos esperar.”
Revista do Expresso, de 4 de Agosto passado.


“É Quinta-Feira, dia 4 de Agosto de 2050. Está um dia quente como agora está quase sempre. Já não temos uma ou duas ondas de calor por ano como no início do século, são mais de cinco e chegam a durar um mês.” Assim começa o artigo da Revista do Expresso, baseado em estudos prospectivos.* 

As praias e as zonas ribeirinhas encurtaram. A temperatura global aumentou 1,5 C e as emissões de dióxido de carbono continuaram a subir até 2045. As temperaturas máximas começam a chegar aos limites humanos de resposta fisiológica. Os trabalhadores agrícolas, varredores de ruas ou operários da construção civil já não conseguem trabalhar ao sol em determinados períodos do ano e foram criadas regras para os proteger, como o governo espanhol tinha feito em 2023, ao proibir o trabalho ao ar livre em dias de temperaturas extremas.

Somos agora um pouco menos de 10 milhões. Mas se o país tivesse fechado as portas à imigração seríamos menos de 9 milhões, o que, segundo os especialistas, poria em causa o funcionamento da economia. Muitos imigrantes foram abandonando as suas terras para fugir aos problemas criados pelo crescimento acelerado da população. Países como Níger, República Democrática do Congo, Mali, Somália, República Centro-Africana, Chade e Angola, duplicaram o número de habitantes em 30 anos. Além disso, as alterações climáticas tornaram muitos lugares inabitáveis. As pessoas vão ter de sair dessas zonas, senão morrem.

A boa notícia é que algumas das pessoas que tinham mais de 70 anos em 2023 podem ver como é o país em 2050 porque temos mais de 10 mil portugueses com idades acima dos 100 anos: mais mulheres – quase 9 mil – do que homens.

Já em 2022, a Direcção Geral de Saúde alertava para o risco de aparecerem doenças associadas ao aquecimento global, como a febre amarela, infecção por vírus Zika, Dengue ou Malária, para além do risco esperado da prevalência de doenças crónicas. Apontava ainda para o risco das infecções virais com potencial pandémico, para a mortalidade associada ao calor e frio extremos, a resistência aos antibióticos, e as emergências em saúde pública. Foi útil que a Organização Mundial de Saúde tivesse criado em 2023 um grupo de trabalho para preparar a resposta à crise de saúde seguinte, quer fosse uma pandemia, uma crise ligada ao clima ou uma quebra da cadeia de fornecimento de alimentos. 

Os insectos e as algas ganharam mais espaço na alimentação nas últimas décadas, tal como a FAO recomendava, incorporados como ingredientes em alimentos processados e rações para animais.

Nas marmitas de almoço para o trabalho levamos mais alimentos das hortas que existem nos telhados dos edifícios, em terraços, varandas e cozinhas. Também desperdiçamos menos porque Portugal foi obrigado pela Comissão Europeia a reduzir o desperdício alimentar per capita na restauração e em casa, em 30% até 2030.

Agora, nos campos agrícolas, por década, temos mais dois ou três anos de seca severa do que tínhamos no passado e contam-se entre 20 e 45 dias de risco extremo de incêndio todos os anos. 

As cidades tornaram-se mais verdes. Os carros são eléctricos e mais partilhados. Os transportes públicos melhoraram e andamos mais de comboio. Já em 2023, em Berlim, estava a nascer uma cidade dos dias de hoje: sem carros voadores nem arranha-céus, com habitação acessível, ruas quase sem carros, espaços verdes, biodiversidade e um uso eficiente de água e energia. Dentro das nossas casas é praticamente tudo eléctrico e quase 100% com origem renovável.

Quanto à economia portuguesa, as nossas empresas tornaram-se mais digitais porque foi esse o rumo do mundo. Os custos dos equipamentos e da computação foram diminuindo, e houve avanços na neurotecnologia, realidade virtual e nanotecnologia, além de muitas aplicações da inteligência artificial.

Continuamos também a explorar o Espaço. Por exemplo, a NASA e a Agência Espacial Europeia conseguiram levar a espécie humana a Marte, embora a tão falada “colonização” do planeta seja ainda um sonho longínquo. Confirma-se a existência de vida microbiana simples em Marte e Enceladus, uma das luas de Saturno, através do estudo de amostras do solo marciano, trazidas para a Terra.

Somos 9,7 mil milhões, a população mundial deverá crescer até aos 10,4 mil milhões em 2086 e só então começará a diminuir, segundo as Nações Unidas.

O artigo lembra que o retrato de Portugal em 2050 dependerá, em parte, do que os portugueses fizerem do país nas próximas duas décadas e meia.

À guisa de comentário final, 26 anos são um período largo de tempo em que pode acontecer algo de totalmente inesperado que mude as regras do “jogo”. Mas se “é difícil fazer previsões, especialmente sobre o futuro” – frase geralmente atribuída ao famoso físico dinamarquês Niels Bohr, um dos pais da mecânica quântica - é de elementar prudência levar a sério os avisos e recomendações fundados no conhecimento de que dispomos em 2023, o qual permite traçar um 2050 virtual.


*Projecções de População Residente 2018-2080”, INE 2020; “Ageing Report 2021”, Comissão Europeia 2021; “Eurostat Population Projections  2022-2100”, artigos científicos do “Roteiro Nacional para a Adaptação 2100”, APA/FCUL 2022 e 2023; “Migrações e Sustentabilidade Demográfica”, FFMS, 2017; “Plano Nacional de Saúde 2021-2030 – Projecções e Prognóstico”, DGS, 2022; “Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050”, 2019; “Skills Forecast Trends and Challenges to 2030”, OCDE, 2018; “The Future of Food and Agriculture-Alternative Pathways to 2050”, FAO 2018; “Relatório do Estado do Ambiente-Cenários Macroeconómicos para Portugal 2050”, APA, 2022.

CABRA-CEGA

António Mesquita


O vilão do filme, Jean Fournier (um magnífico Melvil Poupaud), alguém que vive de "fazer mais ricos os ricos" gaba-se sempre de fazer a sua sorte que vamos saber depois, passa por contratar dois capangas para fazer desaparecer o seu sócio e ficar com a empresa e fazer o mesmo com o amante da mulher. Prepara-se para despachar a sogra que lhe descobriu o jogo num acidente de caça, quando é alvejado por engano por um caçador furtivo. A ironia forçada no caso deste marido que troçava da mulher por comprar uma lotaria...

Como um Hitchcock filmado em Paris,  o filme prende o espectador do princípio até ao fim, tal é a mestria da sua construção. Mas fica-se com a sensação que a espécie de justiça que nele triunfa - o mau é punido com o seu próprio mal, por obra e graça da deusa do acaso - não corresponde à experiência comum. Se Jean salvasse o seu casamento com mais um  crime às costas, o mundo não deixava de ser o que é. É o espectáculo de todos os dias em toda a parte: a roda da sorte não favorece justiça nenhuma, a não ser na lotaria.

O filme de Allan é um divertimento bem conseguido e o que é o cinema do mestre inglês do suspense? Neste tempo em que as audiências desertaram as salas de cinema em favor do "streaming" de pantufas, herança dos tempos do Covid, só 2% da produção dos estúdios franceses, por exemplo é que que deram algum lucro. O grande cinema tem os dias contados se só contar com o mercado.

Como em obras anteriores, "Match Point" (2005) é o que me ocorre de momento, o conceito de  sorte tem merecido a atenção do realizador. A multidão de adeptos da "raspadinha" estão aí para testemunhar a sua actualidade.

Em "Guerra e Paz",  Tolstoi consagra um capítulo a meio da obra, num arriscado àparte da empolgante narrativa, a esse tema. Por que se deslocaram as forças de vários países europeus para leste em 1812, o ano em que Napoleão invadiu a Rússia? As ínumeras causas dos acontecimentos deixam transparecer a ideia de que ninguém realmente decidiu coisa nenhuma. Simplesmente, aquelas consequências tinham que seguir-se àqueles actos voluntários ou não da  colmeia humana. Não se pode destacar a ambição do famoso corso, nem a susceptibilidade de Alexandre, o czar,  por causa  da desfeita francesa ao duque de Oldemburgo. Diz Tolstoi ( e podemos aceitar ou não a ideia da predestinação que o resultado é o mesmo): " Nos acontecimentos históricos, os chamados grandes homens são etiquetas que dão nome aos acontecimentos, e tal como as etiquetas, não têm senão a mais pequena relação com o acontecimento em si. Cada acto deles,  que lhes aparece como um acto da sua própria vontade, é num sentido histórico, involuntário e relacionado com todo o curso da história e predestinado desde a eternidade".

Oiçamos Schopenauer: "Toda a nação troça das outras e todas têm razão." Razões é o que não falta às diversas partes nos vários conflitos mundiais neste momento. Era preciso decidir numa instância universal incontestávell que não existe. Mas em que seria diferente essa decisão do chamado "julgamento da História", isto é,  se a justiça é diferente da "relação de forças", parece ser o resultado da distância no tempo e do esquecimento. Se não fosse o poema de Homero quem lamentaria Tróia?

Voltando a Woody, um crítico destacou que a  certa altura, este divertimento envia mensagens subliminares à pessoa que assiste no escuro da sala. Como a obsessão com os combóios eléctricos de Jean que faz lembrar, a quem acompanhou o caso, que tal brinquedo figura nas alegações da filha adoptiva de Mia Farrow no célebre processo que envolveu o realizador há alguns anos atrás. A biografia entra subrepticiamento num enredo hitchockiano, como uma assinatura invisível.

Cito as palavras de Owen Gleiberman   sobre "Coup de Chance": "(...) O crime diz bem com Woody Allen. Já sabíamos disso, naturalmente. Sabíamos desde "Crimes and Misdemeanors", o drama que se tornou chocante quando apareceu em 1989 - e se o virmos hoje, é ainda chocante, porque o tema do filme não é só que as pessoas normais cometem crimes (vemos  isso todos os dias no cinema). É que elas parecem perturbantemente normais quando o fazem. Martin Landau como um suave oftalmologista burguês que contrata alguém para matar a sua amante parecia representar a torcida essência de todo o criminoso amador, e o facto de que ele se safou é a parte inquietante. Faz-nos pensar: quantos pessoas como essa andam por aí?"

Diferentemente, neste "Golpe de Sorte", o criminoso não se safou. Foi apanhado pela má sorte, o que a meu ver diminui o filme.
O pensamento do cineasta sobre a vida, certamente motivado pelo a sua experiência pessoal, expressa-se nestas palavras que uma vez proferiu: " Life is full of misery, loneliness, and suffering, and it’s all over much too soon". Todos gostaríamos de acreditar que pelo menos a sorte tem uma venda nos olhos. 

Mas Woody Allen não é talvez um bom guia. Allan Bloom acha que a palavra "eu' é de difícil definição e que "quando Woody Allen se dispôs a ajudar-nos, tornou-se ainda mais difícil fazê-lo." (*)


(*) "The closing of the american mind"

NO CORRER DOS DIAS

Marques da Silva




Para montante do Pinhão, o Douro dispensa a companhia das estradas, concede em relação ao caminho-de-ferro, desde que a linha rompa a pedra dura da montanha e se deixe engolir pelas entranhas desta, espreitando aqui e ali para deleite de quem viaja face à natureza que se deixa surpreender em cada recanto. As estradas envia-as para o planalto, tanto a Norte como a Sul. Voltamos a atravessar o rio à procura da nossa N222 e iniciamos a subida, afastando-nos da leveza da água que viveu connosco os cento e cinquenta quilómetros anteriores. Não é uma escalada, é mais uma subida patamar a patamar ou para não descolarmos da paisagem aqui tratada por mão humana, socalco a socalco, volteando por entre quintas e casas isolados. O rio só o voltaremos a encontrar mais uma vez, antes do fim. Elevamo-nos em altura e afastamo-nos para Sul. O nosso olhar vadia agora entre as cores das folhas da vinha, o verde perdendo espaço para os vermelhos, amarelos e castanhos, numa mistura de encanto irrepetível em cada degrau da montanha que vai descendo como uma cascata. A cor da terra, os muros de xisto, há algo nesta envolvência que nos prende, nos arrebata, nos faz aparecer o mundo com uma candura que nos embala e consola a alma. Os Deuses aprimoraram a mão na construção deste palácio de natureza que parece inovar a cada horizonte que ao nosso olhar se oferece. Os quase riscos brancos que perturbam o azul parecem um esboço de figuras que estão para nascer, uma pincelada que não estraga nem dilui o anil que cobre o fundo como uma protecção do que em baixo se expõe. Ainda estamos longe do cimo da escalada quando paramos no segundo miradouro, um palco onde nos podemos deter e deixar que os olhos absorvam o painel extenso que se estende à nossa frente. São momentos de silêncio, de repouso, sem os atritos da vida nem os obstáculos que a humanidade cria a si própria, pese embora a efemeridade do tempo que nos é concedido viver. A curva delicada do rio, a suavidade das encostas que à distância parecem nuas das cores que fazem nascer o vinho, o matiz da terra num acastanhado acobreado, a pequena vila do Pinhão ao longe, onde o Douro se esconde numa outra curva fechada, o sossego das montanhas como cordilheira estendida, os tons de verde e o cromático das folhas que apresentam o início do Outono. Há bonança nesta perfeição que vemos, desenhada com cuidado e temperança, com o brilho de quem não sente perturbado o ambiente no momento da criação. De que necessita mais a humanidade para além desta natureza paisagística para obter o que tanto procura e parece quase não encontrar, esse estado a que ela própria define como ventura, satisfação, alegria? E no entanto, se deslocarmos o pensamento para além deste horizonte, só vislumbramos sombras, céus plúmbeos, Deuses impiedosos servidos por fanáticos de mente deformada e demente desenterrando passados bíblicos, fantasias ficcionadas em nome das quais arrasam tudo o que não se conforma com os seus pesadelos. Como podemos deixar que a história se repita a cada século?! Como é possível é a pergunta que nos acompanha por estes dias, sem resposta, sem solução e com a convicção que estes alienados podem vencer, impor a sua loucura, pouco se importando se enterram, povos, história e a própria humanidade. E podem vencer porque se sentem apoiados “pelos senhores à força, mandadores sem lei” que desfilam pelos seus palácios para servir em taças douradas o fel do seu poder desmedido, sem se darem conta que o chão a seus pés se derrete levando-os de vez para o altar do inferno, mas com o risco de arrastar a humanidade para esse flagelo. Olhando com a alma embotada pelos pensamentos, apelamos à música de Savall dedicada aos Bórgia, aquele lamento desesperado na morte de Lorenzo O Magnífico, o pranto e a dor misturados numa nascente de água jorrando pelas faces, caindo desamparada na pedra nua, “quem trará água ao meu manancial? Quem será a fonte de lágrimas para os meus olhos, para chorar de noite e de dia”. No canto e nos sons da música, pressente-se o grito das pedras da calçada quando o lúgubre cortejo passa. É um grito humano face ao destempero mental de vampiros sedentos que só saciam a sua raiva violenta no desprezo brutal por tudo quanto é a vida. De novo, e mais uma vez, voltamos a saber por quem os sinos dobram. Não queremos, nem desejamos sair do êxtase deste desenho tão natural e tão belo com a música soberba criada pelo catalão. Sacudimos a alma com desespero para acordarmos deste pesadelo e em voz alta dizemos, para nos separarmos desta realidade tão abrumadora, “Ó meu amor, não acredites na vida mesquinha, não duvides. Dá-me a tua mão e vamos partir por essa estrada fora direitos ao céu!”(1). Ervedosa do Douro está ali a dois passos e a vila de S. João da Pesqueira um pouco mais adiante. São já terras beirãs no alto Douro. O seu património são as vinhas. Do ponto de vista arquitectónico não há muito para ver e sentir, não porque falte passado a estes espaços territoriais, mas antes por não serem local de passagem, mas de estio. Quando o caminho nos levar para Vila Nova, subiremos à aldeia de Trevões para encontrar o que está em registo, mas hoje, ficamos por aqui. Descobrimos a parte mais antiga desta pequena vila, um quase quadrado um pouco afastado da estrada com a sua Torre do relógio e uma mistura do antes com as melhorias do presente sem parecer que estraga ou desfeia. 




[1] Raul Brandão em “Os Pescadores”, Frenesi, Lisboa, 2002

DAVID E GOLIAS

Manuel Joaquim


"David com a cabeça de Golias" de Caravaggio




Há dois dias a minha neta estava a estudar para a escola a Convenção sobre os Direitos da Criança. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos a ONU declara que as crianças têm direito a ajuda e assistência especiais. Reconhece também que para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade a criança deve crescer num ambiente familiar, feliz, com amor e compreensão, ser educada num espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade. A convenção foi adoptada pela ONU em 1989, é válida em Portugal desde 21 de Setembro de 1990 e foi aprovada por 196 países.

Vendo os telejornais, deparamos com imagens e comentários sobre a morte de milhares de crianças e muitas mais feridas em resultado de bombardeamentos indiscriminados sobre populações indefesas. Como é possível isto acontecer e ouvir comentários de ilustres personagens da nossa terra a defenderem a continuação da guerra e não pronunciando uma única vez a palavra PAZ? Esta gente terá mente saudável? Não é possível! 

Como será o comportamento daquelas crianças e daquela gente que escaparem à morte, mesmo estropiadas, perante a sociedade e os seus inimigos? 

A sociedade não está a voltar à idade média como alguns dizem. A Idade Média foi um período onde apareceram condições para a organização da sociedade em novos moldes, para a criação das universidades, para o desenvolvimento das artes e das ciências. Em resultado das guerras a sociedade está simplesmente a ser destruída, o seu património e conhecimento destruídos.

Estamos em pleno período da discussão e aprovação do Orçamento do Estado para 2024. É do conhecimento de toda a gente os problemas nas áreas da saúde e da educação. Com a possível aprovação de 2% do PIB para o sector militar por imposição da NATO, para alimentar guerras, como vai ser o futuro?

Quando era criança, os meus Pais contavam-me uma lenda, a lenda de Pedro Sem, que era um mercador muito rico, com muitos barcos, e que, um dia, uma grande tempestade naufragou-os todos com todas as riquezas que possuía. E Pedro Sem passou a ser o Pedro sem Vintém. 

João Correia Nunes, autor do romance histórico A Nora e os Alcatruzes, descreve a situação de Nuno Tristão, “em meia dúzia de anos de pescador quase modesto passou a principal armador do burgo e dos mais influentes homens bons da Câmara”. Que “ tinha na altura já mais do que precisava, mas menos do que queria” Meteu-se em grandes negócios e na política e o destino levou ao naufrágio de toda a armação. A desgraça chegou.

Miguel Esteves Cardoso, homenageado em Penafiel entre 23 e 29 de Outubro, na “Escritaria 2023”, numa das suas crónicas diárias, na passada sexta-feira, 20 de Outubro, no Público, com o título “A teimosia competitiva”, escreveu:
“A erosão existe. Está a ver aquela arriba majestática que preside à Praia das Gaivotas? Desabou. Levou tempo. Mas desabou. E sabem que mais? Não foram as vagas da tempestade que a deitaram abaixo: foram as ondinhas da manhã seguinte.
A chateza persistente é a fisga de David perante a cagança de Golias. David deve ter atirado duas mil pedradas e Golias virado de costas, a conversar com os fãs. Mas, a certa altura, Golias baixa-se para ver se apanha um mosquito que lhe está a picar a canela, e põe-se a jeito para levar com um calhau nos cornos.
Como se diz em latim, “Eu não tenho nada, mas sou chato como a potassa”?
Quantas pessoas fazem ideia do mal que passaríamos neste mundo sem a potassa?”.

Hoje, David está a usar mais que pedradas. Leva tempo mas tudo pode desabar.  E nada será como dantes.
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