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01/10/22

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O BARBA AZUL

António Mesquita






Creio que não é novo dizer-se que "Monsieur Verdoux" é o menos chapliniano dos filmes do grande Charles Spencer. Não surpreende que esta versão do Barba Azul tenha agradado a Welles por causa do “crime irónico”.

 Um empregado bancário, atirado para a valeta pela crise, ao fim de trinta anos de serviço, que decide utilizar a sua inteligência por conta própria e nos revela assim a natureza criminosa da instituição que serviu, eis a demonstração dum pessimismo sem metáfora.

Como o burguês, dividido no seu ser sentimental, na sua alma e no frio especulador ou negociante de canhões, Verdoux é um "little fellow" simpático, cuidadoso de não pisar a lagarta no seu jardim, pai extremoso e amigo abnegado duma inválida, mas na outra face é um cremador de velhas, o assassino metódico que faz a sua tarefa com a mesma indiferença determinada do antiga caixa. E como se analisasse o resultado económico duma empresa, ele aconselha, enquanto a câmara nos passeia num cemitério, a não ser seguido em caminho tão difícil...

À personagem dividida sucede a lenda e o que ele chama “encontrar o seu destino”. Depois do episódio com o inspector que felizmente para o Barba Azul não era a polícia e, portanto, um golpe de audácia podia eliminar a investigação, como o fogo consumira o retrato, que era a prova que desde o início faltou, dando lugar à história dos crimes, depois da ruína, há um salto no tempo. O personagem aparece-nos sobrevivendo a si mesmo. E aqui o moralismo chaplinesco denota o criminoso, da sua lenda. A generosidade da figura é sempre privada. Está ausente da sua “profissão”. Fora da família, último reduto da verdade moral, é o cinismo. E essa admirável cena em que ensaia o envenenamento da jovem desesperada, como um anti-Calvero, só aparentemente é o desmentido disso. Não é a miséria nem a infelicidade que demovem o calculista de a fazer beber o copo. É a identificação com uma experiência pessoal. O acaso permite-lhe reunir dois actos perfeitamente necessários: desfazer-se da única testemunha e pôr à prova a eficácia do veneno. Verdoux decide, incapaz de continuar a sua vida criminosa sem que isso tivesse uma justificação absoluta – a mulher e o filho tinham já morrido -, terminar a carreira e restituir a sua imagem à dama que ao perder a sua fotografia lhe salvara a vida. Essa nobreza funciona como um cosmético sobre a sua lenda. É o mesmo que se passa com o depoimento no tribunal. Às peripécias mais ou menos cómicas do enredo, com essa nostálgica evocação de Fantomas sobre os telhados de Paris e a cena da florista tão crítica do código amoroso – como nas “Luzes da cidade”, existe aqui uma cegueira de sentido -, contrapõe-se o epitáfio declamatório de Hynkel (no "Grande Ditador") que se tomou por judeu.

O amor à vida e às coisas simples é um tema caro ao criador de Charlot. Que significa esse trago de rum antes da guilhotina se não o célebre pontapé na perisca, ao entrar na prisão?

E há o cinema em Verdoux. O dos outros. “Aurora”. É notável como a ideia do crime se nutre das águas inteiras do lago. O pensamento não seria melhor sugerido por um detalhe. Esse plano adianta a condição óptima do crime: a solidão da natureza. No barco, Chaplin cita-se a si mesmo. Não se trata de nenhuma metáfora, de nenhum fragmento. Nem é a silhueta de Hitchcock. É o clown. A máscara que significa o contrário do sentimento.

Adoro essas viagens de comboio que são a chave da ubiquidade do "lady-killer". Não nos esqueçamos, além disso, que o banco é o modelo profundo deste financiamento da morte. Com o seu ficheiro, as suas transferências de conta, as suas extorsões. Ele gere um capital de solidão disperso no território das pequenas agências.

E para terminar, o sintagma do romance policial. A conversação distanciada sobre o crime perfeito. Há uma situação dessas em “Suspicion”. A revelação jocosa pelo farmacêutico da fórmula do veneno que seria de molde a diluir o interdito na amoralidade da hipótese é compensada pelo comentário horrorizado duma personagem que o espectador sabe incapaz de conceber tal crime.

Porque a família de Verdoux está fora da “comédia”. É um pressuposto de ordem ética colhido na melodramaturgia chaplinesca.

NO CORRER DOS DIAS

Marques da Silva






Aguardar por alguém deve ser sempre um acto de paciência, não no sentido negativo da resignação ou da tolerância, mas da constância. Não devemos considerar o tempo de espera, um tempo perdido, mas antes de aproveitamento para reflectir, sobre a vida e o tempo que vivemos, o passado e o que há-de chegar. Há vários dias que te aguardava na pequena cidade siberiana que leva o nome do rio que corre um quilómetro a Sul, o Shilka. Este rio é a continuidade do Onon, após este receber a corrente do Ingota e muito mais para a frente quando encontrar o Ergun, faz nascer o longo rio Amur. Sabendo de antemão que vais acompanhar o Amur na sua viagem para o mar, não tinha dúvida sobre a tua passagem por esta cidade com cerca de treze mil habitantes que o transiberiano toca na sua passagem. Os dias foram passando na quietude do lugar que fui percorrendo, seduzido pelo trânsito dos longos comboios certamente a caminho de Vladivostoque e revivendo a viagem que até ali me levara após o nosso último encontro no Cáucaso, trazendo comigo as preocupações que deixaste transparecer sobre os tempos negros que sobrevoam a humanidade. As nuvens que toldavam a Europa encheram-se de escuridão como nos momentos que antecedem as grandes trovoadas e de certa forma ansiava por conhecer como o teu pensamento contemplava as convulsões que começam devagarinho a bater à porta das democracias coloniais. Uma manhã, descia a longa Ulitsa Oktiabrskaia para deixar que o olhar se perdesse nas colinas montanhosas que se vêem ao longe na margem direita do Shilka quando me apercebi da tua presença em sentido oposto. Aguardei com alegria contida que te aproximasses e quando olhaste para o horizonte vi nascer-te no rosto esse teu sorriso inconfundível que me faz sempre lembrar as palavras do poeta cantor, “aprendi a amar a madrugada que desponta em mim quando sorris”. Senti que chegara o momento de escutar as tuas vivências. Sentamo-nos no Baikal que não cheguei a perceber se era café restaurante ou restaurante que servia café, mas pouco importava, o mais importante é que estávamos em sossego. Olhava esse teu silêncio que antecede sempre as tuas palavras e deixei que o tempo deslizasse. “Quando penetramos nas montanhas Khentii”, disseste tu como se estivesses a continuar uma conversa e não no seu início, “sentimos que penetramos num espaço sagrado. Os mongóis são muito zelosos e a ideia de que alguém vai atravessar aquele território protegido deixa-os em sobressalto e se vais sozinho e sem guia, percebemos a incredulidade que se estampa nos seus rostos. São dias inteiros caminhando por uma paisagem soberba. A quietude que se sente quase nos imobiliza. Os lagos, a vegetação, os cursos de água, sucedem-se desenhando mantos de beleza que devido ao facto de o nosso movimento apeado ser lento, penetra-nos de tal forma que parecem fotografias coladas no nosso cérebro, como se desfolhássemos um livro e cada página nos revelasse um segredo. Quando por fim, encontrei a nascente do Onon, numa espécie de pântano impossível de caminhar, senti-me fisicamente cansada e por ali me deixei ficar longas horas em repouso contemplativo. Tentei esvaziar o pensamento, mas não o alcancei totalmente. Ao visitar o passado, ocorreu-me uma descrição de Malraux numa das suas obras. Dois generais republicanos conversavam num fim de tarde após uma batalha ganha pelo exército que comandavam. Faziam-no numa igreja que naquele momento era utilizada pelas forças governamentais. Em certo momento, escutam sons de música que sobe pelas paredes e se espalha pela abóbada. Um soldado tocava no órgão um Requiem e ambos se evadiram dos seus diálogos guerreiros e deixaram que o pensamento se diluísse na beleza dos sons. Na nascente do Onon senti essa música invadir-me quando pensei na Europa.” O teu discurso fluído até então, teve uma paragem como se tivesses tido necessidade de revisitar um espaço para além daquele onde nos encontrávamos. Ao fim de alguns minutos, regressaste com uma voz sumida, e quase num murmúrio ouvi-te fazer uma pergunta, “já pensaste como a humanidade tende a repetir os erros? Há oitenta anos atrás, os líderes das nações coloniais correram a Munique para cumprimentar a serpente e agora correm para a margem do Dniepre em abraços esfuziantes. Bem dizia Malraux, ‘Sempre vi as democracias intervir contra tudo, excepto contra os fascismos’. Que palavras sábias. Fazem-nos caminhar à beira do abismo e exigem que acreditemos que estamos a atravessar uma planície. Sãos uns bastardos. Sabes, os comandantes que foram surpreendidos pelos sons do requiem, falavam sobre Unamuno”. Mas Unamuno não estava do lado da infâmia golpista?, arrisquei de forma um pouco provocatória para lhe incentivar o pensamento. “Unamuno era um intelectual do século XIX e a aparente desordem da República perturbava-o, mas cedo percebeu que os que falavam em nome da pátria, de Deus e da família, eram apenas o exército da barbárie e não dúvidas em enfrentar a escumalha que se alojou no território sagrado da sua Universidade. Só a sua grandeza intelectual permitiu que dissesse a essa escória humana que foi Millan Astray, ‘O senhor é um aleijado, como Cervantes, mas sem a sua grandeza, e procura um alívio sinistro ao seu aleijão causando mutilações à sua volta’. Astray além de fascista era um acéfalo, violento e sem escrúpulos”. As horas fluíam tranquilas enquanto te escutava e olhava o teu rosto onde se liam preocupações que este tempo nos sobrecarrega, não o tempo mas essa gente que se apoderou dele e nos condiciona o presente e o futuro como já o fez no passado. Foste descrevendo o teu lento caminhar até Shilka e agora ali estávamos prontos para descer ao longo do Amur. Quando te afastavas ainda te perguntei por leituras, o que lias. “Ler? Já não leio muito, a não ser sobre o mar, de quem sou, cada dia que passa, uma amiga mais íntima…”. Sorriste e compreendi que respondias com as palavras de Unamuno.


Nota – As citações foram extraídas da obra de André Malraux, "A Esperança".

LIÇÕES DE MESTRE (A FECHAR)

Mário Martins


https://www.fnac.pt/Sete-Breves-Licoes-de-Fisica-Carlo-Rovelli/



NÓS

Se o mundo é um pulular de efémeros quanta de espaço e de matéria, um imenso jovem jogo de encaixes de espaço e partículas elementares, o que somos nós? Somos também nós feitos apenas de quanta e partículas? Mas então de onde vem essa sensação de existir singularmente, e na primeira pessoa, que cada um de nós experimenta?

Nós”, seres humanos, somos acima de tudo o sujeito que observa este mundo, mas também somos parte integrante do mundo que vemos, não somos observadores externos. Estamos situados nele. A nossa perspectiva sobre ele é a partir de dentro.

As imagens que construímos do universo vivem dentro de nós, no espaço dos nossos pensamentos. Entre essas imagens e a realidade da qual fazemos parte, existem inúmeros filtros: a nossa ignorância, a limitação dos nossos sentidos e da nossa inteligência, as próprias condições que a nossa natureza de sujeitos, e sujeitos particulares, impõe à experiência. Essas condições, todavia, não são universais, como imaginava Kant, deduzindo então, evidentemente sem razão, que a natureza euclidiana do espaço e até a mecânica newtoniana deveriam, a priori, ser verdadeiras. São a posteriori da evolução mental da nossa espécie e estão em evolução constante. Não só aprendemos como aprendemos também a mudar gradualmente a nossa estrutura conceptual e a adaptá-la àquilo que aprendemos.

A informação que um sistema guarda acerca de outro sistema não tem nada de mental ou subjectivo, é apenas o vínculo que a física determina entre o estado de uma coisa e o estado de outra coisa qualquer. A substância primeira dos nossos pensamentos é uma riquíssima informação recolhida, trocada, acumulada e continuamente elaborada.

Mas também o termostato do meu aquecedor “sente” e “conhece” a temperatura da minha casa, logo, tem informação sobre ela, e desliga o aquecimento quando está calor que baste. Qual é a diferença entre o termostato e eu, que “sinto” e que “sei” que está calor, que decido livremente ligar ou não o aquecimento e que sei que existo? Como pode a troca contínua de informações na natureza produzir-nos a nós e aos nossos pensamentos?

O que significa sermos livres de tomar decisões, se o nosso comportamento não faz senão seguir as leis da natureza? Existirá porventura em nós algo que escapa às regularidades da natureza e que nos permite torcê-las e desviá-las com o nosso pensamento livre? Se algo em nós violasse as regularidades da natureza, já o teríamos descoberto há muito tempo. Não há nada em nós que viole o comportamento natural das coisas. Ser-se livre não significa que os nossos comportamentos não sejam determinados pelas leis da natureza. Significa que são determinados pelas leis da natureza que agem no nosso cérebro. As nossas decisões livres são livremente determinadas pelos resultados das interacções fugazes e riquíssimas entre os milhares de milhões de neurónios do nosso cérebro: são livres quando é o interagir desses neurónios a determiná-las. Significa isto que quando decido sou “eu” a decidir? Sim, claro, pois seria absurdo perguntar se “eu” poderei fazer algo diferente daquilo que o complexo dos meus neurónios decide fazer: as duas coisas, como, no século XVII, compreendera com uma lucidez maravilhosa o filósofo holandês Baruch Espinosa, são a mesma coisa. Não existo “eu” e os “neurónios do meu cérebro”. Um indivíduo é um processo, complexo mas estreitamente integrado.

Quando dizemos que o comportamento humano é imprevisível, dizemos a verdade, pois é demasiado complexo para ser previsto, sobretudo por nós mesmos. Temos centenas de milhares de milhões de neurónios no nosso cérebro, tantos quantas as estrelas de uma galáxia, e um número ainda mais astronómico de ligações e combinações em que eles se podem encontrar. Não estamos conscientes de tudo isto. “Nós” somos o processo formado por esta complexidade, não o pouco de que estamos conscientes.

Aquilo que é especificamente humano não representa a nossa separação da natureza, é a nossa natureza. É uma forma que a natureza assumiu aqui no nosso planeta, no jogo infinito das suas combinações, do influenciar-se e trocar correlações e informações entre as suas partes. Quem sabe quantas e que outras extraordinárias complexidades, em formas porventura completamente impossíveis de imaginar para nós, existirão nos espaços infindos do cosmos…

Novos instrumentos permitem-nos hoje observar a actividade do cérebro em tempo real e mapear com impressionante exactidão as redes intrincadíssimas do cérebro. Ideias precisas acerca da forma matemática das estruturas que podem corresponder à sensação subjectiva da consciência são discutidas não só por filósofos como também por neurocientistas. Uma delas chama-se “teoria da informação integrada” e é um esforço no sentido de caracterizar de forma quantitativa a estrutura que um sistema terá de ter para ser consciente. Mas ainda não temos uma solução convincente e partilhada para a pergunta sobre como se forma a consciência de nós mesmos.

Julgo que a nossa espécie não durará muito tempo. Não parece ter o estofo das tartarugas, que continuaram a existir semelhantes a si mesmas ao longo de centenas de milhões de anos. Pertencemos a um género de espécie de vida breve. Os nossos primos já se extinguiram todos. Somos talvez a única espécie da Terra ciente da inevitabilidade da nossa morte individual: receio que em breve devamos tornar-nos também a espécie que verá conscientemente chegar o seu próprio fim ou, pelo menos, o fim da própria civilização. Como soubermos enfrentar, melhor ou pior, a nossa morte individual, assim enfrentaremos o colapso da nossa civilização. Não é muito diferente. E não será por certo a primeira civilização a entrar em colapso. Nascemos e morremos como nascem e morrem as estrelas, tanto individual como colectivamente. Essa é a nossa realidade.

A natureza é a nossa casa e na natureza somos a casa. Somos feitos da mesma poeira das estrelas de que são feitas as coisas e, tanto quando estamos mergulhados na dor como quando rimos e a alegria resplandece, não fazemos senão ser aquilo que não podemos senão ser: uma parte do nosso mundo.

Lição final a reter: na lição anterior Rovelli interroga: o que é que aquilo que sabemos ou não sabemos tem a ver com as leis que governam o mundo? E responde: (as coisas, como uma colher fria aquecer no chá quente ou um balão esvoaçar quando deixado à solta) comportam-se como devem, seguindo as leis da física, de forma totalmente independente do que sabemos ou não sabemos acerca delas. A previsibilidade ou imprevisibilidade do seu comportamento não dizem respeito ao seu estado exacto. Dizem respeito ao conjunto limitado das suas propriedades, com as quais nós interagimos. Por outras palavras, Rovelli repete aqui o que, na primeira metade do século XX, Bohr e Heisenberg haviam dito a propósito da relação entre a mecânica quântica e a natureza (ver lição nº. 2). Ecco qua...

NB: Salvo o meu comentário final e o critério de transcrição do que me pareceu mais importante, não acrescentei nada a esta última lição de Rovelli.

UM MUSEU

Manuel Joaquim



https://images.app.goo.gl/ZkFC2gJyoFWcaY4J6




A Organização dos Reformados, do SINAPSA, Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins, no passado dia 29 de Setembro, realizou uma visita guiada ao Museu Nacional Ferroviário, no Entroncamento. O Transporte foi efectuado no comboio intercidades, entre o Porto e Entroncamento, e entre Lisboa e Entroncamento. 

A visita foi muito interessante, pela forma como o museu está organizado, pela alta qualidade dos materiais expostos e pelo saber e capacidade de comunicação do guia, João Paulo Geraldes Marques. A história dos Caminhos de Ferro Portugueses está ali bem como uma parte da história de Portugal dos últimos 170 anos.

Em 28 de Maio de 1853, a Rainha D. Maria II, inaugurou o início da construção da primeira linha férrea de Portugal que pretendia chegar a fronteira de Espanha e ao Porto. A Rainha empurrou um carrinho com areia que com uma pá descarregou no chão. Foi o acto para o início dos trabalhos que foram executados por uma empresa inglesa. Passados três anos, foi inaugurada a ligação entre a primitiva estação de Santa Apolónia e o Carregado. Foi em 28 de Outubro de 1856 que foram percorridos os primeiros 36 quilómetros.

O Rei D. Pedro V e o Ministro das Obras Públicas Fontes Pereira de Melo, foram as personalidades a quem se deve o arranque dos caminhos-de-ferro em Portugal.

Ao longo dos tempos foram criadas comissões para estudar a implantação da rede ferroviária. Muitos projectos tiveram seguimento. Outros não tiveram os seguimentos previstos nos próprios projectos. No entanto, pode dizer-se que o território foi coberto por linhas, desde Trás-os-Montes, ao Alentejo e até ao Algarve.

O jornal do Rio de Janeiro, “Jornal Português”, de 27 de Setembro de 1927, publicou o traçado do caminho-de-ferro de Castelo Branco a Placência, com o título “DE LISBOA A MADRID em oito horas”. Em Setembro de 2022, uma jornalista fez esse percurso e demorou cerca de 12 horas. Passaram-se 95 anos. O que pensar?

Em 1988, o governo de então, de Cavaco Silva, publicou o “Plano de Modernização dos Caminhos de Ferro 1988-1994". O projecto da linha do Norte, passados estes anos todos, continua por realizar-se. A partir dessa altura, encerraram-se vias, principalmente em Trás-os-Montes, no Alentejo e noutras regiões do interior. Viseu perdeu o comboio em 1988. A linha do Tua quando foi desmantelada roubaram as travessas de madeira que entretanto apareceram em casas e quintas. Nos processos e julgamentos que andaram nos jornais, de sucateiros a oferecer robalos, apareceram referências ao desaparecimento dessas travessas. Mas não foi devidamente investigado. Foi mais um plano que custou milhões que foi  para o lixo.

 A Sorefame, fundada em 1943, que teve um papel fundamental na indústria metalomecânica pesada, que fabricava todo o material circulante, designadamente comboios e que exportava, começou a ser desmantelada nos anos noventa e extinta em 2001. Fez parte do processo de destruição de toda a indústria pesada que ocorreu nessa época; Siderurgia Nacional, Cometna, Mague e outras.   

Há três dias, esteve no Porto, António Costa, Primeiro-ministro e Pedro Nuno Santos, Ministro das Infraestruturas e da Habitação, para apresentarem o projecto da linha de alta velocidade para ligar Porto e Lisboa, em 1hora e 15 minutos. É um projecto que já foi apresentado pelo governo de José Sócrates. Mas a obra só deve começar em 2024. Diversas personalidades que vivem à custa do orçamento do Estado estiveram presentes no acontecimento, que pelos vistos começou logo pela manhã. Os comboios actuais que fazem a ligação Porto-Lisboa não estão a ser aproveitados devidamente. Mas gostam de dizer que vão gastar muitos milhões para impressionar o Zé. Ao longo de tantos anos e de tantas promessas, pode aceitar-se todo este folclore? 

O Museu do Entroncamento pode ser visitado com visita guiada por PAULA MOURA PINHEIRO no portal do próprio Museu ou no YOU TUBE.

Em Bragança existe também um Museu Ferroviário muito interessante. Está instalado na antiga estação. 
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