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30/09/07

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A COBERTURA DOS ACTIVOS PELA PREVIDÊNCIA

http://observer.case.edu/Images/1405.png

(…/…)


A Cobertura dos Activos pela Previdência Social

1960

Benef.activos Pop. activa Taxa de cobertura

(milhares) (milhares) (%)

Caixas Sind
e de Reforma 878,5 1.823,9 48,2

Casas do Povo
e de Pescad. 305,5 1.491,8 20,5

Fonte: INE - Estatísticas de Previdência 1960


A construção da habitação social foi financiada pela Previdência.

Estavam excluidos os riscos de maternidade, sobrevivência, desemprego, acidentes de trabalho e doenças profissionais, apesar de previstos no Estatuto do Trabalho Nacional.

A população do sector primário não tinha protecção contra a invalidez e a velhice. As Casas do Povo e as Casas dos Pescadores praticavam simplesmente a assistência social e médica.

A Lei nº 1884, de 16 de Março de 1935, previa a criação de Caixas de Previdência para o sector primário mas nunca foram instituidas.

Em relação ao desemprego tinha sido prevista legislação que nunca foi publicada. Foi criado um Fundo de Desemprego pela Lei nº 21.699, em 1932, financiado pelas contribuições das entidades patronais (1% da massa salarial), dos trabalhadores (2% dos salários) e por uma transferência de 2% da receita do imposto sobre a propriedade predial e urbana. Ficará fora do sistema da previdência até 1986.

As insuficiências eram por demais evidentes e perigosas para o poder político.

1962 - Lei nº 2115, de 18 de Junho - Reforma da Previdência

Reorganização da estrutura do sistema. As Caixas Sindicais serão especializadas na previdência dos assalariados. As Caixas de Reforma destinam-se à previdência dos trabalhadores independentes.

É criado um subsídio de invalidez para as pessoas abrangidas pelas Casas do Povo e dos Pescadores que mantêm, no entanto, a situação anterior de instituições de simples assistência social e médica.

Instituições de 1ª Categoria:

Caixas Sindicais de Previdência:
( desdobram-se em)

Caixas de Previdência e Abono de Família

Caixas de Seguros

Caixas de Pensões


Casas do Povo


Casas dos Pescadores

As Caixas Sindicais de Previdência organizam-se a nível regional (com excepções), formam as Caixas Distritais e criam uma Federação Nacional.

Cobertura:

Doença

Maternidade

Abono de Família

1963 - Decreto-Lei 45 266, de 23 de Setembro de 1963

Regulamento das Caixas Sindicais de Previdência

Prazos de Garantia:

Invalidez: 5 anos de inscrição - 30 meses contribuições
Velhice: 10 anos de inscrição - 60 meses contribuições

1965 - Caixa Nacional de Pensões

Cobertura:

Invalidez

Velhice

Morte

- Regime Geral de Previdência

Introdução de alterações significativas em critérios e administração.

Alteração do regime de capitalização para o regime de capitalização mitigada ou misto.

- Lei nº 2.127, de 3 de Agosto - Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais

- Caixa Nacional de Seguros e Doenças Profissionais

- Caixa Central de Segurança Social dos Trabalhadores Migrantes - Acordos e Convenções Internacionais de Segurança Social.


LIVROS, LEITURAS E UM POETA

Pablo Neruda (1904/1973)


Há livros que para mim são de leitura imprescindível, pelo que os adquiro mal aparecem nas livrarias. Por vezes, razões superiores provocam um ligeiro adiamento, mas adquiridos a leitura inicia-se de imediato. Este que vos venho aqui falar, não só não foi uma desilusão como, pelo contrário, excedeu em muito as minhas expectativas que já eram grandes. Primeiro, porque é da vida de um poeta que nos fala, depois porque esse poeta é Neruda e, por último, leva-nos à história do Chile no século XX e a sua ligação à Europa. Já conhecia um pouco do país do sul, mas dei comigo a procurar no atlas, lugares, cidades, regiões, a percorrer imaginariamente todo aquele país, desde Arica até à Terra do Fogo onde é quase inimaginável aceitar que ali se possa viver. O poeta nasceu no Sul, bem longe de Santiago, em terras indígenas da Araucânia, terra de autóctones despojados de identidade pelos colonizadores e quase se torna difícil imaginar o que seria percorrer 500 kms de comboio até Concepción e ainda mais para sul, para Temuco e Parral onde a infância de Neruda o ajudou a sonhar o mundo. Pensar em Porto Saavedra onde encontrava o mar em tempo de férias, é quase um acto de fantasia tão a sul nos encontramos. Foi ainda adolescente que iniciou a escrita poética sobre o ar reprovador do pai que nunca lhe perdoaria essa profissão indigna e lhe cortaria a mesada, facto que o levou a imensos dias de fome nas ruas de Santiago dos anos 20. Uma das suas obras mais emblemáticas é escrita nesta época quando pensava que o havia sido numa fase mais adiantada da vida. Albertina, a mulher de Temuco que nunca lhe disse sim, foi a responsável por aqueles “Vinte Poemas de Amor e Uma Canção Desesperada”. A sua vivência na Ásia nos anos 30 como cônsul quase toca o surrealismo, mas será na Espanha republicana que despertava em sonho e magia para a democracia que vai recolher muito do saber que lhe vai condicionar as escolhas para o resto da vida e mudar o tom da poesia. As suas amizades com Garcia Lorca e Rafael Alberti serão momentos decisivos, os quais juntamente com a violência da guerra civil e a barbárie fascista com o seu grito de Viva la Muerte, não deixarão de lhe seguir as reflexões e as suas decisões políticas.

Volodia Teitelboim seu amigo de sempre, ainda vivo, e autor da obra, numa escrita cristalina, pura, engrandece o tema, a vida e dimensiona o sonho para outras amplitudes, facto que me impele para citar algumas poucas, mas longas das palavras que escreveu como aquelas que descrevem a primeira experiência política do poeta como candidato a um cargo de senador por um círculo do norte, região paupérrima e mineira. Escreveu Volodia citando por vezes Neruda: «A inteligência dos poetas desde há tempos afastou toda a relação humana do que dizem e toda a cordialidade e amizade para com a mensagem poética e eles afastaram-se do Mundo, mas na verdade que outro objectivo há na poesia que não seja o de consolar e fazer sonhar? (…) a poesia deve encher-se com a substância universal, as paixões e as coisas. Isto quero eu fazer: uma poesia poética. Das minhas curiosidades científicas, da minha admiração pelos automóveis, da minha atracção por essa natureza exótica bem pouco fica quando à noite me ponho a escrever, sozinho, diante da folha de papel. Então, apenas existo com as minhas angústias, as minhas alegrias, as minhas paixões pessoais…». É pois este homem apaixonado que agrupa palavras que nos encantam e nos elevam a capacidade de sonhar que fica quase sem voz perante a multidão que se aglomera à sua frente com a esperança de consolo, de compreensão e vontade de justiça. Neruda não lhes vai falar como político, nem como homem, mas antes e apenas como o poeta que com a pena na mão grava cenários de justiça e de liberdade para a alma de homens fatigados. É ainda Volodia a descrever-nos esse momento: «A curva melódica da voz não experimentou a mais leve modificação. Mas depois de um breve tempo revelou-se como o ruído de águas lentas, como um sopro de ar diferente, não porque a mensagem que saía dessa garganta fosse cristalina e refrescante, mas porque o que diziam as suas palavras dava de beber a um espírito sedento um certo halo embriagador, criavam um clima envolvente, geravam uma atmosfera onde se divisava a luta de uma alma tempestuosa que falava de um mundo interior habitado por muitos fantasmas, evocava a aventura de um homem, a vida solitária e as viagens, falava da consciência e da linguagem, que não nos podia deixar tal como éramos antes de o escutarmos nesse recanto da galeria do Teatro Miraflores».

Do Chile possuo sempre a ideia de uma nação com os Andes a vigiá-la, de grandes alturas, as quais baixam de forma abrupta para que essa vigia não se perca e desses milhares de metros de altura, percorre-se o país de norte a sul até se desmoronar na Terra do Fogo em pleno Estreito de Magalhães onde neves eternas e um vento glacial paralisam a mente dos homens. Sempre olhei parar a cordilheira com aquele sabor com que a magia nos enche os sonhos de forma fantasiosa, fazendo renascer fantasmas e medos que se espalham por entre a virgindade de profundas florestas, pelo silêncio de gargantas escuras apertadas entre muralhas de rocha. Eleito senador, os seus discursos vão incomodar o poder, sobretudo o de um Presidente moral e eticamente miserável que o vai perseguir, tornar clandestino e obrigar a procurar o exílio. Só que a sua saída do Chile tem de fazer-se no maior dos segredos, por caminhos insondáveis e guiado por homens que chegamos a duvidar que existam. «Afirmou isso vinte e dois anos depois dos acontecimentos, quando teve de atravessar os Andes em busca dessa difícil fronteira. A reminiscência longínqua é um canto aos bosques do seu país, igualmente distante. Eram como túneis, onde não havia caminhos e tudo parecia inacessível, mas havia algo pior do que a existência de clareiras e carreiros: os cavaleiros tinham de abrir passagem por entre as árvores que eram como muralhas, através de rios quase infranqueáveis, por rochas cujas fissuras deviam encontrar, porque andavam em busca da liberdade. Mas mais importante que tudo isso, ou mais grave se se pode assim dizer, era o sentido da orientação. Precisavam de se guiar pelas indicações feitas nas árvores que assinalavam a rota invisível. É um mundo do verde e do silêncio, a Natureza virgem e adversa, onde a solidão se une à surpresa e ao perigo. E havia um outro opositor, a neve, que em certos lugares nunca se derrete de todo. Avançavam à força de golpes de machado, cortando ramos para fazer passar os corpos e os cavalos pelo meio das grandes coníferas e muitas delas serviam de túmulo aos viajantes que tombavam. A marca da sua passagem era os ramos cortados, mas também o perigo dos rios, que nesta região do Mundo são bem diferentes dos europeus. Nascem nos cumes dos Andes, caem em cascata a uma velocidade louca e arrastam tudo o que encontram na rápida passagem». Quando tudo parecia perdido acabou a passar a última noite numa estalagem existente no interior daquele mundo fantástico longe dos homens e das gentes. Adormeceu após um diálogo indescritível, para no dia seguinte já em plena Argentina voltar a ser um homem livre.

Andou pela Europa, pela França até que os anos fizeram esmorecer o poder desse miserável presidente e Neruda pôde regressar ao seu Chile de sempre. À sua chegada proferiu as palavras que só um poeta podia proferir, incentivando a que se olhe para a frente, sem ter de esquecer o que ficou para trás. «Cheguei sem condições, porque houve no meu regresso uma luta triunfante que se iniciou no momento em que saí do país. A história é a ciência do passado, mas a política não é a história. É a criação de novas fontes vitais para assegurar o cumprimento das esperanças do povo. Se estivermos voltados para trás, não poderemos avançar. O que não quer dizer que esqueçamos as coisas».

Muito mais tarde, voltará a esta reflexão sobre o olhar para a frente e para trás como só os poetas sabem fazer, agarrar o sol e a lua no mesmo instante. Será ainda pelas palavras do seu amigo Volodia que nos apercebemos disso: «Memorial de Isla Negra é um retorno à poesia sensorial e diversa, um regresso que nunca será igual ao tempo a que se volta, porque o tempo não tem regresso. Caminha sempre numa única direcção, para o futuro, e apenas se pode regressar pela memória e pelo coração. E é o que Neruda acaba por fazer. Mas trata-se de uma recriação algo diferente. O homem que celebra os seus sessenta anos pode recordar o jovem de dezoito, mas não pode voltar a ser o mesmo jovem».

Aos sessenta e cinco anos, entrevistado definirá o seu estilo de vida que só o engrandece como homem quando já era grande como poeta. «Não se pode ser feliz se não se luta pela felicidade dos outros. Nunca se pode abandonar o remorso de ter alguma coisa se os outros a não têm. O homem não pode ser uma ilha feliz. Não é esta naturalmente toda a minha filosofia, mas é o mais importante dela».

Nas últimas páginas lidas sou surpreendido por uma notícia que não conhecia. Neruda conheceu Matilde nos finais da década de 40 e foi a sua companheira para os restantes 25 anos da sua vida. O Poeta gostava muito desta mulher e nunca deixou de a amar. Matilde retribui-lhe essa amizade apaixonada. Mas Neruda era um poeta e como todos os homens que brincam com as palavras como uma dança nupcial, apaixonava-se pela ternura das mulheres até que um dia já nos seus anos finais é surpreendido por Matilde em volta de uma mulher silenciosa que povoava a sua casa na Isla Negra. Esta mulher que o honrou até ao fim da vida, irritou-se e Neruda deixa o Chile como forma de quebrar essa corrente que o puxava para actos de arrebatamento apaixonado. O seu companheiro e amigo que agora lhe descreve a vida relata pormenores, agora que Matilde morreu e a sua memória já não pode ser manchada. Utiliza essa frase que tantas vezes repito de não misturarmos fidelidade e lealdade: «Como diz o seu amigo Garcia Marquez, não se deve confundir a fidelidade com a lealdade. Neruda foi sempre leal a Matilde, mas não lhe foi sempre fiel e regeu-se por esse princípio em todos os casamentos».

Perdoem-me esta longa missiva, mas tinha de partilhar com alguém este amor pela leitura, ainda para mais a que relata a vida de um poeta do século XX, Prémio Nobel da Literatura. Não esqueçamos que o Chile teve dois desses laureados e ambos eram poetas. O outro foi uma mulher que encontrou na sua adolescência e dava pelo nome de Gabriela Mistral. Termino com uma interrogação sem resposta. Como pode um país tão fantástico, tão pleno de uma natureza que impele os seres humanos a amar que nos enche a alma de sonhos que acariciam o desejo de viagens, pode ter visto nascer, viver e matar essa bestialidade de militares que assassinaram 30.000 dos seus compatriotas, entre torturas, corpos lançados ao Pacífico ou enterrados em valas comuns em locais desconhecidos?

Alcino Silva

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NUNCA A PALAVRA CAMPO

Auschwitz

Os Alemães nunca pensaram, ao fotografarem os prisioneiros dos campos com a competência técnica que os caracteriza, estar a convocar uma procissão de testemunhas alucinadas para uma espécie de juízo eterno dos seus crimes.

Ao percorrer os corredores de alguns blocos de Auschwitz com esses olhares que nos olham sem compreender o mal que lhes foi feito, esses rostos de todas as idades, alguns de extraordinária beleza, que as riscas do uniforme não conseguem reduzir a uma categoria, a um pormenor administrativo, temos o sentimento pungente de que a interrogação se dirige a nós e não aos seus carrascos.

Auschwitz é como o interior de uma pirâmide, construída alguns milénios antes de Cristo, decorada de hieróglifos incompreensíveis que fazem alusão a práticas de vida e de morte e a abomináveis sacrifícios, e para os quais nenhuma decifração parece possível.

Já todos vimos os filmes sobre os cadáveres da morte industrial e o estado a que ficaram reduzidos os sobreviventes.

Mas ficar numa sala detrás de uma vitrina que nos dá a ver uma montanha de sapatos, ou de colheres e pratos, de malas de viagem, de objectos pessoais que parecem ter sofrido com o destino dos donos, todos eles machucados e gastos, não "inteiros e bons" como a cigarreira do Pessoa, mas com as marcas do pesadelo, também eles, não se pode de olhar enxuto.

E, ao mesmo tempo, os turistas, numa corrente silenciosa, passam espreitando as enxergas, a sala dos interrogatórios, com o lugar do polícia sempre de costas para a janela e o holofote natural nos olhos dos presos, como se não houvesse mesmo a esperança de um abrigo, de uma sombra temporária, face ao olhar da morte. E vêem também a célula onde quatro homens tinham de passar um dia inteiro, sem se poderem sentar, uns encostados aos outros, como um animal de oito pernas dormindo em pé.

A tal ponto a ordem se torna nauseante que quando uma guia nos avisa, marcialmente, de que devemos tomar a esquerda ou a direita, para não "atrapalhar o trânsito", temos de reprimir um movimento de revolta.

António Mesquita

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O ESTRANHO MUNDO DE ALBERT EINSTEIN



http://paginas.terra.com.br/educacao/labertolo/

Cosmologia/Cosmology/space_and_time.htm



“Estava sentado numa cadeira no serviço de patentes de Berna (onde trabalhava) quando de repente me ocorreu uma ideia ‘Se uma pessoa cair livremente não sentirá o seu próprio peso’. Fiquei assombrado. Esse simples pensamento impressionou-me profundamente. Ele impeliu-me para uma teoria da gravitação” (Einstein)


Se Isaac Newton, mais de 200 anos antes, reconhecera que “se pude avistar mais longe, foi porque me apoiei nos ombros de gigantes” - como Copérnico, Brahe, Kepler ou Galileu -, Albert Einstein, um cidadão do mundo nascido na Alemanha em 1879, dotado de uma curiosidade tão extrema como a sua aversão à escola, andava, na sua adolescência, fascinado pela descrição dos trabalhos de Faraday sobre a electricidade e o magnetismo e pela recente teoria de Maxwell sobre as ondas electromagnéticas. O caso não era para menos, já que acabava de ser postulado “que a luz consistia em ondas ** feitas de electricidade e magnetismo que viajavam a velocidades alucinantes - cerca de 300.000 km por segundo”.

“Nos anos mais recentes, o jovem Einstein questionara-se sobre qual seria o verdadeiro aspecto de uma onda de electricidade e magnetismo. Uma maneira de saber, supunha, seria olhar para a onda de perfil (…) Por exemplo, se se afastasse de uma orquestra exactamente à velocidade do som (cerca de 300 metros por segundo), os seus ouvidos estariam a deslocar-se com a música (como um surfista na crista da onda); consequentemente, as próprias notas musicais estariam a deslocar-se paralelamente aos seus ouvidos e não para o seu interior. Ao olhar para trás conseguiria ver os músicos, mas não seria capaz de ouvir a música que tocavam. Aconteceria o mesmo com a luz? Se, por qualquer milagre, conseguisse afastar-se da orquestra à velocidade da luz, especulou, a conclusão inevitável parecia residir no facto de as ondas luminosas se deslocarem paralelamente aos seus olhos, e não na direcção dos seus olhos. Como tal, quando olhasse para os músicos, não os conseguiria ver, seria como se tivessem desaparecido! (…) Quem imaginaria (diria Einstein mais tarde) que esta lei simples (relativa à velocidade da luz) faria o físico consciencioso precipitar-se num tal abismo de dificuldades intelectuais?”.

“Para começar (…), Einstein mandou o conceito de espaço e tempo absolutos para a sucata”. (…) Ao afirmar o carácter absoluto, constante e inviolável da velocidade da luz, o jovem revolucionário podia daí deduzir as bizarras leis que governavam o novel universo. (…) Einstein estava portanto a substituir um conceito de absoluto por outro”.

“No universo de Einstein, o espaço e o tempo não eram uma arena estática como Newton admitia, mas dinâmica, inclinando-se e curvando-se de formas estranhas (…) Imagine uma bola de bowling que se afunda suavemente sobre um colchão. Se atirar um berlinde para a superfície deformada do colchão, ele percorrerá uma trajectória curva, orbitando em torno da bola de bowling. Um newtoniano, vendo de longe o berlinde a descrever círculos em torno da bola de bowling, poderia concluir que a bola de bowling exercia uma força misteriosa sobre o berlinde; (…) Para um relativista, que pode observar de perto o movimento do berlinde no colchão, é óbvio que não existe nenhuma força. Há apenas uma inclinação no colchão, que obriga o berlinde a mover-se numa linha curva. (…) Se substituirmos o berlinde pela Terra e a bola de bowling pelo Sol e o colchão pelo espaço-tempo, verificaremos que a Terra se move em volta do Sol não devido à atracção da gravidade, mas porque o Sol deforma o espaço em redor da Terra, criando um impulso que obriga a Terra a mover-se num círculo (…) a gravidade não atrai; o espaço (é que) empurra.”

“Em 1915, Einstein foi finalmente capaz de completar aquilo a que chamou teoria da relatividade geral, que desde então passou a ser a arquitectura sobre a qual assenta toda a cosmologia (…) a gravidade não era uma força independente que preenchesse o universo, mas o efeito aparente da curvatura da fábrica do espaço-tempo (…) a quantidade de curvatura de espaço-tempo era determinada pela quantidade de matéria e de energia que continha. Imagine que atira uma pedra para um lago, gerando uma série de ondas que se propagam. Quanto maior for a pedra, maior será a deformação da superfície do lago. De modo análogo, quanto maior for a estrela maior será a curvatura do espaço-tempo que a rodeia.”

No estranho mundo de Einstein, dominado pelo limite e a constância da velocidade da luz e em que matéria e energia, por um lado, e espaço e tempo, por outro, são faces das mesmas moedas, as grandezas a que estamos habituados na vida quotidiana não são sempre as mesmas. A velocidades próximas das da luz qualquer coisa material torna-se maior do que era (a sua massa aumenta), a distância encurta e o tempo corre mais devagar. Foi isso o que o seu brilhante pensamento abstracto e as suas belas equações predisseram e é isso o que sucessivas experiências vêm confirmando, como é o caso, por exemplo, do que sucede nos modernos aceleradores de partículas sub-atómicas, em que estas, lançadas em correria louca, aumentam de peso.

Curiosamente, o desenvolvimento do conhecimento deste mundo sub-atómico, ao qual Einstein dera um poderoso impulso com o seu revolucionário artigo de 1905 sobre a natureza corpuscular da luz, conduzi-lo-ia, tal como Newton fizera para justificar a inexplicada origem da força da gravidade, a invocar Deus em sua defesa para contestar “a interpretação probabilística da mecânica quântica”: “Deus não joga aos dados” ou “Deus não é malicioso”, dizia, levando a que Niels Bohr, um físico eminente da famosa escola de Copenhaga, defensor das novas teorias, com quem mantinha profundas discussões, retorquisse um dia: “Pare de dizer a Deus o que fazer”.

Mário Martins


* A Equação de Campo Gravitacional de Einstein. Esta equação estabelece que a curvatura do espaço-tempo de qualquer lugar no universo (lado esquerdo da equação) deve ser igual à distribuição de matéria e energia naquela parte do universo (lado direito da equação). ** Einstein demonstraria posteriormente que a luz não é uma onda mas sim uma partícula (sem massa), apesar de acreditar “que a próxima fase do desenvolvimento da física teórica nos trará uma teoria da luz que pode ser interpretada como uma espécie de fusão da teoria ondulatória e da teoria corpuscular (…). Citações de: “Cinco Equações Que Mudaram o Mundo”, de Michael Guillen, 1995, da Gradiva. “Mundos Paralelos”, de Michio Kaku, 2005, da Bizâncio. “Einstein 1905 O Padrão da Grandeza”, de John S. Rigden, 2005, Edições 70.

O FIO DE OURO

Santa Rita de Cássia


Maria Ana e Paulo Jorge separaram-se ao fim de 10 anos de casados, aparentemente sem dramas, e vá-se lá saber porquê. Sem filhos, inteligência e formação intelectual acima da média, ambos professores no secundário e militantes no Partido Comunista. Como aliás todo o resto da família.

Maria Ana vinha de uma família abastada e acabava de receber mais uma herança que aumentaria ainda mais a fortuna que um dia teria como herdeiros apenas sobrinhos e primos de vários graus.

Foi pouco depois da separação que os sintomas da doença começaram a manifestar-se: rigidez matinal dos membros, inchaço e inflamação das articulações, dificuldade nos movimentos. O diagnóstico não tardou a confirmar-se: artrite reumatóide, doença degenerativa de origem desconhecida, incurável, progressivamente incapacitante, até à cadeira de rodas e à perda de toda a esperança.

Trinta anos depois, o seu corpo tinha-se reduzido a metade e via-se uma parte dos dedos das mãos enclavinhados pela carne dentro e a outra parte revirados para fora numa cruel e dolorosa deformação. Os outros órgãos vitais também foram sendo afectados até que a própria voz se tornou quase inaudível.

Apenas alguns parentes a iam visitar à sua casa enorme onde vivia sozinha entregue aos cuidados de uma enfermeira especializada a quem pagava os preciosos serviços sem qualquer constrangimento financeiro. Maria Ana começou a morrer e o dia a dia tornou-se-lhe insuportável.

Uma vez, fez um esforço ainda maior para se fazer ouvir e com uma réstia de sorriso contou à prima que a visitava mais regularmente, que se lembrava da mãe lhe "pôr a mão na cara" quando era pequena. Na aproximação da morte, um desolado pudor a impedia de exprimir claramente a terna lembrança das carícias maternas. "Marianinha" – perguntou-lhe a prima encostando a boca ao seu ouvido – "queres que eu te ponha a mão na cara?" Maria Ana disse que sim com o mesmo sorriso tímido acenando com a cabeça.

Depois fez menção de querer dizer algo mais e dirigiu à prima uma inesperada e sofrida pergunta: "Sabes rezar o Pai Nosso?" A prima não sabia e, reprimindo qualquer sinal de surpresa, respondeu: "Marianinha, sabes que não sou crente. E tu também não és..." (como quem diz: "o que é que te deu?").

Foi então que Maria Ana formulou uma pergunta ainda mais estranha: "Achas que eu devia oferecer um fio de ouro à Santa Rita?". Desta vez a prima sobressaltou-se: "O quê, Marianinha? Um fio de ouro? Sabes bem que ia logo direitinho para o padre. Olha, se queres dar alguma coisa dá uma vela que faz o mesmo efeito. Mas agora um fio de ouro, nem pensar. Não vais fazer essa asneira".

"Mas tu não achas…" – insistia Maria Ana com teimosia triste, sem conseguir dizer à prima que talvez uma oferenda maior lhe aliviasse aquele tormento e que talvez a Santa Rita… E depois, pensava com angústia, para que precisava ela de um fio de ouro, na hora de morrer? O que era um fio de ouro no meio de tanto dinheiro inútil no banco que agora, mais do que nunca, não lhe serviria para nada?

"Não, nem penses. Ia logo para a padralhada." – respondeu a prima, certa de lhe ter dado a volta e satisfeita por ter trocado o destino daquele fio de ouro.

Dina La-Salette


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OS BONS, OS MAUS E OS VILÕES


Liberdade já existe. Será? Temos eleições, liberdade de expressão e acção, mas, em contra-partida o direito ao trabalho é cada vez mais desprezado face a novos “valores” emergentes para o progresso, tais como : a deslocalização das empresas, a mobilidade dos trabalhadores, a redução e a perda de conquistas tão caras ao estado providência e que constituíram um património sócio-cultural que nos diferenciava dos “pagãos” e foi suporte da propalada superioridade ocidental.

É óbvio que nem tudo se perdeu e é verdade que a sociedade está em constante mutação. Mas, se não nos cuidarmos, não faltará quem queira – com os melhores propósitos – destruir esse património e acabar de vez com esses “luxos” de que (ainda) gozam os trabalhadores. O código laboral há-de ser cada vez mais o código patronal, a saúde mais cara, a justiça mais inacessível ao cidadão comum, a segurança social, descapitalizada, será substituída pela excelência dos seguros privados, a educação será posicionada para os mais privilegiados, a protecção às crianças mais desfavorecidas e o apoio à terceira idade – um dos problemas mais sérios das sociedades ditas avançadas – cada vez mais incompatíveis com o hedonismo, a fúria do sucesso, o reforço das classes dominantes, a força do dinheiro e a indomável atracção pelo poder. E estas situações, e esta política e esta tendência neo-conservadora limitam a liberdade. Obviamente que este tipo de desabafo é comum, não é perigoso, não faz opinião e não terá eco. Os insatisfeitos “ladram”, mas a caravana passa e os que vão nela cada vez viajam melhor, mais confortados e com mais mordomias.

É um lugar comum dizer-se que há liberdade a mais e responsabilidade a menos. Estou um pouco saturado desses lugares comuns, mas que são óptimos para não dizer nada e potenciar o comodismo e a inércia. É óptima a sua utilização, porque há um grande consenso à sua volta. A responsabilidade não toca a todos por igual : é um erro juntar o governo e a oposição nas críticas à condução do país quando é aquele que governa, e nas empresas os mandantes aos mandados ou entre patrões e servos. Dá jeito dizer mal dos media e perverter o segredo de justiça segundo a agenda do ministério público. Sossega-nos pensar que os hospitais funcionam mal em função de serem públicos e tomar a classe médica como alheia ao seu funcionamento. Confiamos que justiça é cega e que a sua utilização é excessivamente burocrática, cara e morosa e que isso nada tem a ver com o poder dos juízes e o interesse dos advogados. Se devemos preocupar-nos com as escutas à toa, com a desgovernação do país, com as reformas de luxo, com o aumento das rendas e os custos da saúde, a sorte dos infelizes e o sossego dos instalados, temos o direito à denuncia, mas com jeitinho e sem dor. Com liberdade, mas responsabilidade. Não vale se não for assim.

Continuamos a viver numa sociedade profundamente hierarquizada e elitista. As responsabilidades não se podem atribuir a todos por igual. É para mim um erro tremendo tratar os erros e os desvarios com discursos generalistas e bem intencionados – do tipo Jorge Sampaio – mas que não resolvem, não incomodam e deixam tudo como dantes e todos na paz do senhor, salvo os culpados do costume.

Em Portugal há um deficit de talento e um excessivo desperdício na gestão de “improdutividades”. As nossas elites (os bons) são preferencialmente burocratas que viraram vedetas e julgam que basta a criação de uma qualquer Carta Magna da Competitividade e a consolidação orçamental para ficarmos preparados para surfar na crista da onda. Não basta !

E como não basta, há que regressar à ladainha da ordem e quem paga é sempre o elo mais fraco. Os desempregados e a maioria dos trabalhadores (públicos e privados) são tratados como se fossem autênticos “vilões” se ousam defender os seus direitos e reclamar ser tratados de forma justa. Os sindicatos, que lhes dão cobertura, são os maus da fita. Não trabalham, desestabilizam, furam o pacto social e incomodam muita gente. Em função de tanta “maldade”, a liderança tende a tornar-se cada vez mais autoritária. Há em muitas empresas um regresso ao passado com estúpidas restrições aos direitos formais (e informais) no exercício da actividade profissional, só que agora se exercem não a coberto de um governo autoritário, mas em nome da sacrossanta competitividade. E assim vai Portugal. Uns vão (muito) bem, outros (bastante) mal.


Mário Faria

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RELATÓRIO FABRIL DE 1915

Lyonel Feininger - The factory (1950)



Ao Governador Civil do Porto

Relatório


A cerca da Fábrica de louça de Ferro esmaltado de John Minchin Júnior.

Tendo efectuado uma visita á Fábrica de louça de ferro esmaltado de John Minchin Júnior, na Rua do Freixo, desta cidade, averiguei o seguinte:

Existem: A oficina de funileiros havendo

na 1ª secção o corte de chapas de aço;
Na 2ª secção a oficina de soldadura e montagem;
Na 3ª secção a oficina de levantamento das peças ao torno ou ao martelo.

Em seguida temos uma dependência para a esmaltagem .

Nestas oficinas não se empregam materiais tóxicos , e as oficinas encontram-se regularmente ventiladas e higiénicas.

Somente na oficina de estanhagem como se emprega a solução de 10% de ácido clorídrico para a limpeza das peças e como ás vezes se faz 2ª estanhagem e as, peças ainda quentes entram naquela solução, há desenvolvimento de ácido clorídrico que tornam um pouco insalubre aquela dependência.

Segue-se a oficina propriamente da esmaltagem.

Nesta oficina os esmaltes são aplicados em massa, não havendo poeiras.

Numa dependência onde se prepara o esmalte onde se misturam as diversas substancias em que não entram substancias consideradas tóxicas.

Estas são levadas depois ao forno a 1200 graus saindo depois em uma massa vítrea que depois de pulverizada é tornada na massa a aplicar ás peças a esmaltar.

A dependência da oficina em que se limpam peças por meio do acido clorídrico a 10% não tem desenvolvimento de ácido com a oficina de esmaltagem pois as peças entram aí a frio e o operário se aí mete as mãos é porque quer.

Na oficina de esmaltagem existem também os fornos que montados como estão não dão origem a desenvolvimento de matérias tóxicas .

Há outras oficinas, como a de preparação de algumas matérias para os esmaltes, como o quartzo, feldspato etc. que agora se preparam, e confecção de tijolo, que não é insalubre, atento o modo de instalação, e a oficina de fundição.

Na secção de esmaltagem de puchadores de ferro, os esmaltes são preparados com matérias tóxicas, e nos retoques das imperfeições também são empregadas substâncias tóxicas.

Os operários que manipulam estes objectos usam umas máscaras que preservam a boca e o nariz e que filtram através de si o ar respirado por aqueles operários.

Como nesta oficina se empregam substancias tóxicas e na estanhagem há também desenvolvimento do ácido clorídrico, entendo que estas oficinas estão incluídas no nº 3 do artigo 4º da lei nº 296 e por isso para isentar as outras devem estas ficar isoladas das outras ventilando-as convenientemente.

Porto , e 1ª Circunscrição Industrial 17 de Dezembro de 1915

O Engenheiro Chefe

Assinatura ilegível


( Respeitamos a grafia da época)


Este relatório poderia enquadrar-se nas Novas Comissões Higiene e Segurança. Tem outro mérito histórico dá-nos ao pormenor como é que se organizava uma fábrica de Esmaltagem, uma das mais famosas da época.

Júlio Soares


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