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01/09/19

NO CORRER DOS DIAS

Marques da Silva

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Há aspectos da vida de algumas pessoas que nunca conheceremos na sua totalidade, apenas na proporcionalidade do que é visível e nos faz recriar paisagens para o que desconhecemos, para o que é omisso nos seus relatos, mas perceptível nas expressões e comportamentos. Talvez nem o próprio saiba dizer de onde advinha o seu gosto, mesmo encanto e atracção, pelas falésias, com as suas pedras, numa mistura de cinzento e castanho, a derramarem-se sobre o mar, pelos faróis e as ilhas, lugares que em comum, tinham o isolamento, a grandeza, uma fusão de infinito e eternidade. Contudo, a vida foi passando, os sonhos voaram para espaços distantes e a viagem aos lugares de atraimento, ficaram no pretérito da sua existência. Nos dias que correm, talvez seja já uma sombra de si próprio que todas as manhãs se acolhe numa mesa escondida de um Café de bairro. Fica longas horas escrevendo, ao que se crê, cartas de amor para uma mulher que nunca existiu, as quais direcciona para um destino desconhecido. Escreve e reflecte e todas as missivas que redige começam invariavelmente por, «Meu estimado e profundo amor, amada minha». De seguida parece abordar o tempo meteorológico, pois do espacial, a sua vida já não tem nada. «Nesta manhã de excelsa claridade, pequenos núcleos de nuvens brancas, brincam, divertindo-se sobre um céu azul puríssimo, fazendo-me descer na escala do tempo até aos instantes em que a intensidade do teu olhar, bailava ao som de cânticos longínquos, com as minhas utopias, os meus anseios»Em certos momentos, a sua reflexão deixa-o demasiado tempo parado, com o olhar fixo na pequena janela de onde lhe chega a visão do mar. Ocorrem-lhe à memória, dias remotos. Lembra-se da Judite. A Dite, a filha do senhor Belmiro, que na beleza dos seus vinte anos era a menina bonita do bairro que com o seu sorriso aberto, cheio de luz, encantava os homens e os adolescentes. Quantos pretendentes, quantos galanteios recebeu! Mas o tempo passou. Os homens a quem encantou, morreram todos e os adolescentes que a amaram, vão terminando, como ela, o seu tempo de vida. De tanto ser amada, acabou sozinha, na velha casa do bairro que a viu crescer. Tentava que o seu pensamento regressasse ao presente, mas não parecia uma tarefa fácil. Numa noite, de tempestade temerosa, deixou à solta as suas quimeras. Viu-se atravessar o Estreito de Magalhães dessa mulher que terá amado e para quem escrevia, e ao sair ao encontro do Pacífico, pareceu-lhe que a infinitude se abria no seu horizonte. Mas eram apenas delírios. De novo voltava à carta e as suas palavras pareciam adquirir mais fulgor numa escrita que parecia contrariar o começo, «No exterior, o sol apaga-se em triste cinza, ou reacende-se em cálida luz. O olhar viaja entre a ameaça de chuva, ou aquecimento súbito como uma estrada sulcando as colinas, como a minha alma, já sem chama nem ardor, no lume apagado de um tempo vibrante, recordando apenas, a revolução por onde passou quando as bandeiras ululantes do teu olhar acenderam fogueiras na planície sem luz onde habitava. Hoje, só o vento uiva no chão onde brotou uma alegria triunfante». Gostava de se sentir, como numa estória ouvida, como o cego que caminhando na noite, levava uma candeia acesa. «Para iluminar o caminho àqueles que vêem», respondia quando questionado. Mas na sua vida, já só a obscuridade, que o isola do mundo, persiste. Não podia alumiar, como antes, o caminho aos outros caminhantes o que se torna visível no terminar das suas cartas, «O tempo, o meu, chegou ao fim. Só em fantasias ilusórias sinto o teu olhar, límpido e apelativo, passeando na minha direcção, mas a estrada divide-se antes de chegar ao espaço onde habito. Despeço-me. Envio-te o abraço que um dia fez-me sentir o teu corpo no meu, e um beijo longo e cativo, de uma esperança que naufragou nas praias de uma ilha sem nome». Aparecia-lhe ainda a dança do universo galáctico, com a Lua volteando sobre si própria ao mesmo tempo que roda em torno da Terra e o planeta onde habitamos, prosseguindo a mesma dança com o luminoso Sol, num expoente de beleza que se acreditava ter vivido com a destinatária das cartas que escrevia. A redacção chegava então ao fim. Já no declinar do dia, encerrava as folhas de papel num envelope, saía para o exterior e deixava-o no primeiro marco do correio que encontrasse, no interior de uma rajada de vento que por si passasse.

O jornalista, Julien Brygo em artigo no Le Monde Diplomatique-edição portuguesa leva-nos até ao uso da internet no Norte de França, com estes esclarecedores depoimentos: “David Lecompte dirigiu-se directamente às Finanças de Lambersart. Mais do mesmo.” «Claro que me disseram que tinha que ser feito pela Internet. Perguntei-lhes onde estava a máquina à disposição do público… E não há nenhuma. Não faz nenhum sentido. Obrigam-me a fazer a minha declaração pela Internet, mas na condição de eu comprar um computador, de o trocar ao fim de dois anos porque se tornou obsoleto, de fazer um contrato com um fornecedor de acesso privado e que, para além de tudo isto, dê uma quantidade enorme de informações sobre a minha vida privada? Não. Não, obrigado» ” e ainda, “Acreditaríamos estar num filme de Ken Loach "Eu, Daniel Blake" (2016). O procedimento é-lhe explicado por um dos dez «jovenzinhos de azul», como lhes chamam os agentes. Toda a manhã (o único horário de abertura do dia), eles repetem as mesmas frases: «Tem as suas identificações? Vá para o seu espaço. Vá para “Os meus contactos com o Centro de Emprego”, clique em “Enviar e seguir um documento por correio electrónico”; depois clique em “Digitalizar”, “Acrescentar uma página”, “Validar”, “Confirmar”, “Enviar um outro documento”, “Confirmar”, “Validar”. Repita este procedimento tantas vezes quantos os papéis que tem para enviar.»”. O autor, diz-nos também que, “Em França, mais de treze milhões de pessoas estão «pouco à vontade» com a Internet, ou seja, 23% da população com mais de 18 anos. As pessoas idosas representam 66% das que estão mais afastadas do digital; 55% das que têm mais de 70 anos não têm acesso à Internet nas suas casas.

Zita Seabra, no fim da década de 80, considerou que tinha estado equivocada politicamente nos 30 anos anteriores e mudou-se…, para o PSD. Há dias, a mesma Zita Seabra, descobre que viveu outros trinta anos equivocada e mudou-se para a Iniciativa Liberal! Quer dizer, é uma vida permanente de equívocos! E pensar que há trinta anos atrás queria arrastar consigo uma organização política com décadas de história!

Antes de Rui Rio assumir a liderança do PSD, um conjunto de deputados desta formação política, destacava-se na Assembleia da República, pelos seus discursos, inflamados, violentos e insultuosos, uma espécie de MRPP da Direita, mas na versão malcriada. Há dias, um desses deputados, Duarte Marques de sua graça, chamou «besta» ao primeiro-ministro! À falta de argumentos políticos e incapazes de falar da verdade que os move e dos interesses que de facto representam, recorrem ao insulto desbocado! É a Direita no seu melhor. A Geringonça deixou a Direita em estado de sítio.

A greve dos motoristas de matérias perigosas, levou-me à leitura de um artigo do jornalista Daniel Oliveira de há meses atrás, no qual falava num sindicalismo solidário e colectivo. Quando grupos profissionais, se isolam dos seus companheiros do mesmo Sector ou Ramo de actividade para, servindo-se da condição específica da sua profissão, procurarem obter situações de privilégio, mesmo quando justas as suas reivindicações, significa que pouco lhes interessa a situação desses companheiros de trabalho, como é o caso dos motoristas de matérias perigosas (que consideram que ninguém sabe como é a sua profissão, como se eles soubessem como é a profissão dos outros), dos enfermeiros, dos médicos, dos pilotos da aviação ou dos maquinistas da CP. Por outro lado, o sindicalismo não pode abrandar o questionamento constante sobre a realidade que o cerca, sob pena de ver a Direita, servindo-se de justas reivindicações dos trabalhadores, infiltrar-se através de um sindicalismo mais que suspeito, exibir uma acção política de contrapoder, ao mesmo tempo que com a sua acção radical, contribui para o cercear de direitos laborais.

Segundo os jornais, o corpo de operações especiais da PSP colocou o Estado em tribunal por não lhe pagar o subsídio de risco quando se encontram em teatros de operações. Se percebi bem, os homens e mulheres (agora tem de se escrever assim!) que se alistam neste corpo policial específico, entendem que a remuneração que recebem é para não fazerem nada e que quando têm de realizar as acções para as quais foram contratados, «operações especiais» querem um acréscimo salarial a que chamam subsídio de risco! Como me disse um amigo, um destes dias vão reclamar um seguro de vida!


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