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01/08/12

QUANDO SE NAVEGA SEM DESTINO...

Mário Faria

yachtyakka.co.nz



Fiquei muito chocado por ter ouvido um professor universitário desta cidade, integrado num painel que discutia o comportamento do governo durante o primeiro ano do seu exercício, a dizer que  “… se os salários e pensões representam cerca de 77% da despesa pública, então reduzir a despesa tem de passar obrigatoriamente pelo corte, designadamente dos subsídios de Férias e de Natal dos funcionários públicos e dos pensionistas…. Não fiquei nada surpreendido com a defesa da norma, fiquei, sim, muito chocado pela forma : um  discurso duro, categórico cheio de prazer pela ausência de complacência. Uma espécie de Dexter, feito serial killer da palavra, para se vingar dos crimes que os improdutivos e os inactivos representam para o sistema.

Apesar do tribunal constitucional ter chumbado a lei, vamos ter em 2013 mais impostos, desemprego e recessão. Desde 2002 que vivemos sob o jugo do pacto de estabilidade. Já na altura o tema foi objecto de intensa discussão. Hoje, poderemos perceber melhor, a justeza de algumas intervenções que defendiam que há vida para além da austeridade.

1) “…A Europa vive sobressaltada pelo fantasma do Pacto de Estabilidade, qual camisa de forças que neutraliza todo e qualquer esforço de revitalização económica....Será um erro centrar os esforços de uma governação no equilíbrio das contas públicas enquanto a economia definha a olhos vistos, as empresas despedem e reduzem custos até ao limite e as pessoas contam os tostões....” (Eduardo Silva Melo, Diário Económico, Julho de 2002)

2) ”…Os mercados não funcionam tão perfeitamente como afirmam os modelos simplistas baseados nos postulados da concorrência perfeita…. hoje a mundialização não funciona.  Não funciona para os pobres do mundo. Não funciona para o meio ambiente. Não funciona para a estabilidade da economia mundial…”  (Joseph E.Stiglitz , Prémio Novel da Economia,  Público,  Abril de 2002).

3) ” ....As dívidas ao fisco representam em Portugal 10 por cento do PIB. Curioso número, tendo em conta que o défice orçamental de 2001, na sua leitura mais desvantajosa, anda pelos 4 por cento. Quer isto dizer que não seria necessário que tantos apertassem o cinto. Bastaria que alguns pagassem o que devem.....” (Paulo Guerra, O Diário Económico,  Julho de 2002)

4) “… O pacto de estabilidade é um instrumento de governação económico grosseiro e deverá ser substituído, no momento oportuno, por qualquer coisa de mais inteligente. ….”  (Pascal Lamy ,Comissário Europeu para o Comércio, Público, Outubro  2002)

5) “...Esta derrapagem espectacular das finanças públicas não constitui por isso um erro de política económica, pois ela está paradoxalmente justificada pela gravidade da situação económica mundial ocultada por hipóteses de crescimento irrealistas, pois uma política orçamental de regresso ao equilíbrio, pelos seus efeitos deflacionistas, seria totalmente contraprodutiva, incluindo no plano das finanças públicas, porque destruirá mais receitas fiscais do que reduzirá as despesas ….”  (N.Baverez, economista, Público, Outubro  2002)

6) …Sem rodeios, a verdade nua e crua é só uma : o Governo não tem ao seu dispor instrumentos eficazes, aquelas armas clássicas da política económica para reverter uma situação recessiva. Estamos absolutamente à mercê da conjuntura internacional, quando a crise internacional parece ser mais sistémica e menos conjuntural.....  ”, (Sérgio Figueiredo, Público, Agosto de 2002)

A dívida pública atingiu 111,71% do PIB. Não há receitas milagrosas. E há saída para a crise? Valente Leite, economista e ex-deputado do PS, defende que:

Só há uma solução para a crise: a reestruturação da dívida;

A introdução do escudo (com o euro) daria ao Governo um instrumento para poder ter défices;

Seria criada uma nova aplicação para as poupanças dos portugueses, que lhes garanta a remuneração em euros e uma actualização do valor poupado;

A moeda usada a nível interno seria o Escudo, não convertível externamente, e em que um escudo seria igual a um euro, só para transacções internas.

Uma Europa a duas velocidades, um país com duas moedas. Que mais nos acontecerá? Estamos reféns da Europa que continua a navegar sem destino e, quando assim acontece, nenhum vento é favorável.

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