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01/11/22

VIAGEM AO ANTROPOCENTRO

António Mesquita




"Desce à cratera do Yocul de Sneffels que a sombra do Scartaris vem beijar antes das calendas de Julho, ó viajante audaz, e tu chegarás ao centro da Terra. Eu o fiz."

Arne Saknussemm.



É, bem avançados no romance de Júlio Verne, "Viagem ao Centro da Terra", que a cifra do manuscrito dum alquimista islandês do século XVI, Arne Saknussemm, é desvendada. Como se o feito em si de chegar ao âmago do planeta devesse ser escondido a sete chaves do resto da humanidade. Porquê? O professor Lidenbrock e o seu sobrinho Axel, o narrador, acompanhados de Hans  um guia local, munidos das suas lâmpadas Ruhmkorff, afinal descobriram um outro mundo de luz, com um mar interior, atmosfera, e animais exóticos a alguns quilómetros de profundidade...

Sabemos que  os três exploradores não atingiram o fim da viagem porque uma explosão por eles provocada os expeliu pela cratera do Stromboli, o vulcão da Sicília, a 5 mil quilómetros de distância do ponto de entrada da sua expedição.

O filme "Il Buco" (entre nós, "Das Profundezas") de Michelangelo Frammartino (prémio do 78o. Festival de Veneza) aparentemente não foi inspirado por Júlio Verne, mas pela façanha de  Giulio Gècchele de 1961. Um grupo de jovens espeleólogos piemonteses dirigiram-se para o sul, na Calábria, para explorar o fundo do Abismo do Bifurto, a 682 metros abaixo da terra, a mais profunda gruta de Itália. 

A paisagem montanhosa é um cenário de majestade com um velho pastor que fala a linguagem do seu burro. Como na reportagem da escalada da Torre Pirelli, em Milão, que aparece ao princípio, os milionários que sobem, vendo os habitantes da torre como pássaros nas suas gaiolas, têm a sua o onomatopeia.

Há assim três linhas narrativas que se entrelaçam com o fundo quase documental da descida ao Bifurto. O da reportagem milanesa sob o signo da curiosidade  inútil, o do velho pastor e testemunha (António Lanza) que cai a meio do filme para não mais se levantar ( a sua morte coincide com o momento em que o fundo do despenhadeiro é atingido, com o gesto do explorador "trancando" o empreendimento) e, claro a proeza de espeleologia que não tem rostos, nem palavras, apenas as magníficas imagens de Roberto Berta, veterano de Godard e Resnais.

As páginas incendiadas da revista Epoca com as fotos de Kennedy ou Sofia Loren parecem-se um pouco com a auscultação do médico no casebre do pastor. A sala de cinema, com as suas luzes de presença, nas cenas em que a acção ocupa uma luzinha no canto do écrã, é, de resto, o anticlímax, ou a distância brechtiana que impedem a ilusão dramática.

Culminando o fim da "descoberta" o cartógrafo do grupo desenha a figura da gruta  até ao fundo, pronta para um novo esquecimento de arquivo. Frammartino fala numa espécie de colonização.

A estas histórias paralelas, poderíamos acrescentar, sem que esteja no filme, mas sim, porventura, na memória dum espectador da minha geração, a aventura islandeza de Júlio Verne. Aventura falhada, tecnicamente, se assim podemos dizer, mas que alimenta o fogo sagrado da imaginação.

Vasco Baptista Marques, na sua crítica no Expresso diz que o objectivo do filme "reside na configuração de um universo não antropocêntrico, onde - sem perder a sua dignidade - o Homem se descobre reduzido às suas reais proporções (daí que a realização faça questão de colocar a palavra ao nível dos demais ruídos do mundo)".

Não antropocêntrico é o que não nos é possível conceber. É a quarta narrativa paralela. Assim seja, para glória de Frammartino.






VLADIMIR, O PEQUENO


Talvez os ucranianos, apesar de todas as declarações de fraternidade, não tenham podido esquecer o Holodomor e as suas réplicas. Talvez não queiram ser "espanhóis", como  nós não queremos - e os Filipes não foram assim tão maus. Vamos negar-lhes esse direito porque há  "nazis" no meio deles, porque a CIA manobrou estes anos todos, ou porque a NATO bombardeou Belgrado? Nem os piores crimes que se possam atribuir à NATO justificam a guerra que lhes moveu Putin. Sejamos justos: esse homem não tem perdão. Não é Pedro o Grande quem quer.

2 comentários:

Cantinho do Jonas disse...

LET'S TALK ABOUT THE HOLODOMOR... Aconselho vivamente a leitura do livro de Douglas Tottle - Fraud, Famine and Fascism, onde esta temática é devidamente analisada e documentada. Tenho o livro em PDF, versão inglês, mas por este meio não posso enviar, se alguém estiver interessado é só dar um toque pelo meu mail...
João Augusto

Cantinho do Jonas disse...

O mal que uso é o que aparece aí... Só que o servidor é hotmail.com

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