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30/11/07

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A EDUCAÇÃO SEXUAL

Dina La-Salette

Um postal vitoriano



Há duas formas de tratar a sexualidade. A primeira é a forma moral ou religiosa: a sexualidade é um pecado, é má e é suja. A segunda é a forma realista. A educação sexual na escola é uma história infeliz; os pais não deveriam nunca aceitar que se apresente aos seus filhos, em forma de lição, o lado emocional da sexualidade, nem tão pouco em forma de aulas onde se fale em termos técnicos do êxtase que o acto sexual proporciona.

Os adolescentes não deveriam aprender demasiadas coisas no que diz respeito à técnica do acto sexual pois o interesse e o atractivo do amor é precisamente a descoberta, por eles próprios, dessas mesmas técnicas.

Em matéria de psicologia, a regra é que a escola transmita apenas as coisas mais elementares. Se a sexualidade for ensinada da mesma maneira, básica e ligeiramente, será preferível a escola abster-se de tal empreendimento.

Do ponto de vista da segurança, tudo o que uma jovem precisa de saber é que fazer amor sem o emprego de um anti-concepcional bem escolhido pode naturalmente resultar numa gravidez; por outro lado, raparigas e rapazes deveriam ser informados que as doenças sexualmente transmissíveis, nomeadamente a sida, existem e que são perigosas ao ponto de poderem pôs as suas vidas em risco.

A maior parte das crianças obtém as suas informações sobre a sexualidade junto dos seus camaradas de escola ou de jogo; e estas informações são geralmente erradas e eivadas de pornografia e de sadismo. O resultado é que muitas “primeiras vezes” ou mesmo “luas de mel” se assemelham a violações e que muitas mulheres casadas (ainda) passam a ter horror das relações sexuais depois dessa primeira experiência.

Numa sociedade saudável a questão deveria ser tratada livremente, em família, antes do período da adolescência das crianças.



HAPPY END

Mário Faria



Futuro, Inovação, Tecnologia, Competitividade, Mobilidade, Mercado ... Passado, Saudades, Guerra Colonial, 25 de Abril, Democracia, Desenvolvimento …. É fácil falar do passado : temos memória. É mais difícil falar do futuro, a memória não dá muito jeito (confunde-se com saudosismo) : ficam as expectativas e cada qual serve-se do que lhe dá mais gozo. Toda uma série de desejos, aspirações, teorias e conspirações estão preparadas para servir à la carte, segundo a tendência de cada um.

Quando tive responsabilidades profissionais não fui muito bem sucedido, quando resolvi interpretar o futuro e fazer propostas que me pareciam com futuro. Na empresa, convencido das minhas competências, resolvi montar um plano para a minha área de actividade, com um conjunto de alterações funcionais e distribuição de tarefas. Reduzi a escrito o plano e justifiquei a proposta. Fui chamado à Administração e tinha acabado de entrar, quando o patrão (uma espécie de deus lá do sítio) me questionou : “Olha lá, pensas que isto é alguma cooperativa ? Olha que não é ! A tua área está devidamente estruturada e essa é um competência que não declinámos. Percebeste ? O que propuseste é um conjunto de equívocos que favorecem o by-pass e a desresponsabilização dos prestadores dos serviços. Agradecemos que o teu empenhamento se vire por inteiro para o cumprimento das tarefas como estão previstas no organigrama e respectivo manual. Deixa a César o que é de César”. Foi, assim que se passou. Levei na cabeça e emendei-me. De uma forma de outra, era certo que se houvesse falhas quem se tramava era cá o “Egas”.

Mas, como ainda tinha algum convencimento que podia fazer algo com a minha chancela de qualidade, certa vez tomei a ousadia de aconselhar um Cliente, com uma sugestão cheia de futuro. “É assim, Sr. Doutor (lá no sítio, este, estava acima de deus) : entendemos que tem sido dada demasiada a importância às iniciativas promocionais e se tem privilegiado uma comunicação excessivamente “hard selling”, quando se deveria dar um pouco mais de relevo à notoriedade da marca. O futuro passa por aí. Mais instituição e menos preço, é o que aconselhamos, no curto e médio prazo” O Sr. Doutor olhou para mim como se fosse um réptil e respondeu-me ; “a encomenda que lhe fiz e o trabalho que tem a prestar tem de ser conforme o briefing que passei. De resto, cumpra com competência o que lhe foi pedido, deixe-se de tergiversações que não têm pés nem cabeça. Ninguém sabe melhor do que eu o que é melhor para mim e para a minha Empresa. Aconselho-o a não repetir o abuso, sob pena de ter de dispensar os vossos serviços.” Depois desta cena, passei a ser muito cauteloso. Agarrei-me de unhas e dentes à rotina e a manter um estilo, prudentemente, low profile, porque de boas intenções e de promessas de um futuro melhor, está o inferno cheio.

A pensar num futuro com futuro, a Empresa em que trabalhava foi tomada por uma multinacional que por sua vez se fusionou com outra multinacional, formando uma nova empresa cheia de músculo. O centro de decisão para a península ibérica ficou sediado em Madrid, e a estrutura do Porto, totalmente dependente de Lisboa. O emagrecimento foi tal, que a porta continua aberta (no Porto) apenas para cumprir rotinas administrativas. “Fechar” nunca é um bom sinal para o mercado. Dizem os homens de Londres, Madrid e Lisboa, que este projecto tem futuro. E os que saíram, compulsivamente, acharão o mesmo ? Só podem ! Futuro oblige !

Não sei se no futuro estas coisas vão deixar de acontecer e se vamos ser mais solidários ?. ou se vamos, simplesmente, ser mais argutos na manipulação das novas tecnologias ? É bem provável que seja possível, num futuro próximo, a colocação de um chip nos humanóides, que permita monitorizar a actividade que exercem com eficácia, sem erros, emoção, traumas ou queixumes. Deixaremos, assim, de ter grandes pesos de consciência. A solidariedade e a afectividade serão para usar de forma muita restrita e contida. Um homem não chora : cumpre. Não haverá amor (apenas reprodução), viveremos sem auxílio (pois seremos auto-suficientes) e morreremos sozinhos (porque perdemos a serventia).

Provavelmente é esta a utopia que podemos esperar. Se for assim, não tenho saudades. Mas, pode ser que não seja assim e que o homem novo – qual D. Sebastião da nossa esperança – nasça, revelando preocupações sociais e ambientais suficientemente marcantes, para revolucionar as relações sociais e criar uma nova ordem, necessariamente mais justa.

Na dúvida, o melhor é viver o presente e tirar o máximo partido das coisas boas. Para mim, actualmente, é saborear todos os momentos que estou com o(s) meu(s) neto(s). É um pouco “piegas”, mas um happy end com alguma emoção, sempre dá um empurrãozinho à felicidade, nem que seja por uns breves momentos.


O PALÁCIO DO RISO

António Mesquita

A Feira Popular
http://fotos.sapo.pt/miro/pic/0020s5xc


Entrou nos nossos hábitos, como coisa normal, saudável e democrática, um programa como o "Contra-Informação", em que a caricatura está na ordem do dia e a política é especialmente o "bombo da festa".

É tão democrática esta espécie de crítica do poder (que esconde o seu próprio poder de manipulação) e os códigos de leitura são tão hegemónicos, que mesmo os mais mal tratados por ela, se são verdadeiros democratas, se sentem na obrigação de se considerarem os primeiros fãs do programa. Parece que era assim que fazia a antiga Dama de Ferro, em relação a uma conhecida série da BBC.

O "Contra-Informação" não se compreende sem o culto da chamada transparência que é, para os políticos, a arte de apresentar, sob uma embalagem popular, o que é tortuoso, fruto da intriga e da negociação, mas que para a comunicação social é uma apetecida ocasião de retirar o capachinho a todo o bom samaritano dos Passos Perdidos e mostrar uma luzidia careca.

Por força deste convívio, ao mesmo tempo forçado e desejado, com a televisão, a política, em boa parte, tornou-se ( e já é uma banalidade dizê-lo) um espectáculo.

Nada demonstra melhor esse facto do que um programa como este, cuja função não é, evidentemente, a mesma de um artigo de opinião, mas a de apresentar a política sob os seus aspectos mais risíveis. Porque o que se pretende acima de tudo é fazer rir.

Isto é como se um Eça, anormalmente medíocre e com direito a entrar em todas as salas de jantar do país, tivesse perdido o juízo e fustigasse a classe política apenas pelo gozo disso, ou por ter descoberto aí um modo de vida.

Ora, este espelho deformante, como o do Palácio do Riso da Feira Popular, para além da exposição mediática voluntária dos próprios políticos, encontra certamente algum eco no actual descrédito da coisa pública e no tão falado apoliticismo das massas.

E, na medida em que os políticos se conformam à imagem que deles têm os espectadores-cidadãos e sabem o que deles se espera, não encontram em si grandes defesas contra a inclinação natural ou a lei do meio, acabando por justificar o preconceito.

É inútil e indesejável censurar a televisão (era preciso, nas escolas, uma disciplina de protecção contra os media). Mas temos de ganhar consciência de como age a grande lei do regime, que é a da demagogia. Tal como o tirano se isola no seu círculo de aduladores e por isso perde a razão, o vício da demagogia, potenciado pela comunicação de massa, prende-nos num outro círculo fatal e condena-nos a uma outra espécie de loucura.


PERSONAGENS

Alcino Silva



Houve uma época em que a compreensão da vida era mais simples. As sociedades eram compostas por grupos sociais bem distintos, diferentes nos seus interesses e na posse da riqueza criada e a comunidade de cidadãos distinguia-se pelos que só tinham direitos e os que só tinham deveres.

Hoje, contudo, como num baile de máscaras, na aparência, tudo se alterou, mas na verdade apenas misturando e confundindo palavras. O capitalismo acabou, as classes diluíram-se como se todos passassem a dispor das mesmas oportunidades e as mesmas posses e alguns chegam a acreditar, ou pelo menos fingem que acreditam, que vivemos uma paz eterna elevando à categoria de missionários os que detêm o poder pelo facto de, sob o seu ponto de vista, os de baixo não serem capazes de governar, pelo que os de cima, embora não o desejando, cumprem uma missão não só histórica como divina de dirigir as nossas sociedades. Para que tudo seja perfeito criaram um sistema democrático de partido único de duas cabeças e decretaram o fim da história. Houve até quem acreditasse.

Naturalmente que a mistificação não escondeu o essencial; os grupos sociais continuam a existir, a posse da riqueza gerada pelos que trabalham continua a ser possuída por uma camada de parasitagem minoritária que através do dito sistema democrático pervertido não perde o controlo do aparelho de estado perpetuando dessa forma um sistema de poder milenário e as diferenças entre os grupos de cidadãos que vivem do trabalho e os outros que se apossam da riqueza criada alcança diferenças que raiam o escândalo e o absurdo, deixando comunidades no limbo da revolta.

A História sempre teve personagens colectivas e individuais. Enquanto as primeiras ficam essencialmente no domínio do anonimato, as segundas adquirem maior ou menor importância pelos feitos, bons ou maus, que realizam. Algumas, chegam a adquirir papel determinante no rumo da vida, do pensamento e do saber das sociedades onde medraram e se desenvolveram e nem todas pelas melhores práticas.

O último século, nomeadamente na sua parte final, assistiu ao aparecimento de diversas caricaturas de homens que se tornaram personagens, pela sua incapacidade ou pela maldade que colocaram nos actos, com que violentaram interesses ou usando de mistificação, adulteraram a história, distorceram aspectos da vida, chegando a aparecerem como homúnculos sem dignidade. Os exemplos abundam, tornando-se até difícil fazer uma selecção mesmo que a título de amostragem.

Um cadáver que se arrasta pela Europa e que dá pelo nome da Javier Solana foi de pacifista na década de 80 a dirigente da NATO tornando-se um criminoso de guerra que se passeia impune pelos corredores do poder com o ar seráfico de homem sério, pese embora ter sido o instrumento que deu ordem de avanço à força aérea daquele agrupamento de predadores para que bombardeasse indiscriminadamente o território da Sérvia, fazendo recuar 50 anos as estruturas industriais e rodoviárias daquele país, arrastando para a morte 5000 pessoas, ao mesmo tempo que anatemizava o presidente eleito daquela nação, o qual viria a acabar cobardemente assassinado às ordens do poder europeu, após encontrar-se prisioneiro durante cinco anos sem que fossem capazes de provar qualquer uma das acusações que lhe faziam.

Um mentiroso com ares de aldrabão, passou de vilipendiar a burguesia, a partir da raiz da classe operária do MRPP, para primeiro-ministro que intrujou o país e o mundo, recebendo como prémio a presidência da comunidade europeia.

Mas há uma personagem que me fascina de forma muito sensível. No passado dia 18 de Outubro de passagem por Lisboa pude assistir a uma manifestação do mundo do trabalho convocado pela CGTP. Dizem ter estado presentes cerca de 200.000 pessoas. Mais dez menos dez, a coisa terá estado por aquele número, quando meses antes tinha havido uma mobilização de ordem numérica idêntica e um ano antes tal cenário tinha sido iniciado com ordem de grandeza semelhante. Presenciei impressionado o desfile daqueles cidadãos que democraticamente mostravam o seu descontentamento e expressavam a exigência dos seus direitos e, vivêssemos nós numa sociedade verdadeiramente democrática, tais exigências deviam constituir direitos bem definidos e praticados sem rebuço. Ao fundo o secretário-geral daquela organização fazia o balanço das reclamações democraticamente apresentadas e incentivava os trabalhadores presentes a não desanimarem da exigência a que constitucionalmente tinham direito e apontava caminhos na concretização desse objectivo. Algum tempo depois em vários canais de televisão aparecia aquela figura, mais tartufo do que homem com aquele ar que nos faz lembrar a doçaria conventual acompanhado da sua pasta misteriosa, em plenas galerias do palácio a sorrir para os seus comparsas da farsa a que submetem o país. Embora usufruindo do dinheiro despendido pelos que trabalham, passa o seu tempo no que chama diálogo social, que nada mais é do que o embuste que tapa a entrega de direitos tão penosamente alcançados pelas gerações que nos precederam. Absolutamente alheio aos milhares de pessoas que expressavam publicamente as suas preocupações e reclamavam dos seus direitos, passeava-se pelo paço em secretas negociatas que apresenta como vantagens para aqueles que entrega sem um protesto, sem uma reclamação, sem a dignidade de quem exerce um mandato que devia conter essas obrigações.

A pergunta que se coloca é saber até quando os cidadãos, aqueles que o são em plenitude, tolerarão esta gente indigna que cavalga impunemente nas costas de quem tem razão? Sim, até quando?


A POESIA POR ELA PRÓPRIA

Mário Martins

http://poetrysfeelings.files.wordpress.com/2007/08/poetry1.jpg


VER CLARO

Toda a poesia é luminosa, até
a mais obscura.
O leitor é que tem às vezes,
em lugar de sol, nevoeiro dentro de si.
E o nevoeiro nunca deixa ver claro.
Se regressar
outra vez e outra vez
e outra vez
a essas sílabas acesas
ficará cego de tanta claridade.
Abençoado seja se lá chegar.

Eugénio de Andrade
Os Sulcos da Sede - 2001

AGORA AS PALAVRAS

Obedecem-me agora muito menos,
as palavras. A propósito
de nada resmungam, não fazem
caso do que lhes digo,
não respeitam a minha idade.
Provavelmente fartaram-se da rédea,
não me perdoam
a mão rigorosa, a indiferença
pelo fogo-de-artifício.
Eu gosto delas, nunca tive outra
paixão, e elas durante muitos anos
também gostaram de mim: dançavam
à minha roda quando as encontrava.
Com elas fazia o lume,
sustentava os meus dias, mas agora
estão ariscas, escapam-se por entre
as mãos, arreganham os dentes
se tento retê-las. Ou será que
já só procuro as mais encabritadas?

Eugénio de Andrade
O Sal da Língua - 1995


ESPERANÇA

O poema quer nascer das trevas.
Está nas palavras, e não as sei.
É como um filho que não tem caminho
No ventre da mãe.
Dói,
Dói,
Mas a negar-se teimosamente
A todos os acenos libertadores
Do desespero dilacerado.
No silêncio causado
E paciente
Canta um galo vidente.
E diz que cada dia
Que anuncia
É sempre um dia novo
De renovo
E poesia.

Miguel Torga
Diário XV
Coimbra, 31-12-1989


MUSA

Aqui me sentei quieta
Com as mãos sobre os joelhos
Quieta muda secreta
Passiva como os espelhos

Musa ensina-me o canto
Imanente e latente
Eu quero ouvir devagar
O teu súbito falar
Que me foge de repente.

Sofia de Mello Breyner
Dual - 1972


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SEGURANÇA SOCIAL

Manuel Joaquim

William Beveridge (1879/1963)


A revolução do 25 de Abril veio permitir alterações muito significativas. O programa do 1º Governo Provisório estabelecia a substituição progressiva dos sistemas de previdência e de assistência por um sistema integrado de segurança social.

A Constituição da República de 1976 consagrou o conceito beveridgiano de segurança social (Artº 63º). No entanto, só em 1981 é que foi ratificada a convenção nº 102 da Conferência Internacional do Trabalho, de 1952, que consagra os princípios fundamentais da Segurança Social.

A Constituição da República Portuguesa de 1976 estabelece:

- O direito universal da segurança social;

- O Estado assume-se como responsável pela organização e pela coordenação de um sistema de segurança social unificado e participado pelas organizações sindicais;

- O Estado deverá subvencionar o sistema;

- Os riscos de doença, velhice, invalidez, sobrevivência, desemprego e qualquer outro tipo de carência de recursos ou de capacidade de trabalho, deverão ser cobertos pelo sistema;

- O orçamento da segurança social será incluído no orçamento do Estado (Artº 108º);

- Um Serviço Nacional de Saúde foi instituído ( Artº 64º) e responsabilizado pelos Serviços Médico-Sociais das Caixas Sindicais.

1975 - Desemprego - Subsídios (carácter experimental)

1976 - Sistema de Segurança Social Unificado e Descentralizado

(Artigo 63º da Constituição)

- Unificação das Estruturas - Previdência e Assistência

- Ampliação da Protecção Social

1977 - Trabalhadores Independentes - Portaria nº 115/77, 9 de Março

- Globalização das taxas contributivas

Desagregação apenas por regimes

Regime Geral- 26,5%: Entidades Patronais - 19% Trabalhadores - 7,5%

Em 1979 - 28,5%: 20,5% 8%

- Criação do Instituto de Gestão Financeira

- Transferência dos Serviços Médico-Sociais da Previdência para o âmbito da Saúde.

A Segurança Social deixou de comparticipar nesta cobertura a partir de 1979 ficando apenas a assegurar subsídios pecuniários de doença e maternidade.
1980 - 1 de Janeiro - Alteração dos Prazos de Garantia - Pensões

Invalidez - 36 meses
de contribuições

Velhice - 60 meses de contribuições

- Criação do Regime Não Contributivo

(âmbito pessoal - nacionais residentes não abrangidos por qualquer regime de protecção social)

1981 - Decreto-Lei nº 200/81, de 9 de Julho

Generaliza a cobertura das Doenças Profissionais - Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais - contribuição 0,5%


TEMPOS MODERNOS

Ana Cristina Guerreiro



Cigarro cravado nos lábios, caneca de café a fumegar, o olhar penetrante a aguardar o flash que ilumina o ecrã. Lá vem ela, faz-se luz, agilidade no pulso e rapidez no click que se acomoda na concha da mão. Acede: entra no universo, afunila-se o cérebro nos cabos, motor de busca à velocidade da espera ansiosa. Mas a página impertinente faz-se rogada, o pisco intermitente do modem enlouqueceu, a porta atirada à cara esborracha-lhe a expectativa, dispara continua e furiosamente, tenta sair, entrar de novo. Nada. O monitor parece uma natureza morta. Desliga tudo, liga tudo. Repete-se nos gestos anteriores resultando o praguejar mais veloz do que a desenvoltura do mecanismo. Fecha os olhos, murmura abre-te sésamo. Nada se abre. Derrotado, vira as costas ao computador, bebe o café amargo e frio, acende dois cigarros, o terceiro queima malcheiroso no amontoado das beatas. A televisão mostra o mundo selvagem onde os leões dormitam arfantes à espera que as fêmeas façam o laço funesto à zebra assustada. Recolhe os joelhos ao queixo, sente-se só e acossado, as horas sem passar, muito cedo para dormir muito tarde para pedir ajuda. Olha o computador com piedade, afasta o teclado, racha um livro ao meio, as linhas de palavras fogem para os cabos mal ligados, empurra tudo o que é ficha. Nada se alterou.

Agarra uma caneta e num papel escreve: "Tempos modernos estes, em que a falta do computador me deixa triste. Que seria se não houvesse luz? E se tão pouco eu soubesse ler nem escrever?"


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30/10/07

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A DEMOCRACIA REAL

Mário Martins

"A Poesia está na rua"


É tentador fazer um paralelismo entre o que se passa hoje com a democracia com o que se passava, ainda há menos de 20 anos, com o socialismo. Até ao fim, não se cansou o regime soviético de propagandear, perante a dúvida, a crítica ou a denúncia, que o socialismo era o que existia, ao qual não havia alternativa. Estabelecida a equivalência socialismo = socialismo real, a crítica e a denúncia do regime eram coisas de idealistas ingénuos ou propaganda anti-soviética ou anti-comunista do inimigo americano e capitalista. Consequentemente, nada de essencial era preciso mudar e o que importava era continuar a governar com mão de ferro. Sabe-se o que foi e no que deu. Apenas acrescentarei que o lado negro do regime não autoriza o seu branqueamento ou absolvição com base nas realizações positivas que produziu.

Os regimes democráticos, a começar pelo americano, são mais subtis. Dada a sua provada superioridade face a regimes totalitários ou ditatoriais não precisam de propagandear que a democracia só pode ser a que existe e de estabelecer a respectiva equivalência democracia = democracia real. Mas a mensagem, implícita, é essa quando propagandeiam as virtudes da democracia. E no entanto só não vê os graves defeitos da democracia real quem não quer ver: os partidos políticos que realmente disputam o poder são instituições onde grassam o carreirismo e o oportunismo no lugar de uma cultura de responsabilidade e respeito pela coisa pública; a liberdade de informação é condicionada pela sujeição dos principais meios ao partido do governo ou ao interesse de grupos económicos; a liberdade de voto é condicionada pelo atraso cultural e educativo e por campanhas de intoxicação política; o poder económico-financeiro dita as suas próprias leis; a riqueza e a pobreza são, em muitos casos, igualmente ostensivas.

A enorme distância entre a realidade destes dois regimes ou sistemas sociais e os ideais que lhes estão associados (no socialista ou comunista “o fim da exploração do homem pelo homem”, no democrático “a liberdade e o poder soberano do povo”), demonstra que não é seguro decidir a nossa adesão em função do seu ideário, mas sim com base na forma concreta como neles se viveu ou vive e, sobretudo, no modo como organizam a nossa vida social.

A experiência mostra a sedução que o perfume do poder, a todos os níveis, exerce nos homens. O nosso comportamento padece de uma evidente tendência dominadora a que não escapam os mais puros idealistas. Os corredores mais sentimentais que físicos do poder operam um corte com a realidade tanto mais profundo quanto maiores forem o âmbito e o grau desse poder. É por isso que o papel institucional da oposição é importante apesar de, tantas vezes, demagógico e que os requisitos centrais que um regime político ou sistema social devem satisfazer são o de divisão e mobilidade orgânicas do poder e o de garantir condições de liberdade política que nos protejam de nós próprios. Este é, parece-me, o melhor palco para essa luta sem fim pela aplicação do princípio de justiça que é imanente ao conceito de igualdade natural entre os seres humanos.


A UM COPO DE VINHO

Ana Cristina Guerreiro

http://www.robwilson-images.com


Tombou a garrafa enroupada pelo triângulo branco de um guardanapo já tinto de pequenas lágrimas que verteram do gargalo e acertou com o jorro no copo.

No silêncio do almoço só o som de metal a raspar ao de leve no prato já meio comido, o pigarro de quem apura a voz para se preparar para dizer algo solene, o ruído tremendo das pálpebras que se erguem para entender palavras com calo que muitos anos haviam que todas as refeições se saboreavam no engolir e atirar para o fundo do estômago embrulhos de pedaços de vida à mistura com ácidos corrosivos que deixavam liquefeitos na vontade, o ânimo, o querer, o protestar, o sentir.

Irritava-o aquela forma gentil que ela tinha de pegar no copo e apenas tingir na ponta da língua o vinho que ele lhe servira. Irritava-o aquela forma passiva de ela aceitar sem debate o que o mundo lhe apresentava. Irritava-o que ela não se irritasse com ele.

Tomava o vinho como tomava a vida: a medo, aos golinhos, aos pouquinhos não fosse na sofreguidão de encher a boca e agarrar o néctar engasgar-se e cuspir-se, perder a compostura...

- Bebe! Uma vez na vida que seja, bebe! Descompõe-te, baba-te, embebeda-te!

Ela olhou-o, sem surpresa. Compôs o guardanapo no colo, passando-lhe as mãos várias vezes, alisando engelhas imaginárias que se tinham formado por um amarfanhar de anos.

- Bebe!

- Porque nunca me pediste para beber? Para gritar? Porque te calas nas únicas horas em que estamos juntos?

O silêncio voltou e vestiu a mesa como um paramento fúnebre, ele regressou aos talheres, ela serviu-se de mais um pouco de vinho.

- Sabes... Acho que devemos ter a decência e a gentileza de servir os outros, servirmo-nos a nós próprios, saber quando a refeição terminou, qual o vinho adequado...

- Não percebo...

- Quero eu dizer que está na altura de levantar a mesa. Por quanto mais tempo nos enganamos nós?! Até este vinho se tornar um vinagre de tão má qualidade que nem as moscas o quererão?! Sejamos honestos: já nada resta para mim, para ti... Só a delicadeza de uma boa amizade... Anda! Deixa-me servir-te: tomemos um copo pelo que poderemos ser!

Ela serviu generosamente e tocou com cuidado no copo dele em jeito de brinde.

E depois, de uma só golada vazou o conteúdo.

Ele ficou-se por pequeninos goles, sorvidos na ponta da língua, aos poucos, uns atrás dos outros.



BASTARDOS

Alcino Silva

Letra de "Os Vampiros" de Zeca Afonso


De quando em quando, em momentos que o rebanho incrédulo parece tresmalhar-se o poder, ou dito de forma mais inteligível, os senhores que através dele se governam, fazem soar o toque plangente do campanário como se uma desgraça pairasse sobre o povoado. Ouvem então longos sermões sobre a democracia, do aproximar o povo do seu exercício, do seu aprofundamento, da necessidade de convívio entre a massa anónima e as paredes onde se pratica a actividade da decisão. Algum tempo passado e esta vontade indómita amaina e tudo retoma a melancolia dos fins de tarde outonais.

A democracia deveria ser um processo evolutivo e em permanente construção, mas aqueles que se apoderaram das suas instituições e a moldaram ao sabor dos seus interesses dizem que não. Afirmam antes que é a perfeição das imperfeições. A partir daqui, tudo o resto, é terra queimada e ponto final.

Nestes diálogos sobre democracia ocorre-me sempre Gabriel Garcia Marquez quando nos conta que tempos houve na Colômbia em que o que distinguia o Partido Liberal do Conservador, que se eternizaram no poder até hoje, é que os liberais iam à missa das cinco para não os verem e os conservadores à das oito para pensarem que eram crentes. Esta lembrança não é tanto pelo cinismo da farsa, mas sobretudo, pela terrível verdade que encerra.

Aquela parte do planeta a que sobranceiramente denominamos de Ocidente é esse espaço o desenvolvimento humano assistiu em primeira plateia ao douramento da burguesia. Primeiro no lombo da nobreza e de seguida, de velas enfunadas, senhora dos mares, nunca antes navegados como ridiculamente afirmam, e que de tanto repetirem, assumem como verdade indesmentível. Não se pense que com esse delírio, chegou de imediato a democracia tal como a dispomos hoje. Não, essa gesta parlamentar conviveu décadas e décadas com o, esclavagismo, a servidão, o colonialismo e todas as formas de discriminação que se conhecem. Ainda hoje, gente bem democrática, invade impunemente países e detêm povos inteiros em enormes campos de concentração. E não fosse a chegada ao poder das instituições, dos malditos que povoam o mundo do trabalho e conversados estaríamos sobre o que seriam hoje os tais Estados democráticos. Do bom e do mau que foi essa experiência humana havemos de conversar num outro espaço.

Mas esta democracia que por aí se instalou, quando aprofundada, não passa de uma ditadura onde quem dirige a orquestra é um único partido bicéfalo. Uma espécie de águia czarina, em que duas cabeças, olhando em direcções opostas, como se não se pudessem ver, alimentam o mesmo corpo. É assim em qualquer um dos países que conhecemos, pese embora as cores com que pintam as máscaras. Ora, são laranjas e rosas, laranjas e negros, negros e rosas, isto e aquilo, o resultado é o mesmo, um corpo e duas cabeças. Por vezes, aparecem em redor pequenas cabeças semeadas pelo corpo da águia. Como tantas coisas na vida, a política também tem os seus homúnculos, mas a essência da questão não se altera. Não se pense que a decisão se encontra na cabeça da ave, pois este animal disforme, tem o cérebro dirigido pelo estômago. Massa encefálica distorcida por interesses há longo tempo semeados, funciona ao sabor de marés que sobem e descem num plano interno e não visível.

Esta ditadura, dita democracia, como qualquer festa pagã, também tem o seu fogo de artifício. São o que chama, os pequenos partidos, os quais como girândolas coloridas, volteiam alguns minutos antes de acabarem em meras faúlhas derretidas pelo vento. Todas as festas têm o seu folclore. Dão cor, animam o festejo, alegram a alma e desaparecem com o desmontar dos enfeites. Vão e vêm com os cenários. Alguns teimam em cantar no intervalo, mas a democracia reserva-lhes o espaço donde os sons da música não cheguem aos corredores do palácio.

Acontece que mesmo esta farsa sofre desequilíbrios. Entusiasmado, por vezes, o corpo da cabeça bicéfala age sem freio e reclama do cérebro a posse de todo o repasto. Que o diga o rapaz com nome de filósofo e voz de música da antena 3. A sensação já longamente escutada, do mundo sou eu, percebem-na os malditos nessa façanha quotidiana de sobreviver.

Autómato dirigido à distância, comanda um concílio de aventureiros que têm por objectivo final, colocar o Estado de joelhos perante os interesses antropófagos dos senhores do dinheiro, hoje mais virtual do que real. Dia-a-dia, desmantelam o Serviço Nacional de Saúde, privatizam as instituições estatais, despovoam o interior, vendem à peça o tecido produtivo que ainda resta, reduzem o emprego a acasos da vida, criam um monstruoso abismo entre os que detêm a riqueza e os que a produzem e lançam o país num destino sem futuro, sentados em cima duma população anestesiada cuja vértices culturais são visíveis nos 50% de iliteracia e num espantoso abandono escolar. Já foram laicos, republicanos e socialistas, hoje, até os mais sérios concordam, que não passam de uma massa amorfa dançando a música que provém dos subterrâneos de poderes invisíveis. Chamei-lhes aventureiros, mas não passam de canalha política. Nas palavras do poeta galego Carlos Oroza, não os odeio, apenas me enojam.

Chamam-lhe democracia. Por mim, podem chamar-lhe o que quiserem que o resultado há-de ser o mesmo, simbolizado nas palavras cantadas do José Afonso.


são os mordomos do universo todo
senhores à força, mandadores sem lei
enchem as tulhas, bebem vinho novo
dançam a ronda no pinhal do rei.



Início

ENTRE PEQUENOS E GRANDES ANIMAIS

António Mesquita

Esopo e a Esfinge
(http://expo.artactif.com/mazilu)


Haverá uma fisiologia da política?

As nossas adesões estarão de algum modo condicionadas pelo nosso temperamento, pela nossa constituição física? Um mau fígado ou um estômago fraco imporão certas escolhas?

Nem me refiro sequer à conhecida influência da idade em tomadas de posição mais conservadoras (chega sempre um dia em que o inconformista e o rebelde têm de lutar pelo "seu" mundo em declínio).

Também não estou a pensar na mais que certa inclinação (geralmente no sentido contrário, por afirmação própria) que os que chegam à política trazem do ambiente familiar.

Parece-me não restarem dúvidas que, para simplificar o que de outro modo seria extremamente complicado, recorremos, mais ou menos todos à caricatura ou à fábula.

Poderíamos ver então a política dos nossos dias como um cenário com grandes e pequenos animais, uns que voam, outros que rastejam, que são ungulados ou não, mas que, sobretudo, falam como a gente?

Se pensarmos bem, há certas ideias sobre a política que funcionam no sentido da fábula, como simplificações expeditas. De tal modo, que uma classificação aparentemente mais sócio-política adquire, pelas suas formas diferenciadas e hierarquizadas, ou pelo seu contorno moral, uma consistência zoológica.

Encontramos logo, muito convenientemente, a forma do animal, sem ter de lhe descobrir o carácter, nem sondar o pensamento (ou os rins).

Assim, sabemos que um porco há-de sempre pensar em bolota e que um chacal pensará obviamente em carne podre.

É muito curioso como as ideias mais abstractas e altamente teóricas da filosofia política, vieram rolando pela encosta da vulgarização até chegar ao solo da Esopeida.

Não é preciso dizer que este mundo da fábula tem também a sua moral, senão não serviria de muito.

O mais baixo da escala é o réptil, pelo menos na nossa cultura, se bem que, noutras paragens, possa ser considerado um deus.

Não há, contudo, sistema perfeito. O problema do ornitorrinco impede-nos de considerar Lineu como o maior dos filósofos políticos.



O PROGRESSO

Mário Faria

Cena de "Cinema Paradiso" (1988-Giuseppe Tornatore)


Provavelmente por ser um jovem com bastante idade, lembro-me de muitas salas de cinema, que já não moram cá. Em algumas delas só havia cinema ao fim de semana (Ex.: Odeon e Central Cine). O Carlos Alberto, com sessões duplas, era uma sala muito particular que permitia os espectadores interagirem com as cenas e os frequentes cortes nos filmes. Mais com os segundos do que com as primeiras, até porque nessa altura havia censura e não eram permitidas cenas eventualmente chocantes. Mas, era lindo de ouvir as palmas quando o artista matava o vilão ou os assobios por cada corte que interrompia uma cena mais arrojada, de maior suspense, os beijos mais arrebatados ou a pouca nudez que era permitida.

Na zona da minha residência, havia a seguinte oferta de salas de cinema : Vale Formoso, com filmes infantis ao sábado de tarde, Terço, Júlio Diniz e o Estúdio. O “velhinho” Terço, coberto posteriormente, funcionava apenas no Verão, mas ao ar livre. Completamente degradado fechou : não oferecia condições mínimas de comodidade e a frequência era muito baixa. A última vez que vi lá um filme, nem meia dúzia de pessoas assistiam. Sinto alguma mágoa, mas parece-me que o cinema com a centralização das salas nos grandes centros comerciais, ganhou muitos espectadores, e “salvou”, aparentemente, a actividade de uma agonia que parecia ter vindo para ficar.

Num recente debate sobre a desertificação da baixa do Porto, a presidente dos pequenos comerciantes do Porto, queixava-se das grandes superfícies instaladas na periferia – sem que isso correspondesse, na sua opinião, a uma verdadeira necessidade dos consumidores –, como as principais responsáveis dessa desertificação e pela falência do pequeno comércio tradicional.

Será que tem razão ? Ou será que os pequenos comerciantes adormeceram à sombra da bananeira, não se souberam modernizar, tirar partido do efeito de proximidade e posicionar-se para um serviço mais personalizado. Ou este é o caminho inexorável do progresso em que o small is beautiful já não é, prevalecendo o gigantismo das organizações, sustentado na ditadura financeira, que firma as regras do jogo e subjuga os mais pequenos ?

É o progresso dizem os optimistas e os gurus conselheiros de todas as modernidades. Sobre o progresso vale a pena determo-nos um pouco sobre parte de um texto que escreveu João Barrento, que acho brilhante e certeiro :

“… Estamos sempre a usar conceitos ambíguos, palavras para realidades movediças e indistintas. "Progresso" é um desses conceitos. Leio e traduzo um livro - de poesia, imagine-se - que coloca no seu centro a questão das contradições do progresso e da necessidade de as problematizar … O progresso (o grande sonho, ou pesadelo, da razão) foi cada vez mais naturalmente – porque a história é, de facto, a nossa segunda natureza - afectando vidas, sociedades, sistemas. De forma positiva, proporcionando-nos aquilo a que se convencionou chamar "qualidade de vida" (outro conceito problemático e ambíguo), e também negativa, porque progresso e sistema andam sempre de mãos dadas …Mas esse progresso, que os seus retratos apresentam de forma espectacular e algo patética, tornou-se hoje silencioso e invisível. Sorrateiro, o consumo trá-lo para as nossas vidas, e mal damos por ele já a sua rotina se instalou. E acabamos por lhe agradecer. E as multinacionais que o gerem agradecem… O sistema insiste, e sabe que pode esperar - para ganhar, no duplo e perverso sentido do termo (é lógico e consequente, num capitalismo sem alternativas à vista). E aqui damos com outra questão de fundo. O sistema "constrói as ruínas do futuro" : tudo o que toca se transforma, não em ouro, como na história antiga de Midas, mas em sucata virtual. É isso o progresso, cujo olhar só conhece uma direcção … Vivemo-lo e agradecemos-lhe por existir, é tudo. Alguns tentam, em vão, fugir-lhe. Pura ilusão: o sonho da razão continuará a gerar os seus monstros.”

Nota Final :

Nos casos dos cinemas Vale Formoso e Júlio Dinis é justo dizer que não morreram : transformaram-se. O primeiro pertence à IURD e é um consolo para a alma ; o segundo é um salão de baile e é um consolo para o corpo. Vale a pena uma visita, a ambos. Não percam a oportunidade.


O RESPEITO

Dina La-Salette

"Zéro de Conduite" (1933-Jean Vigo)


Como deverá ser ensinado a uma criança o respeito pelos pais (ou avós)?

O que é para nós o respeito?

Penso que esta palavra é geralmente sinónimo de receio, como se pode observar nas crianças que “respeitam” professores severos (ainda os há nos primeiros anos de escolaridade). No dicionário, respeito quer dizer sentimento de estima devido ao mérito. Mas se as crianças não acharem os pais (os ou avós) dignos de estima, poderemos forçá-los a crer que estes merecem o seu respeito ?

Há qualquer coisa de infantil nos pais que exigem respeito dos filhos, porque é evidente que não conseguiram inspirar a sua afeição, e por essa razão tentam obter deles algo parecido com amor. Os pais que são francos e justos para com os seus filhos não precisam de exigir-lhes respeito. E o mesmo se passa com os avós.

Como é que uma criança pode respeitar uma mãe que ralha continuamente com ela, ou um pai que está sempre a gritar ? Como é que essa mesma criança pode respeitar pais que mentem? Ou como é que essa criança pode respeitar uma mãe que se deixa agredir física ou psicologicamente pelo marido?

Quanto aos avós, geralmente há dois tipos: os que dão demasiados mimos aos netos, com o pretexto que os pais não os sabem educar, e os que vêem neles uma ameaça às suas convicções. Estes últimos detestam ver os jovens de cabelos compridos ou com penteados “esquisitos”, que usam uma linguagem pouco convencional (incompreensível para eles), que só pensam em festas e em música pop (ou hip-hop...) Por sua vez, os jovens não apreciam as suas interferências e as suas lições de moral.

Ainda há um fosso considerável entre um avô de 70 anos e um neto de 10 ou 12. Não vale a pena iludirmos esta questão: os velhos e os jovens não falam a mesma linguagem e não têm os mesmos interesses. A maior parte dos avós estão amarrados aos pontos de vista da sua geração e ajustam-se mal aos costumes e modas novas.

Voltando aos pais, quando o diálogo com os filhos se reduz aos estereótipos como “hoje está bom tempo”, “veste o kispo porque está frio”, “como é que correu hoje a aula?”. etc., os jovens acabam por rejeitar cada vez mais qualquer tipo de conversa. Mais tarde estes pais irão sentir um imenso sentimento de culpa por acharem que não foram suficientemente afectivos e atentos para com os filhos. Sentir-se-ão também imensamente defraudados e frustrados pela falta daquilo que consideram o respeito que os filhos lhes devem.

Talvez a solução esteja no saber rir, tolerar, comunicar a tempo com os filhos (e os avós com o netos) porque o humor e o ódio ou a indiferença não conjugam entre si. Em vez de exigirem “respeito”, ralharem ou castigarem um filho que chamou “bruxa” à mãe ou “idiota” ao pai, não esquecendo que tal não significa, na maioria dos casos, que esse filho deixou de amar os pais.



OS TINTUREIROS DO PORTO RECLAMAM

Júlio Soares

Tinturaria

Associação de Classe União dos Operários Tintureiros Porto
Rua do Laranjal 81 2º andar
Porto

Porto 6 de Dezembro 1915

Ex.mo Sr.Dr.
José Joaquim Pereira Osório Digníssimo Governador Civil do Distrito do Porto

Ex. Sr.


Tendo o parlamento da Republica Portuguesa decretado uma lei regulamentadora do horário de trabalho nas industrias e logo o Governo fez entrar immediatamente em vigor por portaria especial nr.(384).Não desconhece por certo V.Excia que as industrias a onde se empregam ou preduzem matérias tóxicas são a abrangidas nessa lei por artigo especial( nr 3 do artº 4) que estabelece o horário normal d’8 horas diárias. Ora sendo a industria de Tinturaria uma das que mais matérias tóxicas emprega. Como sendo ácido sulfúrico. Bicolmato de soda com ácido, cloreto de cal com ácido, ácido formio, espírito de sal marinho, sal de anilinas, nitrite de soda com ácido sulfúrico e ácido amuniaco e outros produtos cimicos que produzem vapores muito prejudiciais a saúde dos hoperários. Como sendo a cegueira e a tuberculose sustentando os hoperários tintureiros um pesadíssimo trabalho.

Estando durante 11 e mais horas a lidar com água fria a mistura com água a ferver andando sempre mulhados o que resulta andarem muitos operários sufrendo don Rheumatismo e outras muléstias do peito.

No Inverno istam os operários sujeitos a uma atemusfera degradante causada pela pouca ventilação das oficinas e produzida pela vapurização das tinas a onde se manipula o algodão seda e lá é tal a nevrina que se acumula que a distância d’ um metro não se beem os operários uns aos outros.

Tudo isto á a isperção da verdade o que V.Exª se pode emformar pessualmente ou mandar um reprezentante de V.Exª junto Com um ou mais Delegados d’esta associação.

Já vê pois V.Exª que os operários tintureiros teem toda a razão e a justiça para pedirem a V.Exª o cumprimento da lei que o Parlamento da Republica promulgou, ou seja o nr.3 do artº 4 da lei nr.384 a que os operários Tintureiros teem direito.

Por isso esta Associação vem em nome da classe pedir a VªExª para convidar os Srs Industriais a reunirem juntos com Vª Exª a ver se chega a um acordo, entre patrões e operários. Visto estes Senhores já istarem avisados por uma circular egual a que junto enviamos a Vª Exª isto para evitar comfelitos, porque os operários tintureiros não querem o andamento e boa marcha da Republica, nem alteração da Ordem Pública.

Queremos a lei e que se cumpra a lei i viver dentro da lei. Não queremos que os Srs.Industriais calquem e faltem ao respeito as leis da Republica.

Queremos o respeito pelas leis que o Parlamento da Republica promolgar.

Sertos que Vª Exª fará justiça desejamos a Vª Exª

Saúde e Fraternidade

Porto 6 de Dezembro 1915

A Direcção

(Letra Ilegível)

Deixamos propositadamente a grafia tal e qual, motivo que estamos em 1915 e existir como agora se diz muita iliteracia, naquela época era analfabetismo, e as pessoas escreviam como falavam, felizmente que hoje tudo mudou para melhor, mas é sempre bom voltar ao passado, para saber como era este país.



SEGURANÇA SOCIAL

Manuel Joaquim

http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/previdencia.jpg

(continuação)

1969 - Lei nº 2.144, de 29 de Maio

- Criação do Regime de Previdência dos Trabalhadores Agrícolas:

. Regime Especial de Abono de Família
. Regime Especial de Previdência

(regimes altamente deficitários)

Reorganização das Casas do Povo e sua articulação com as Caixas de Previdência e Abono de Família.

É criação do regime especial agrícola de previdência que responde parcialmente a preocupações expressas em 1961.

Os subsídios de desemprego previstos nesta lei serão instituídos só depois de 25 de Abril de 1974.

Parte dos recursos do Fundo de Desemprego servirão para financiar os défices deste regime ( Decreto nº 49.216 de 1969 e Decreto-Lei 391/72)

1970 - Sobrevivência - generalização a todas as Caixas Sindicais de Previdência e de Reforma

Caixa Nacional de Pensões

1974 – Janeiro - Alteração dos Prazos de garantia

Pensões

Prazo único: Invalidez e velhice - 3 anos
De inscrição: 24 meses de contribuições

- Eliminação do Plafond Contributivo

- Pensão Social - Regime não contributivo - DL nº 217/74

- Desemprego - Assistência Médica e Medicamentosa

Abono de Família

- 13º Mês de Pensão - Subsídio de Natal





30/09/07

3

A COBERTURA DOS ACTIVOS PELA PREVIDÊNCIA

http://observer.case.edu/Images/1405.png

(…/…)


A Cobertura dos Activos pela Previdência Social

1960

Benef.activos Pop. activa Taxa de cobertura

(milhares) (milhares) (%)

Caixas Sind
e de Reforma 878,5 1.823,9 48,2

Casas do Povo
e de Pescad. 305,5 1.491,8 20,5

Fonte: INE - Estatísticas de Previdência 1960


A construção da habitação social foi financiada pela Previdência.

Estavam excluidos os riscos de maternidade, sobrevivência, desemprego, acidentes de trabalho e doenças profissionais, apesar de previstos no Estatuto do Trabalho Nacional.

A população do sector primário não tinha protecção contra a invalidez e a velhice. As Casas do Povo e as Casas dos Pescadores praticavam simplesmente a assistência social e médica.

A Lei nº 1884, de 16 de Março de 1935, previa a criação de Caixas de Previdência para o sector primário mas nunca foram instituidas.

Em relação ao desemprego tinha sido prevista legislação que nunca foi publicada. Foi criado um Fundo de Desemprego pela Lei nº 21.699, em 1932, financiado pelas contribuições das entidades patronais (1% da massa salarial), dos trabalhadores (2% dos salários) e por uma transferência de 2% da receita do imposto sobre a propriedade predial e urbana. Ficará fora do sistema da previdência até 1986.

As insuficiências eram por demais evidentes e perigosas para o poder político.

1962 - Lei nº 2115, de 18 de Junho - Reforma da Previdência

Reorganização da estrutura do sistema. As Caixas Sindicais serão especializadas na previdência dos assalariados. As Caixas de Reforma destinam-se à previdência dos trabalhadores independentes.

É criado um subsídio de invalidez para as pessoas abrangidas pelas Casas do Povo e dos Pescadores que mantêm, no entanto, a situação anterior de instituições de simples assistência social e médica.

Instituições de 1ª Categoria:

Caixas Sindicais de Previdência:
( desdobram-se em)

Caixas de Previdência e Abono de Família

Caixas de Seguros

Caixas de Pensões


Casas do Povo


Casas dos Pescadores

As Caixas Sindicais de Previdência organizam-se a nível regional (com excepções), formam as Caixas Distritais e criam uma Federação Nacional.

Cobertura:

Doença

Maternidade

Abono de Família

1963 - Decreto-Lei 45 266, de 23 de Setembro de 1963

Regulamento das Caixas Sindicais de Previdência

Prazos de Garantia:

Invalidez: 5 anos de inscrição - 30 meses contribuições
Velhice: 10 anos de inscrição - 60 meses contribuições

1965 - Caixa Nacional de Pensões

Cobertura:

Invalidez

Velhice

Morte

- Regime Geral de Previdência

Introdução de alterações significativas em critérios e administração.

Alteração do regime de capitalização para o regime de capitalização mitigada ou misto.

- Lei nº 2.127, de 3 de Agosto - Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais

- Caixa Nacional de Seguros e Doenças Profissionais

- Caixa Central de Segurança Social dos Trabalhadores Migrantes - Acordos e Convenções Internacionais de Segurança Social.


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