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01/08/23

DESTRUIDOR DE MUNDOS

António Mesquita

(https://images.app.goo.gl/bfmKr2CX22fVzx7T6)


"Now I am become Death, the destroyer of worlds."
 (Robert Oppenheimer, citando a "Bhagavad Gita")

"It is one thing for the human mind to extract from the phenomena of nature the laws which it has itself put into them; it may be a far harder thing to extract laws over which it has no control. It is even possible that laws which have not their origin in the mind may be irrational, and we can never succeed in formulating them."
  (Arthur Eddington)



O filme "Oppenheimer", Christopher Nolan, é inspirado no livro de Kai Bird e Martin Sherwin "American Prometheus: The Triumph and Tragedy of J. Robert Oppenheimer" e é a história do físico teórico americano, apaixonado pelos textos sagrados do hinduísmo e pela teoria quântica que "roubou o fogo" aos deuses como o mítico Prometeu, construindo a promeira bomba atómica no deserto do Novo México. O seu castigo não foi no Monte do Cáucaso, com o fígado devorado pela águia, para toda a eternidade, mas a calúnia e a ingratidão do Estado e a sua própria consciência que o fazia sentir sangue nas mãos depois das duas cidades japonesas destruídas supostamente para abreviar a guerra.

Na entrevista com Harry Truman, o presidente que tomou a decisão de largar a carga letal, a má consciência de cada um disputa-se uma questionável primazia. Truman oferece-lhe um lenço para limpar o sangue, chocado com a assunção de responsabilidade do outro.

Outro "responsável", no papel dum simpático velhote observando as flores do parque, é Albert Einstein que não sabemos se sentia também "sangue nas mãos". Quando Oppie procura conselho, refugia-se no seu retiro espiritual, sem dizer sim nem não. Apesar de tudo, é um dissidente da nova física de Max Planck, em que Deus parece "jogar aos dados".

A verdade é que só a guerra e a perspectiva de que Hitler podia ter acesso à bomba, rodeado que estava pelos maiores nomes da física moderna, arrastando o mundo para uma catástrofe inimaginável, convenceu os americanos a criar o "Projecto Manhattan". Depois de vencida a Alemanha Nazi, a ameaça passou a ser o Japão imperial e o seu fanatismo que nunca se renderiam sem uma tal demonstração de força.

Do grupo de Oppenheimer fazia parte Klaus Fuchs,  um cientista alemão que estudara em Inglaterra e passava informações para a União Soviética. Em pleno McCarthysmo, a revelação desse facto e o próprio passado esquerdista de Oppenheimer, tornaram-no alvo de perseguição pelo FBI. 

As cenas da primeira explosão no deserto são de antologia e parece que feitas sem recurso ao computador. Boa parte do filme é ocupada  com a vingança "fria" de Lewis Strauss (magnífico Robert Downey Jr.), presidente da  US Energy Commission que nunca lhe perdoou a humilhação a que foi sujeito numa conferência de imprensa, em que o cientista troçou da posição de Strauss sobre a exportação de isótopos radioactivos. Strauss também o considerava responsável pelo esfriamento nas suas relações com Einstein.

E já que estamos a falar em interpretação, é justo destacar a do protagonista Ciilian Murphy que, mesmo se falhou em expressar-se correctamente em holandês a certa altura do filme, fez história com o seu Oppenheimer. Um tal sucesso só o comparo à divina surpresa de Peter O'Toole, outro irlandês, no filme de David Lean.

A complexidade da personagem é-nos dada em toda a gama de expressões. O filme sofre de alguns pecadilhos que não o prejudicam no cômputo geral,  como as visões "psicadélicas" sobre o mundo quântico que atormentam o físico a certa altura ou algumas cenas íntimas dispensáveis.

A espécie de profecia final nem me parece fora de tom. O que o será, talvez,  é o sentimento de culpa que persegue o cientista, mas que afinal devia ser endossado a toda uma cultura "fora dos gonzos",  como diz o vate de Stratford-upon-Avon. (Arthur Eddington)


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