Manuel Joaquim
Todos os dias temos comentadores encartados a escrever ou a falar sobre a guerra na Ucrânia, nos jornais, nas rádios e nas tvs, nestas com cenas em fundo vistas muitas vezes em vários dias, e ficámos a saber o mesmo sobre os acontecimentos, quase sempre com apreciações muito subjectivas, que, depois, através de outros canais de notícias, verificámos não corresponderem ao que realmente se passou ou passa. A informação está toda ao serviço de determinada política. A opinião das pessoas é condicionada pelas informações que lhes dão.
Faz-me lembrar a “Casa de Bernarda Alba”, levada a cena pelo TEP há muitos anos, quando tudo estava a desmoronar-se e dizia ”Aqui não se passa nada”, com a extraordinária interpretação de Júlio Cardoso. Como também me faz lembrar a “Brigada do Reumático” quando se dirigiu a Marcelo Caetano, após os acontecimentos de 16 de Março de 1974, nas Caldas da Rainha.
Sobre a guerra, não tenho informações que me permitam fazer comentários. Sei que está a morrer muita gente, civis e militares, e vai continuar a morrer muita gente.
Hoje, é cada vez mais claro que a guerra não é entre a Rússia e a Ucrânia, mas sim entre o que se passou a designar o “ocidente alargado” e a Rússia. E os comentadores encartados vão subtilmente alterando o que vão dizendo e a admitirem que a Ucrânia é uma peça no xadrez.
Continua a haver vozes defendendo que a Rússia tem que ser destruída. Um dos panfletários é “o jardineiro” da União Europeia, que aparece no seu jardim de camuflado, a defender a criação de um exército europeu para destruir a Rússia. Para já, a EU está a gastar milhões em equipamentos militares e é, para todos os efeitos, o braço político da Nato. Para isso, os europeus vão passar a ter menos dinheiro para manteiga, mas mais armas para matar pessoas.
Para compreender as causas desta guerra temos de conhecer os acontecimentos históricos, desde o século XIX, praticamente desde a “Primavera dos Povos”, 1848, que levou à “Comuna de Paris”, 1871, à Revolução de Outubro, 1917, à “Grande Guerra”, 1914-1918, à “2ª Guerra Mundial”, 1939-1945, até à presente data.
Sérgio Ribeiro, em “Reflexões e anotações sobre Crítica da Economia Política”, livro que deve ser lido, fonte de alguns comentários aqui efectuados, refere que a “economia política continua a ser fulcral na evolução do estado do mundo ” E, de facto, é a economia política, a luta de classes, o problema das matérias-primas, os “espaços vitais”, que determinam as guerras.
A Alemanha procurando o seu “espaço vital”, ocupou a Polónia, e provocou a 2º Guerra Mundial, a partir de 1 de Setembro de 1939, pretendendo conquistar a URSS para obter matérias-primas, designadamente combustíveis. A Inglaterra, inicialmente, procurou participar no festim, mas a sôfrega do alemão não permitiu. O governo da França passou a colaborar com o nazismo, assim como diversas organizações dos países bálticos e não só. A guerra era contra uma sociedade diferente, com valores diferentes, que punha em causa os valores dominantes.
A guerra acabou com a derrota da Alemanha, com a entrada do Exército Vermelho em Berlim.
Os Aliados: Estados Unidos, Reino Unido e União Soviética prepararam o pós-guerra. Entre as duas reuniões realizadas, e já com a guerra terminada os EUA, em Agosto de 1945, lançaram duas bombas atómicas sobre as cidades do Japão – Hiroshima e Nagasaki, sem avisar os participantes.
É bom referir que a França não participou nessas reuniões. Como também é bom referir que antes das reuniões entre EUA, Inglaterra e URSS, realizou-se uma reunião no alto mar entre Churchill e Roosevelt onde foi aprovada pelos dois a “Carta do Atlântico” (14 de Agosto de 1941) ainda antes do final da guerra. É interessante ler as Memórias de Churchill e descobrir qual era o verdadeiro objectivo da 2ª Guerra Mundial: destruir a URSS. Mas não aconteceu. Os EUA só entraram na guerra depois de verificarem que o exército vermelho estava decididamente a ganhar a guerra.
Nas primeiras reuniões para a formação do Fundo Monetário Internacional a URSS participou, mas posteriormente foi excluída.
Os EUA, ex-colónia da Inglaterra, sempre ligada aos interesses do império britânico, beneficiou largamente com a 2ª Guerra Mundial, permitindo-lhe desenvolver a sua economia fundamentalmente através da indústria militar.
Hoje, têm mais de 800 bases militares à volta do mundo. Após a 2ª guerra mundial efectuaram mais de 200 intervenções militares. 25% delas foram efectuadas depois do fim da guerra fria, não falando em intervenções que levaram a mudanças de regime. Victoria Nuland, secretária de Estado dos EUA, interveio directamente no golpe de estado na Ucrânia, participando e dirigindo operações no terreno, tendo declarado, em determinado momento, que tinham gasto cinco mil milhões de dólares na preparação do golpe, e, respondendo ao embaixador dos EUA sobre a posição da União Europeia, disse-lhe “que se foda a EU”.
Em 1949 o Partido Comunista Chinês conquistou o poder. Os EUA, em determinado momento, tentaram provocar problemas entre o PCC e o PCUS, criando a ideia de que a China seguiria outro caminho que não o do socialismo. De facto, aconteceram divisões entre os PCs. O imperialismo acreditou.
Lembro-me de nessa altura, Jofre do Amaral Nogueira, historiador e filósofo, que foi meu professor, dizer que se a URSS fosse derrotada pelo imperialismo, ficaria a China para continuar a luta pelo socialismo. Se fosse a China derrotada, ficaria a URSS, para continuar a luta. Hoje, para terror do imperialismo, ambos os países estão unidos na defesa dos seus interesses.
Jofre do Amaral Nogueira faleceu em 1973, em Lisboa, sobre uma mesa do café Paladium, na Avenida da Liberdade, em circunstâncias estranhas, tendo desaparecido uma pasta com documentos importantes.
A crise dos mísseis em Outubro de 1962 esteve quase a provocar uma guerra nuclear. Os EUA não admitiram que os soviéticos instalassem mísseis nucleares em Cuba, à sua porta. Cabeças frias de ambos os lados resolveram o problema. Os soviéticos retiraram os mísseis. Mas isto aconteceu porque os EUA também retiraram 15 mísseis nucleares que, anteriormente, isto é, em Novembro de 1961, tinham colocado na Turquia, situação que nunca é referida quando se fala dos mísseis em Cuba.
Se a Rússia vier a instalar armas nucleares, em Cuba, na Venezuela, na Nicarágua e noutros lugares, tendo como alvos as suas grandes cidades, como vão reagir os EUA? Como vai ser apreciado o desenvolvimento da Nato na Europa, particularmente na Ucrânia?
A OTAN – NATO, Organização do Tratado Atlântico Norte, considera-se uma organização defensiva circunscrita ao Atlântico Norte, mas que interveio na guerra da Jugoslávia, sem decisão das Nações Unidas, no Afeganistão, no Iraque e noutras partes, também sem decisão das Nações Unidas e agora pretende intervir na Ásia. Como é possível?
Uma outra questão que me parece importante: A 2ª Guerra Mundial foi iniciada pela Alemanha por falta de espaço vital, por falta de matérias-primas e por falta de combustíveis Neste momento, a Alemanha não tem acesso nem a combustíveis nem a matérias-primas. Está em sufoco económico. Como vai reagir perante esta situação?
Quem falar em Paz é acusado de tudo e é perseguido. Nenhum país da EU fala em Paz, fala em guerra. Os comentadores e a maior parte dos políticos quando foram confrontados com a iniciativa da China ao apresentar 12 pontos para meditar sobre um plano de Paz, desvalorizaram e até gozaram com a situação. O que lhes interessa é a guerra, não querem a Paz. Mas agora, quando se iniciam passos por iniciativa da China estão a ficar muito desorientados. São sinais evidentes de que coisas não lhes estão a correr bem.
Alguém se lembra ou sabe o que diz o Artº 7º da Constituição da República Portuguesa, incluindo os membros dos órgãos de soberania?
Sem comentários:
Enviar um comentário