Mário Martins
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“O passado é um país estrangeiro: lá faziam-se as coisas de forma diferente”
In “The Go-Between”, de Leslie Poles Hartley (1953)
“A geração mais nova não viu o antes, nem o durante, nem o imediatamente após o 25 de Abril. Aos 50 anos, é altura de libertá-lo do Estado Novo e amarrá-lo ao futuro.”
“Os últimos portugueses iguais a nós”
José Tavares, Revista do Expresso, 21Abr2023
Não é apenas, nem principalmente, porque lá se faziam as coisas de forma diferente que o passado é um país estrangeiro, mas porque havia, em cada uma das épocas que o compõem, um espírito do tempo decisivamente influenciador das emoções individuais e colectivas, do modo de pensar e do comportamento dos nossos antepassados.
Esta é uma grande dificuldade com que se depara a transmissão histórica do passado aos vindouros: se os acontecimentos reais, conforme a escolha que for feita (como se tratasse do alinhamento de um noticiário), podem ser descritos, e com eles as suas causas e efeitos (diferentes, quando não opostos, conforme o método axiomático da sua interpretação), é praticamente impossível transmitir as emoções do vivido.
Este é, notoriamente, o caso do 25 de Abril de há quase 50 anos. Quem o viveu recorda-se como ele foi emocionalmente intenso, mas como diz o articulista, “a geração mais nova não viveu (viu) o antes, nem o durante, nem o imediatamente depois”, pelo que, em geral, terá com ele, no máximo, uma relação aprendida no seio familiar, no banco da escola, no acaso das amizades, ou num partido abrilista. Tal como, aliás, as gerações que o viveram tiveram com a implantação da República, ocorrida 64 anos antes: uma relação praticamente instrumental, traduzida numa romagem anual ao cemitério dos mais militantes, onde se produziam discursos contra a ditadura e a favor da liberdade.
O pior é que “o desaparecimento da geração de Abril será significativo e chega na esteira de um progressivo sentimento de cansaço, estagnação, até de tédio cívico. Por outro lado, a geração de portugueses que se perfila pode trazer à arena cívica nacional novidades significativas. Ou seja, podemos estar hoje na presença dos últimos portugueses iguais a nós.”
“A geração que se afirmou no 25 de Abril resiste a aceitar que o tempo passa e o mundo muda. Resiste a receber a mensagem das grandes transformações que nos trarão os seus e os nossos filhos e netos.”
“Falta um ano para os 50 anos de Abril. Vem aí um Portugal diferente, fruto da passagem do tempo e do inexorável advento das novas gerações. Saibamos falar sobre esse Portugal futuro o suficiente para fazer dele também um Portugal melhor (…)”, conclui e espera o colunista.
Nós também.
PS: O autor abre o seu artigo com a frase: “O passado é um país estrangeiro. O futuro também.” Apesar de tudo, porém, o passado deixa marcas e testemunhos reais, o passado aconteceu. Mas o que dizer do futuro, essa categoria temporal e incorpórea que ainda não aconteceu, senão que é ainda mais estranho do que o passado? Podemos fazer previsões, sujeitas a erro, como faz a ciência meteorológica, ou projectá-lo seguindo as tendências do presente, que podem ou não concretizarem-se, mas o futuro será sempre, por definição, uma caixa de surpresas.
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