Mário Martins
Distribuição das maiores religiões pelo mundo (Wikipédia - 2008) |
Chegamos
ao fim desta já longa viagem por alguns dos aspectos que me pareceram definidores
da doutrina e das linhas de fronteira das grandes religiões do mundo. Não
abordei, evidentemente, todas as religiões mas isso, tão-só, por seguir um
critério quantitativo de seguidores2, ainda que certamente grosseiro, e não, de
modo nenhum, de menor respeito pelas religiões não visitadas. Como ressalvei no
início, o objectivo não foi avaliar a prática do facto religioso; fosse essa a
finalidade da viagem e muito do seu encanto se perderia; bastaria, de facto,
avaliar a condição da mulher sob as diferentes abóbadas celestes para se
compreender que o seu estatuto de inferioridade está muito longe de ser uma
marca distintiva do Islão, como parece julgar-se a Ocidente.
No
decurso desta viagem pude compreender que há mais (e grande e diferente)
religião para lá do Cristianismo e do Islão, omnipresentes a Oeste, e que “pouco sentido tem contrapor religiões ditas
universais a outras que o não seriam, (já que) toda a religião se pretende
universal na medida em que propõe uma visão global e coerente do universo e
atribui aos seus fiéis, sejam eles membros de uma tribo obscura ou altos
prelados de uma hierarquia constituída, um lugar significativo no todo cósmico”.3
O que quer dizer, sem eufemismos, que não só não são universais como nos
poderemos interrogar se poderiam alguma vez sê-lo, marcando elas como marcam as
diferentes culturas e civilizações. Talvez que num futuro mais ou menos
distante, com a crescente mundialização da vida dos seres humanos, se possa afirmar
a religião cósmica de que falava Einstein.
O
que se passa é que, tal como acontece com a psicologia individual, as partes da
humanidade que seguem cada grande religião não vêem o mundo real nem o mistério
da existência da mesma maneira, apesar de, mais ou menos inconscientemente, cada
parte assumir que a sua visão, além de verdadeira, é ou devia ser universal. Em
suma, sendo as religiões culturais, nenhuma poderá ser verdadeiramente
universal sem que, em conexão com ela, se afirme e predomine uma supra cultura planetária
decorrente da facilidade das comunicações e da interdependência da economia e
assente numa visão de igualdade natural da humanidade.
O
que é universal (na medida em que é sentido por todos) é o mistério da
existência ou da realidade. É esse mistério (por que existe a Natureza em vez
de nada? qual a origem e o sentido daquilo a que chamamos leis da Natureza?), a
par da angústia do sofrimento e da morte, que explica, aliás, a força e a
sobrevivência de religiões que, para além de inegáveis virtualidades, tão
dolorosamente marcam a história humana.
Devo
reconhecer que para mim (civilizado judaico-cristão que sou…) foi motivo de
espanto aprender que é muito complicado, se não mesmo impossível, equiparar o
Deus das três religiões do Livro (Judaísmo, Cristianismo e Islão, admitindo, de
passagem, que Deus e Alá significam o mesmo…) ao Absoluto dos hindus e, ainda
mais, descobrir que para budistas, tauistas e xintoístas, não há Deus; donde
não se poder falar com propriedade, como apressadamente fiz na breve introdução
ao primeiro texto, de “um mundo aparentemente unido pela crença, quase
universal, num Deus único”; se há um denominador comum entre as grandes
religiões, esse será a sublimação do sofrimento e da morte e o culto dos
antepassados, e não Deus.
Como
já escrevi nestas páginas, “a representação milenar do mistério da existência e
da sublimação da morte pela(s) Igreja(s), com os seus mitos e rituais, a
organização da religião em suma, marca e demarca civilizações e culturas, é uma
das mais ricas fontes das artes, e constitui um poderoso lenitivo psicológico e
um sólido cimento de ligação social”. A importância, por exemplo, dos templos
religiosos espalhados pelo mundo está muito para lá do seu valor artístico ou
do poder e interesse das hierarquias organizadas que abrigam; eles constituem,
com efeito, uma espécie de sinais amarelos no trânsito quotidiano de todos os
seres humanos, sejam ou não seguidores de uma religião; fazendo a ponte com o
mistério da existência, são uma permanente e indispensável chamada de atenção
de que vivemos sob condição.
As
diferentes e entre si contraditórias respostas das grandes religiões aos temas
metafísicos assentam no mito e na alegoria e, por isso, os seus representantes
as podem apresentar como certas, embora o façam, com o ar mais sério deste
mundo, como se fossem verdades históricas ou assentes na prova, pretendendo
mesmo, aqui e ali (misturando arbitrariamente o plano do mistério da realidade
com o plano da sua medição) equiparar a religião à ciência, assim objectivamente
induzindo as massas de fieis a confundirem o conhecimento que em cada época os
seres humanos podem ter da realidade com o que é apenas mito e símbolo.
O
pasmo humano pela grandeza do cosmos, pela inteligência superior que supõe,
pela sua beleza, é mais do que justificado; a meu ver, porém, a perfeição do
mundo acaba aí, na complexidade elegante de uma equação matemática ou na beleza
de um poente, de uma coisa ou de alguns sentimentos humanos; o resto é
sofrimento incompreensível e angústia inquietante. Precisamente porque só com
um olhar técnico podemos achar a Natureza perfeita é que o fenómeno religioso
da fé é fundamental para idealizar o seu “carácter” e assim justificar a adoração
do que é, com o toque da graça, agora divino. Bem poderíamos concluir que o papel
central da religião é, afinal, o de minorar o sofrimento e a angústia das
crianças que nunca deixamos de ser: parafraseando Anthony Kenny 4, se a ciência dá conhecimento e a filosofia
compreensão, a religião, acrescento eu, consola.
1 Este mapa
deve ser entendido como um indicador da distribuição geográfica das maiores
religiões, e não como se cada região do mundo fosse monocolor em termos
religiosos.
2 Exceptuando
o Judaísmo, por ser o berço da religião oficialmente maioritária do mundo, o
Cristianismo.
3 Paul
Demiéville, citado por Jean-Noël Robert, in “As Grandes Religiões do Mundo”.
4 in “A História da Filosofia
Ocidental”.
Nota final:
Esta viagem pelo mundo religioso seguiu o itinerário dessa grande obra que é
“As Grandes Religiões do Mundo”, citada em todos os textos. Optei por
transcrever as partes da obra que me pareceram mais definidoras de cada grande
religião, em vez de disfarçar a minha ignorância especializada. Ao fazê-lo, sem
nenhum intuito comercial (sublinhe-se), espero ter dado a publicidade devida a
uma obra que, sem dúvida, merece ser lida e estudada.
1 comentário:
Todo o islam é inválido.
No início maomé nem corão tinha ou pedia mas já queria o poder todo, como o de matar cruelmente pessoas justas inocentes e indefesas(33:61)
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