Mário Martins
“Uma revoada de novas questões emerge de cada problema que eles (os cientistas) resolvem. Qualquer que seja a inspiração, ela nasce de um contínuo “não sei”. (…) Por isso valorizo tanto a curta frase “não sei”. É pequena, mas voa com asas poderosas. (…) Torturadores, ditadores, fanáticos e demagogos de todos os tipos (…) “sabem”. Eles sabem, e tudo o que sabem é suficiente para eles de uma vez por todas. Eles não querem saber de mais nada, por isso pode diminuir a força dos seus argumentos. E qualquer conhecimento que não conduza a novas perguntas rapidamente desaparece.”
Wislawa Szymborska, Nobel da literatura
A ciência quer-se útil, de aplicação imediatista, ou, como defende a investigadora Joana Gonçalves de Sá, no seu excelente ensaio “Uma Ideia de Ciência”, a investigação aplicada não deve desincentivar a investigação pura ou fundamental?
Apropriadamente, a autora cita a crítica que o matemático Carl Gustav Jacobi fez à opinião do igualmente matemático (Joseph) Fourier, “de que o objectivo principal da matemática era a utilidade pública e a explicação dos fenómenos naturais; (quando) um filósofo como ele deveria saber que o único fim da ciência é a honra da mente humana e que, sob este propósito, uma questão sobre números vale tanto quanto uma questão sobre o sistema do mundo.”
O que não impede, como refere a autora, que o trabalho em matemática pura de Alan Turing tenha sido crucial para quebrar os códigos nazis.
Ou que a World Wide Web tenha sido criada no CERN (Organização europeia que investiga a física das partículas elementares), para resolver um problema logístico dos investigadores, mas que acabou por mudar o mundo para sempre.
Ou ainda, nas palavras da autora, a descoberta da estrutura da dupla hélice do ADN, que abriu portas à genética molecular e à medicina personalizada; os princípios da mecânica quântica, que abriram a porta a lasers e transístores; ou a teoria da relatividade geral, cujas aplicações usamos todos os dias através do GPS.
A investigadora dedica um capítulo ao “futuro agora”, não sem antes citar o aforismo atribuído ao físico Niels Bohr, segundo o qual é muito difícil fazer previsões, principalmente quando estas são sobre o futuro. E, como não podia deixar de abordar um tema que está na berlinda, foca-se na Inteligência Artificial.
Numa visão “não alarmista”, a Inteligência Artificial, na medida em que é uma criação humana, não passaria de mais uma ferramenta computacional, revolucionária sem dúvida, mas com funcionamento definido pelas regras de programação. Contudo, talvez esta seja uma ideia ingénua, própria de um leigo como eu.
A autora é, todavia, mais cautelosa, pois admite que ela (a IA) passe a ser geral, “ou seja, capaz de resolver muitos problemas diferentes, oferecer soluções criativas e talvez até desenvolver consciência, potencialmente substituindo ou, quem sabe, voltando-se contra a humanidade.” Sublinha, no entanto, que “ninguém pode determinar com certeza quão próximos estamos ou qual a probabilidade de isso acontecer.”
Enfim, tal como Arthur C. Clark manifestou, esperemos que conservemos sempre a faculdade de desligar a ficha quando quisermos.
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