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01/04/25

POESIA

Helena Serôdio


 

INTERMEZZO

 

Rasgou-se o ventre da noite
E nasceram catadupas de astros!
Magnífica,
Resplendente qual jóia preciosa ,
A lua brilhou entre os seios da noite, alvos como dunas!
A noite era uma planície imensa, orvalhada de estrelas,
Branca de luar e de mistério,
Povoada de visões fantasmagóricas!
O seu corpo virginal,
Intocável,
Envolto em ténues neblinas.
Era um vasto oceano
Interrompido por ilhas desertas,
E cada um dos seus órgãos
Era um mundo independente,
Animado de vida própria ,
Girando em volta de si mesmo!

A noite descerrou as pálpebras,
Sacudiu a longa cabeleira
E despertou para mais uma vigília.

Refugio-me nos braços da noite,
Estreito-a longamente ao peito,
E abraço o vazio e a solidão.
Afago-lhe a face pálida a
Reflectir o espasmo da insónia.

Vejo-me no espelho dos seus olhos
Calmos como plácidos lagos,
Em que a indiferença flutua,
Beijo-lhe a boca gélida,
Muda,
E nela se desprendem, num esgar,
O desdém e a ironia!

Debruço-me na noite fria
Como numa ponte de cristal
Suspensa nas alturas!
Atrai-me a vertigem do abismo
Em que o corpo se lança para dormir sono eterno.
E o espírito paira, enfim, liberto!

Aspiro o perfume da noite,
Inebria-me o prazer do ignoto...

A noite é um cemitério de paz,
Onde jazem sepultados os meus sonhos,
As minhas aspirações,
A intimidade do meu ser...

Siderada nos espaços,
Isenta,
Inviolável,
A alma da noite é uma flor solitária,
Aberta para o silêncio
Em que a minha vida se debate...

Impudica,
A noite revelou-me generosamente a sua nudez.
E eu vi-me nua dentro da noite!...

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