António Mesquita
"I describe these warriors in "Jihad vs. McWorld" as people who detest modernity—the secular, scientific, rational, and commercial civilization created by the Enlightenment as it is defined by both its virtues (freedom, democracy, tolerance, and diversity) and its vices (inequality, hegemony, cultural imperialism, and materialism). What can these enemies of the modern do but seek to recover the dead past by annihilating the living present?"
(Benjamin Barber)
As mesmas pessoas que querem uma "America great again", seguem as intimações do medo do estrangeiro, do medo do 'queer' e do niilismo cultural que as tem nutrido desde que nasceram.
O Novo Mundo foi criado por imigrantes e escravos, tendo sido admirado como a "terra das oportunidades".
Continua a ser a primeira potência, mas o seu sistema político está ferido de morte. Durante quanto tempo pareceu não haver alternativa aos dois caturras que disputavam a liderança, sem alternativas?
O homem do boné vermelho foi alvejado há dias e apareceu no Congresso do seu partido com uma gaze na orelha. Ocorre-me agora que um pintor famoso infligiu esse ferimento a si próprio, alegadamente devido a um distúrbio mental (o que não o impediu - ou facilitou? - de nos deixar "A noite estrelada").
O incitamente ao ódio e as descaradas mentiras de Trump não o tornaram, de certa maneira, o dedo que accionou a AR-15 de Thomas Crooks?
A desfaçatez do milionário é tão certeira no cérebro dos desiludidos do "sonho americano", sendo, como ele próprio diz, tudo aquilo de que é acusado não mais do que "um ataque do 'Deep State' aos esquecidos, homens e mulheres, árduos trabalhadores deste país", a quem pede, na oportunidade, donativos para a sua campanha (The Guardian 11/06/2023) que parece o algoritmo da suprema demagogia.
O Novo Mundo sempre nos surpreendeu. Revolucionou a música, com os ritmos da ancestralidade negra - os blues de Tom Waits e Crystal Gale que acabo de revisitar no comentário do filme de Coppola de 1981 ("One from the heart"), os costumes (depois da Revolução Francesa, o que é que se lhe pode comparar?), enfim, o Salto dos Saltos que foi o grande abalo da tecnologia e da ciência pós-quântica. A Europa, claro, ajudou imenso com a emigração dos cérebros mais eminentes por causa da guerra.
Com tudo isto, a América também abriu o odre dos mais furiosos ventos com o mercado global e a desregulação que melhor serve os interesses da sua minoria privilegiada. Nas palavras de Guterres, Gaza não nasceu do nada, pois também Musk, Bezzos e os seus pares não nasceram do nada. O que, mais do que a obsolescência da sua política, anuncia o inevitável declínio, é que o mundo se tornou pequeno para as tácticas de externalização dos custos em que o "capitalismo feudal" (Varoufakis) se viciou. Há que redistribuir para conter a ameaça crescente dos "bárbaros" do Sul e do Leste. Mas o tempo até isso torna problemático porque o planeta não está pelos ajustes.
Restam-nos os paraísos. Las Vegas, no estado de Nevada, está cercada pelo deserto de Mojave. Coppolia filmou-a no estúdio Zoetrope (que levou à falência), com outra noite estrelada e a beleza de Nastassja Kinski no arame ou numa taça de cocktail.
Babilónia podia ser o nome dessa quermesse de néons e salas de jogo. O casino como epítome da vida e a dança ininterrupta com a luz artificial e o álcool a prolongarem a semi-vigília. A personagem de Garr que tem uma agência de viagens quer escapar-se para Bora Bora: uma ilha com palmeiras, areia imaculada e céu azul. Discute com Hank porque ele tem outro sonho, de proprietário, este. Separam-se com mais essa "gota de água" e ele zarpa com a rapariga do circo e ela veste o vermelho mais berrante como o boné do outro, para se entregar a um Valentino de trazer por casa.
Ele acorda desse sonho sem futuro e ajoelha na manga do aeroporto para que ela volte. Como a confirmar que tudo naquela cidade só pode ser cenário, a mulher de vermelho volta e o beijo final parece o de "Casablanca" no espelho das citações. Para nos tirar de dúvidas, o genérico do filme aparece depois da cortina de teatro se fechar.
É este acordar que nos espera, no melhor dos casos.
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