Mário Martins
O paradoxo é evidente: sabemos que o planeta que habitamos e o sistema solar de que faz parte, não representam, se tanto, mais do que grãos de areia no vasto cosmos (estima-se que só a nossa galáxia contenha mais de 100.000 milhões de estrelas), e no entanto, tudo só adquire significado na nossa mente; fora dela é como se a realidade não existisse, situação que, perturbadoramente, corresponde, aliás, à quase totalidade da idade do universo, seja ela, ou não, a calculada pela maioria dos cientistas (14.000 milhões de anos), já que o homem primitivo só surgiu há 1 ou 2 milhões de anos e o homem moderno há uns meros 160.000 anos.
Não se trata,
aqui, de negar a realidade exterior ao Homem (que a fértil imaginação humana, embora
sem provas e contra a percepção sensorial, é, no entanto, livre de conceber),
mas de reconhecer que sem a observação humana, tudo perde sentido e não se distingue
do nada conceptual. Falamos do homem-espécie abstracto, mas deveríamos, antes,
falar do homem-indivíduo concreto: quando uma pessoa perde, provisória ou
definitivamente, a consciência inteligente, ou, simplesmente, esta entra em
modo de espera, como no sono, a realidade como que desaparece.
É certo que existe a
probabilidade (mas não a certeza) de, mais cedo ou mais tarde, virmos a
descobrir (ou a ser descobertos) habitantes inteligentes de outros mundos, com
quem, na melhor das hipóteses, poderemos trocar conhecimentos e experiências. Essa
probabilidade assenta, basicamente (para lá do fenómeno Ovni, não reconhecido
pela ciência), na ilógica de estarmos sozinhos na espantosa grandeza cósmica, para
mais dada a sucessiva descoberta, nas últimas três décadas, dos chamados
exoplanetas, que integram outros sistemas estelares. Mas precisamente por
orbitarem outras estrelas, à distância de
anos-luz, tornará praticamente impossível uma conversa útil com
hipotéticos alienígenas, no caso, evidentemente, de não se descobrir maneira de
rodear a ditadura do limite da velocidade da luz. Suponhamos, para exemplificar
o lado prático do problema, que descobríamos seres inteligentes no sistema da
estrela mais próxima, apropriadamente chamada “Próxima Centauri”, que fica a pouco
mais de uns “escassos” 4 anos- luz de distância: dizíamos um olá!, decerto em
formulação matemática, para início de conversa, e depois ficávamos 8 anos (4
para lá e outros 4 para cá) à espera da resposta, que poderia ser mais ou menos
agradável se, é claro, compreendessem a mensagem e estivessem dispostos a
aturar-nos…Mas se a comunicação com extraterrestres residentes no sistema “Centauri”
seria complicada, o que dizer se morassem no sistema da estrela “Ícaro”, a
estrela mais longínqua que o telescópio espacial “Hubble” conseguiu observar,
situada a mais de 9.000 milhões de anos-luz da Terra?...
Contudo, a eventual descoberta de
uma ou mais civilizações planetárias espalhadas pelo universo (sem desvalorizar
a suma importância de um tal acontecimento, cujos efeitos, aliás, se afiguram
de muito difícil, se não impossível, antecipação), não altera o papel central
da observação inteligente da realidade, apenas retirando ao Homem o exclusivo
da função.
Mas no caso, não descartável, de
um dia, chegarmos à conclusão (admitindo que tal seja possível, embora não se
veja como, com os conhecimentos actuais) de que estamos mesmo sozinhos,
conclusão que, sem dúvida, tornaria ainda mais estranho este estranho mundo,
pesará então, como nunca, nos ombros do Homem, não só a angústia e o desamparo
da solidão existencial, mas também a responsabilidade de ser o único centro
interpretativo do cosmos.
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