Marques da Silva
Vista do Porto |
Creio que todos, não diria sem excepção, gostam de forma especial da cidade onde nasceram. Se também essa foi a cidade onde cresceram esse prazer de gostar eleva-se ainda mais numa escala que quase sempre fica inesquecível. Por estas e outras razões, o Porto quedou-se para sempre no meu olhar, nos sentimentos mais íntimos, nas mágoas e alegrias que se escondem no interior de nós próprios, num recanto da alma. O Porto, por uma consequência do nome, arrasta consigo um conjunto de emoções, pois pode ser para uns, um porto de abrigo, para outros, um porto de destino, para todos um porto de história, um porto sentido, um porto amigo, um porto antigo, um porto de chegada. Mas para os que nele nasceram nunca será um porto de partida, porque do Porto não se sai, apenas se viaja. E este Porto que não se vê mas tanto se sente, tem sido para mim, tudo isso, à vez e ao mesmo tempo, nessa grandeza sentimental que a alma não consegue exprimir em toda a sua plenitude. Sente-se mas não se vê. Quando vimos do Norte e nos aproximamos por entre o verde minhoto, sentimos que a cidade está próxima, sentimo-lo na paisagem, nas pessoas, no aroma que emana da cultura que nos rodeia. Vindos do Sul, pressentimo-lo mais pelas placas indicadoras pela mudança das cores, pelo casario, mas a mudança é mais rápida. Nestes pormenores percebemos que nos aproximamos do Porto de destino. “Quem vem e atravessa o rio, junto à Serra do Pilar”, já só o pode fazer a pé ou em transporte público, mas a magia que penetra no olhar é a mesma de sempre, o casario em socalcos, as cores ocres das paredes que brilham esculpidas pelo sol matutino, as suas ruas de traçado medieval, a toponímia a lembrar tempos de comércio e riqueza, as suas escadarias com recantos de encanto e fantasia, que não se descrevem, apenas se podem absorver com o olhar e as gentes que restam com essa singularidade que se vai esvaindo na medida em que, expulsos, vão para os arredores. Este é o Porto antigo. Mas do Sul, podemos atravessar a Leste na elegância de uma ponte larga que se ergue num arco quase imperceptível e mergulha na desamparada e sempre esquecida Campanhã, lugar de indústrias que morreram, de comboios que se foram esvaindo na desastrosa ideia de estarem ultrapassados. A estrada faz um desenho belo e ergue-se na tentativa de alcançar a Casa de Bonjóia, brilhante no seu restauro e cercada pelos seus jardins desenhados para que o olhar repouse na acalmia das tardes com o rio ao fundo; o jardim da Corujeira, olvidado, mas protegido pela grandeza das suas árvores. Mas se escolhemos a entrada Oeste, o choque é maior, acontece de um momento para outro. Sem que os sentimentos dêem conta, estamos em cima da ponte, no seu arco majestoso e belíssimo e não sabemos para que lado olhar, para a direita, encontramos o passado, os séculos, a pedra granítica, as muralhas que protegeram a cidade, o espaço do cerco do absolutismo que morria, a resistência, a liberdade, é o Porto de história. À esquerda, encontramos o infinito, o lugar onde a terra se mistura com o céu em bebedeiras de azul. Por ali passaram as caravelas, por ali partiam e chegavam as mercadorias que enriqueceram a cidade, ali navegam os sonhos dos que não se conformam. É tudo tão rápido, de emoções tão fortes que é tardiamente que descobrimos à nossa frente, escondido entre árvores e arbustos o jardim de Sophia, o espaço botânico, um recanto de beleza e recolhimento (1) . Este é o Porto de chegada que nos recebe e nos acolhe. Mas a cidade que já foi de nevoeiros, de cinzentos sombrios e tristes, de caminhos de melancolia, e hoje brilha debaixo de um sol que raramente a aquecia, não perdeu totalmente os lugares onde nos podemos recolher em reflexão vagarosa, seja nos caminhos do romântico, os da Arrábida, em cujo alto podemos deslumbrar-nos com os poentes de chama ardente, ou os de Campanhã, com as suas quintas de uma nobreza tardia, já aburguesada e endinheirada, com os braços das buganvílias e dos fetos, estendendo-se pelos muros altos que escondem as suas casas e jardins, seja os de Ramalde com os seus Abraços pelo meio de campos de agricultura que já não se faz, seja ainda pelas ruas estreitas, calmas, plenas de serenidade de uma Foz dita velha. Este é ao mesmo tempo, um Porto de abrigo e um Porto sentido. Se nos afastarmos, se subirmos à cidade mais elevada e nos dirigimos a Paranhos, ainda encontramos o monte da Lapa, um outeiro esquecido, um aglomerado de casas em redor da colina, uma cascata sanjoanina de gentes tão portuenses, e no pico emblemático, o ponto de observação dos liberais do cerco, de onde partiam os pombos-correios com as suas mensagens. Já nos limites dessa estrada que limitou o crescimento da cidade, de Paranhos a Aldoar, passando por Ramalde, os bairros dos que trabalham, os marginalizados pelo poder, os blocos onde moram os que descenderam dos que das ilhas vieram, não daquelas que o mar rodeia, mas das outras, as das casas pequenas, onde habitava a solidariedade, o sentimento de pertença colectiva, os que morriam pela pátria, essa pátria que tanto lhes tira. O Porto é ainda uma cidade que se passeia. É necessário percorrê-la, caminhar sobre as suas vetustas calçadas, abrir a alma para acolher os sentimentos que nos aparecem a cada esquina, em cada rua, nas ilhas que ainda restam, no passado que se recusa a ser extinto na velocidade do tempo presente, deixar-nos levar pelos aromas, pelos pormenores, pelo que não se vê mas que emerge do falar, da cultura, dos costumes. Só então, percebemos o que é único nesta cidade que a todos recebe com os braços abertos. Pode ter acabado o cimbalino, mas para os seus habitantes permanecem válidas as palavras de Garrett gravadas no mármore do tempo: «os portuenses podem trocar o «v» pelo «b», mas não trocam a liberdade pela servidão».
(1) “O Jardim Botânico do Porto – Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto (MHNC-UP) é um dos três espaços verdes do Porto que acabam de ser distinguidos com o Green Flag Award, um prémio internacional atribuído anualmente pela Organização Não Governamental Keep Britain Tidy, sob a égide do Ministério da Habitação, Comunidades e Governo Local do Reino Unido, com o objetivo de reconhecer a boa gestão de parques e jardins em todo o mundo.”
A Companhia de Seguros belga, AGEAS, cujos dirigentes se gabam de possuir centenas de milhões de euros para comprar outra seguradora e que regista lucros próximo dos 100 milhões de euros, está num processo de despedimento colectivo de 90 dos seus trabalhadores sediados na cidade do Porto. É o esplendor do capitalismo financeiro que utiliza a democracia, que assiste impávida e serena, para o enriquecimento especulativo de uns poucos, com a estratégia de externalizar serviços, para melhor poder explorar o medo a incerteza e mais dividendos colher do pagamento de baixos salários e trabalho precário, utilizando a divisa do Pingo Doce, «Sabe bem, pagar tão pouco».
O Donald Trump disse que só não acaba com a guerra no Afeganistão numa semana porque não quer matar 10 milhões de pessoas. Como se estima que este país tem 32 milhões de habitantes, podemos até admitir que com um esforço de três semanas, acabava não só com a guerra, como com o próprio Afeganistão. Trump e os que o rodeiam, tornaram os EUA numa ante-sala de um pavilhão de loucura.
A legislatura chegou ao fim com a solução governativa apoiada pela maioria encontrada no Parlamento. Os temores inventados pela Direita, ficaram escondidos na sombra dos seus interesses maliciosos. Ficou evidente que é possível a Esquerda encontrar um caminho comum que salvaguarde o interesse da maioria dos portugueses e que a Direita não tem outro programa que não seja a destruição dos avanços sociais e o favorecimento do interesse de uma minoria, predatória e avarenta. Ao sentir que pode ficar afastada do poder por um largo período de tempo, assesta as baterias na ideia de que tudo ficou num caos, na tentativa de, obtendo o PS, uma maioria simples, o possa arrastar de novo para o seu seio. Os jornais e as televisões, com os seus empregados subservientes já desataram a construir um castelo de maldades que teriam ocorrido nos últimos 4 anos. Até o Alexandre do Pingo Doce veio dizer que, “com esta conjuntura, qualquer governo fazia o que este fez”, esquecendo qual era o programa da Direita apresentado às eleições de 2015. Há interesses que conseguem sobreviver, seja com fascismos, seja com democracias, a questão está apenas em saber colocar os seus serviçais no aparelho das instituições estatais. Há meses atrás, um canal documentarista passou uma reportagem, creio que de um bairro de Londres, no qual uma senhora dizia, «O Boris vem cá muitas vezes. É boa pessoa e gosto de falar com ele, mas acho que deveriam escolher alguém mais adulto para Ministro dos Negócios Estrangeiros»! Ouviram-na e puseram-no a primeiro-ministro!
A hierarquia militar diz que as Forças Armadas têm necessidade de mais 6000 militares, caso contrário ficam em causa as diversas missões em que estão empenhadas! Quais? A de complemento da Protecção Civil? As de protecção do país? Não. As missões que estão em causa são as de defesa de interesses imperiais estranhos a Portugal, no Mali, na República Centro Africana, no Kosovo, no Afeganistão, nas fronteiras da Rússia. Um país sem dinheiro para o SNS, para a Educação para os Transportes, tem as FA a querer dinheiro para as guerras dos outros!
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