Mário Martins
http://expresso.sapo.pt/Capaso
Diz-se que a vida é o presente e de facto, em rigor, nada aconteceu no passado mas sim no presente que passou (e que ficou ou não na nossa memória individual e colectiva), tal como nada acontecerá no futuro mas sim no presente que há-de suceder. O que poderá parecer um simples jogo de palavras traduz, no entanto, as nossas dificuldades em reconstituir fielmente o passado ou em predizer o futuro. Mas apesar de o futuro não poder ser mais do que uma probabilidade de acontecimentos ou uma espécie de nuvem depositária de esperanças e temores mais ou menos indefinidos, ele ocupa boa parte das nossas cabeças. Se no quotidiano dedicamos uma permanente atenção e de algum modo antecipamos as sensações, boas ou más, do que vamos fazer logo ou mais tarde, no plano colectivo os analistas esforçam-se por prever “o que aí vem”.
É com este sugestivo título que o último número do ano findo da revista do semanário Expresso se abalança a prever o futuro. Ricardo Costa, numa abordagem política aparentemente bem armada, profecia: “Eis o resumo do futuro do mundo: terrorismo, crise dos refugiados, ressurgimento da xenofobia, proteccionismo comercial, aparente escalada nuclear e implosão dos sistemas partidários. E algo de bom? Sim, claro. Vamos (os portugueses) estar longe de tudo isto. Como sempre estivemos.”. E Daniel Oliveira, num artigo mais estrutural intitulado “O admirável mundo sem emprego”, alerta: “O medo de um mundo sem trabalho é tão antigo como a tecnologia. Só que estamos perante uma alteração sem paralelo na História. Pela rapidez e pela capacidade de as máquinas garantirem o seu próprio desenvolvimento, dispensando-nos de quase tudo”. Para o analista, o modelo de negócio da indústria registará, nos próximos quatro anos, o impacto da robótica, dos transportes autónomos, da inteligência artificial, dos materiais avançados, da biotecnologia.
A previsão de Ricardo Costa estaria logicamente certa se visasse, especificamente, o lado negro do futuro do mundo (admitindo, sem discutir, que o proteccionismo comercial e a implosão dos actuais sistemas partidários sejam ocorrências negativas), mas assim como a lua não tem só um lado “escuro”, não é expectável que o mundo de amanhã não tenha também um lado brilhante.
Já a antevisão de um mundo em que o trabalho é, por saltos evolutivos cada vez mais rápidos, desempenhado por máquinas, parece bastante plausível, face à realidade actual e, sobretudo, aos anunciados desenvolvimentos da robótica e da inteligência artificial. Verdadeiramente ninguém sabe o que aí vem e, muito menos, as dramáticas implicações da conversão do trabalho em lazer, para a qual nem sequer conceptualmente estamos preparados. Sem referencial no passado a que nos agarrarmos, resta-nos ter esperança na formidável capacidade de adaptação humana.
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