Em Julho de 1965, com dezanove anos, comecei a trabalhar pela primeira vez, na Mutual, uma pequena companhia de seguros que estava em crescimento, em virtude de ter deixado de explorar unicamente o ramo de acidentes de trabalho e passar e explorar a maior parte dos ramos reais.
Naquela época já empregava bastantes mulheres e jovens. A maior parte das jovens trabalhavam na secção de dactilografia, onde era executada toda a correspondência da companhia, minutada nas respectivas secções. Os rapazes, muitos jovens, doze, treze, catorze, quinze anos, a maior parte, trabalhavam como paquetes nas secções, no arquivo, no posto de drogas. Começavam a tarimbar para aprenderem as regras e os segredos da profissão.
Os homens estavam praticamente proibidos de entrarem na secção de correspondência que era chefiada, com todo o rigor, por uma senhora, muito experiente e muito competente.
Algumas senhoras desempenhavam funções de muita responsabilidade, no atendimento a sinistrados de acidentes de trabalho, no controlo do atendimento médico e hospitalar e nos respectivos pagamentos. Outras trabalhavam nas máquinas de contabilidade e de processamentos diversos.
Depois de ter iniciado a minha actividade na secção técnica, onde se faziam estatísticas dos movimentos da empresa, passei para a secção de contencioso. Tive como chefe um colega já com alguma idade, com filhos da minha idade, que já trabalhavam numa outra seguradora.
Era uma pessoa simpática, educada, mas com algumas dificuldades de comunicação, pois tinha sempre à perna o director, aliás, o único director da empresa, que diariamente se apresentava na secção para saber o andamento dos serviços. Era um profundo estudioso do charadismo, sobre o qual eu nunca tinha ouvido falar. Uma vez, quando conversou comigo sobre o charadismo, divulgando-o, as suas expressões alteraram-se, era um homem feliz.
Quando se entrava numa nova secção, o novo colega era apresentado aos demais e tomava conhecimento das tarefas de cada um. Aconteceu-me quando entrei na secção de Contencioso.
Conheci, assim, uma colega que me explicou simpaticamente o trabalho que fazia. Passados poucos dias precisei de saber algo sobre o seu trabalho, mas já não a vi na secção nem na companhia, há uns dias. Perguntei ao chefe sobre a colega, que me respondeu duma forma muito vaga que certamente não vinha tão cedo. No próprio dia, vim a saber, quase em segredo, que a colega tinha sido presa pela PIDE. Ao tentar saber mais pormenores, falando com diversos colegas, descobri que a maior parte sabia da prisão da colega.
Foi assim que conheci a Maria José Ribeiro, filha de Joaquim Ribeiro, que participou na Revolta dos Marinheiros em 1936, preso no Tarrafal durante 16 anos e que eu, nessa altura, só conhecia de nome, mas que, muito mais tarde, vim a conhecer pessoalmente.
Com o seu regresso ao trabalho, fomos companheiros de muitas lutas nas mais diversas actividades, até ao presente, sempre com independência de pensamento, com lealdade e com Amizade.
A Maria José Ribeiro fez 80 anos no passado dia 12 de Janeiro. Um grupo de Amigos fez questão de os festejar, convidando outros Amigos, representantes de instituições com quem trabalhou, conviveu e lutou social e politicamente ao longo da sua vida.
Mais de cem pessoas estiveram presentes num são convívio, na Casa da Beira Alta, no Porto, com música tocada por Manuel João e Gomes da Silva, com poesia dita por Carmen, Ilda Marques e Rui Vaz Pinto, com intervenções de Teresa Lopes, em representação do PCP, Paulo Mourato, em representação do SINAPSA, Maria Vila Verde Cabral , em representação da União de Resistentes Antifascistas Portugueses, de Márcia Oliveira, em representação do Movimento Democrático das Mulheres e de Ilda Figueiredo, em representação do Conselho Português para a Paz e Cooperação. Celestina Gomes, em nome da URAP, homenageou a Maria José Ribeiro entregando-lhe um livro que transcreve uma entrevista que lhe efectuou em 18 de Janeiro de 2008, onde conta grande parte da sua vida. Em nomes de todos os presentes foi entregue à Maria José uma pequena peça de porcelana com um desenho de José Rodrigues.
A Maria José expressou as suas emoções, alegrias e agradecimentos a tanta gente presente e a tanta gente que lhe enviou mensagens, algumas de grande calor.
No final foi servido um Porto de Honra e uma fatia de bolo de aniversário.
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