01/05/10
CONFORMISMO E BOM SENSO
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DIVAGAÇÕES
Sentiu-o nessa manhã, com essas diferenças que nos traz o vento. Chegou-lhe como um cântico, por entre os flocos de neve, serpenteando por entre a floresta de bétulas. Num primeiro instante acreditou que eram apenas os olhos amendoados de Elena, porque no olhar das mulheres viajam todos os sonhos do mundo, e aquele era o maior de todos os sonhos, mas o som que lhe chegava era apenas um rumor, só horas mais tarde, os tambores haveriam de fazer soar o seu rufo como um grito, solto nas asas da gaivota que sulcaria o rio, como um poema, com asas de palavras, ditas e cantadas como um voo.
Sentiu-o nessa manhã de neve e soube-o apenas horas depois quando os carros de combate como velas de um veleiro libertavam a pátria, as ruas e praças do seu país, soltavam as mordaças e desenhavam cascatas de alegria entre multidões, construindo jardins e pintando paredes com as cores do presente.
Viveu-o nos dias todos que se seguiram entre o tumulto da alma e com os olhos a desejar vencer cinco mil quilómetros de distância. As noites, tingiu-as de sobressaltos em escutas silenciosas de rádio. Que país era aquele que lhe traziam as imagens? Que país era aquele que não conhecia e tanto desejava viver! A pátria sentimo-la quando nos ausentamos dela ou quando ela se ausenta de nós. Aquele era o tempo da sua ausência e senti-a pulsar no sangue como o tropel de um cavalo que soltaram numa planície sem barreiras.
O Iliushin correu veloz pela pista. Esbelto, ergueu-se, descolou do solo e voou voltado para o universo, para o infinito, para o futuro sonhado e que vive no olhar eterno das mulheres como um poema nunca dito. Pela primeira vez, viajava nesse avião ao encontro das estrelas. Pensava ele…!
O voo da gaivota, tornou-se, um dia, triste, planado, rente ao chão. O vento deixou de encher as velas dos navios que rompiam oceanos em descobertas de mares nunca antes navegados. Os tambores ouvem-se apenas nas madrugadas em que a lua escapa da prisão das nuvens. Os carros de combate, como os do poema, jazem destroçados entre os pátios, onde se acumulam as tulhas dos vampiros. E o sonho, ah!, o sonho, refugiou-se, escondido, no único lugar onde não morre, nem o prendem, no olhar feminino do mundo.
Agora foi o tempo da pátria se ausentar dele, deixou-se ocupar, pela indignidade dos sucessores do reinado da voracidade. Mandadores sem lei, amordaçaram de novo a poesia, ergueram muros nas avenidas e prenderam a armada da liberdade no cais da infâmia. Reúnem-se à noite nos terraços dos palácios e descem em bandos reunidos em torno do Partido da Gente Vaidosa e do Partido dos Filhos dos Merceeiros de Bairro.
Contudo, nos intervalos desse ruidoso baile, o sonho espreita e ainda pressente o cântico do passado, daquela manhã, entre a neve. Talvez seja impressão sua quando pensa escutar essa voz árabe que desce do castelo em lembrança de um tempo que parecia não ter fim e em busca de outras quimeras que parecem jazer nas necrópoles do que é imperecível.
Quem sabe, um dia, a história nos surpreenda…
A ESCRITA - Momentos, Lugares e Artefactos
Hoje, neste momento (25-04-2010 02:18:08), deu-me para iniciar um escrito sobre momentos, lugares e artefactos da escrita.
Momento que leva minha memória lá para trás. Trinta e seis anos antes. Por esta hora, ainda dormia. Alvorada por volta das seis horas para iniciar a última ronda do serviço que iniciara no dia anterior. Parada num grande bulício. Viaturas de outra unidade. Graduados que não identifico. Apresento-me ao oficial de dia. Apazigua-me. Manda-me estar por perto e diz para não me preocupar com a ronda. O Dinis de Almeida vocifera. Não aparece o quarteleiro para abrir o pavilhão onde estão as munições. Manda encostar uma Berliet ao portão. Após veículo imobilizado, dá ordem ao condutor para engrenar marcha-atrás e acelerar. O portão cai com estrondo. As munições são distribuídas. Passadas umas horas sai uma coluna militar desse quartel na Figueira da Foz, para Peniche. Missão: tomar o forte de Peniche e libertar os prisioneiros.
Continuo no exercício de escrita. Outro momento (25-04-2010 02:35:10). Entre as cinco e meia e as seis horas da manhã do dia quatro de Março de dois mil e dez um toque agudo, intermitente, invade os meus ouvidos. Toque esquisito? Marretada no despertador e olhar de soslaio para o visor do despertador. Merda. Voltei a enganar-me a marcar a hora do despertar. O “gajo” não se cala. Toque de facto esquisito ou é do sono. Nova marretada. A um novo toque diz-me a mulher ensonada: Pimenta é o telefone, não é o despertador. Ligo o candeeiro. Sento-me na cama e já adivinhando a razão de tanta estridência, todo o meu corpo se silenciou para ouvir do outro lado a notícia que adivinhava. A Rosalina Arouca partiu ao reencontro do Zé Pimenta. Para esse espaço etéreo, que sempre desejamos longínquo mas momentos há que o sentimos perto.
Num outro momento (25-04-2010 02:52:52), vivencio ainda bem um dia de fortes emoções. Vinte e dois de Abril de dois mil e dez: ali, despojado, vulnerável, humilde mas ao mesmo tempo com força para enfrentar mais um momento de avaliação. Próximo das três horas da tarde. A libertação e a descompressão. E mais um sonho concretizado. Mas a minha inquietação vai continuar. Continuo a ouvir a Rosalina: Oh Manel?! Porque continuas a estudar? Nunca lhe respondi. Agora que está lá em cima a olhar para mim digo: é por tua causa mãezinha. Sempre me estimulaste a procura do Saber. De ti não esqueço os hábitos de leitura e de escrita (sei que às vezes às escondidas). Ainda não pedi à mana as tuas agendas. Quero lê-las. Alimentar-?me do que lá escreveste. E retocar de tons de rosa as agruras da vida que suportaste.
Momentos de inspiração, não. Muito mais momentos de trabalho. De exercício. Perguntaram ao Pedro (eu ouvi, com estas orelhinhas grandes que sei ter) um dia: como é o teu processo criativo? Como constróis as tuas canções? Como compões? É quando estás inspirado? Qual quê, responde. Para isso teria de andar sempre com o piano debaixo do braço, o que não dá muito jeito. Conclui: quase todos os dias estou ao piano durante três a quatro horas. E então há momentos em que “sai” algo de interessante, resultado daquele trabalho sobre o instrumento.
E os lugares para a escrita. Todos os que me fortalecem a mente, me iluminam o caminho e me ambientam os dedos.
E os artefactos. Ainda gosto de sentir uma caneta entre os dedos a percorrer a superfície branca do papel, virgem e impoluta. Esperando indefesa a manifestação da minha violência. Mas eu até acho que não sou capaz disso. Então o teclado e o écran, numa composição híbrida de humano e tecnologia, serve os meus pretensiosos ímpetos de escrita.
E assim… o último momento (25-04-2010 03:20:41).
O JOGO DO REICH
No romance de Roberto Bolaño, Udo Berger, campeão de war games de Estugarda, está com a namorada na Costa Brava, em Espanha, a treinar um novo jogo chamado "O Terceiro Reich". Conhece um personagem desfigurado, o Queimado, que aluga "gaivotas" e dorme na praia, com quem começa a jogar, à partida com enorme vantagem, mas pouco a pouco percebe que sofrerá o desfecho histórico. O jogo influencia todos os seus actos e pensamentos, mesmo que nada pareçam ter a ver com estratégia militar, contribuindo para isso o facto de Udo e a companheira terem conhecido um outro casal de alemães, Charley e Hannah, e dos donos do hotel serem também dessa nacionalidade. Os sucessos no tabuleiro dão lugar a um crescente sentimento de que não se trata apenas de fichas que avançam ou recuam, mas de que a sua vida corre um perigo real, perigo de que todos à sua volta estão conscientes. Depois de Charley ter desaparecido no mar e o grupo se ter desfeito, regressando a namorada de Udo e a "viúva" de Charley à Alemanha, o ominoso despique com o Queimado prossegue, registado dia a dia como uma crónica de guerra. Finalmente, o triunfo do Queimado com a queda de Berlim revela-se um anti-clímax. O "monstro", depois dum instante de regozijo, limitou-se a ficar parado diante do mar. O narrador não foi talhado aos bocados, nem tratado como um vencido da guerra. O "Terceiro Reich" era apenas um jogo. Quando por sua vez regressa a Estugarda Udo é um outro homem, definitivamente desinteressado pelo mundo dos war games.
A vida é ou não um jogo? seria uma conclusão que não faria justiça ao livro que não pode ser resumido, visto que a sua essência é o tempo romanesco. Udo Berger cai numa realidade sem forma e sem relevo logo que deixa de acreditar na "seriedade" do jogo, com a tomada do bunker final dando lugar ao vazio dum post-coitum. O jogo, nessa perspectiva, confunde-se com o próprio romance em cuja temperatura mergulhámos por um tempo, fora da realidade. É isso que transforma a banalidade de meia dúzia de personagens, não mais loucos do que qualquer um de nós, num pesadelo "decepcionante". Claro que se trata dum pesadelo germânico. Isso vai ao encontro duma metáfora da vida como jogo. Não é possível admirar o génio e o heroísmo de generais como Rommel e Guderian, como se a guerra fosse um simples jogo. E não é esse vício da abstracção (com a separação dos meios e dos fins) uma especialidade cultural presente em todas as justificações do genocídio, como na ladainha de Eichmann que dizia limitar-se a cumprir ordens?
A LIBERDADE, a Liberdade de imprensa, a Revolução da Informação e os meios de comunicação social.
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RUMO AO 4º PLANETA
Mercúrio, Vênus, Terra e Marte
(tamanhos comparativos, da esquerda para a direita) - Wikipédia
Circula o rumor de que o presidente dos EUA, Barack Obama, poderá, em breve, desafiar os americanos e impressionar o mundo com a marcação da primeira viagem humana a Marte.
Se o rumor se confirmar Obama seguirá, assim, o exemplo do anterior presidente John Kennedy que, no ano de 1961, em plena corrida espacial com a União Soviética, fez o célebre discurso:
"Eu acredito que a nação deve comprometer-se para alcançar o objectivo, antes do fim da década, de aterrar o Homem na Lua e fazê-lo voltar em segurança para a Terra"; (e noutro discurso): "Nós decidimos ir à Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis".
Em 20 de Julho de 1969, Neil Armstrong e Buzz Aldrin, sujavam as suas botas no pó lunar.
A geografia política do mundo, entretanto, mudou muito, pelo menos nas coisas do espaço a competição deu lugar à cooperação, o que levará então Obama a dar um novo e ainda mais ousado passo em frente?
Um motivo cínico poderia ser a quebra do seu índice de popularidade nas sondagens; outro poderia ser desviar as atenções da crise financeiro-económica; mas se o indispensável consenso político se estabelecer em volta de um prazo para o desembarque em Marte, tal implicará a afectação ao projecto marciano de enormes recursos financeiros que de outro modo seriam negados, criando grandes expectativas de resultados, em termos de negócios e de avanços científicos e técnicos, do longo programa de exploração, ao mesmo tempo que elevará o espírito da União e reafirmará a liderança americana do mundo.
Não deixa de ser curioso que a Agência Espacial Europeia já em 2001 haja fixado o prazo de uma expedição humana a Marte até 2030, mas uma União Europeia politicamente a marcar passo não galvaniza ninguém…
Os desafios e perigos de uma viagem ao planeta vermelho são tremendos. Marte não está "logo ali" como a Lua, a cerca de 400.000 km., mas sim a dezenas ou centenas de milhões de quilómetros, conforme a sua posição relativa em órbita. Isso implicará, com a tecnologia actual, uma viagem de ida e volta de cerca de 2 anos, durante a qual e também no acampamento em solo marciano, a tripulação terá que ser, praticamente, auto-suficiente. Uma tão longa viagem coloca, entre outros, problemas de relação entre os membros da tripulação em espaço confinado, e supondo uma distância média de 75 milhões de quilómetros, a comunicação com o centro de controlo em Terra deixa de ser praticamente imediata, como acontece nas viagens lunares, passando a demorar cerca de 8 minutos (4 para lá e 4 para cá). Além disso, o clima marciano não é agradável, sendo as temperaturas muito variáveis e geralmente negativas.
Porquê Marte? A Agência Espacial Europeia responde que é o planeta do sistema solar mais parecido com a Terra e que as recentes indicações da presença de água dão a possibilidade de se encontrarem indícios de vida.
Pessoalmente, impressiona-me mais a robotização e a criação de inteligência artificial do que viagens épicas. Mas sem sombra de dúvida que para além das razões de grupo ou de nação com que nos dividimos, está na nossa natureza a permanente busca do desconhecido, pelo que o título deste texto bem poderia ser "atrás do destino".