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01/05/09

PROCURANDO DESREGULAR-ME

Sá Pimenta

http://www.inkcinct.com.au/Web/CARTOONS

Reclamo um regulador para controlar as minhas obrigações domésticas. E estas tais que vão desde o meu envolvimento nas actividades muitas vezes reconhecidas como atribuídas à outra parte – questão de género -, até aquelas, também muito solenes e festivas, que apelam ao plano horizontal, ou não, em superfície a gosto do par.

Quero um regulador para vigiar meus comportamentos gastronómicos. E já agora vínicos.

Exijo um outro, qual sinaleiro, para me mostrar a luz vermelha perante os péssimos resultados dos controlos laboratoriais e dos exames dos gabinetes de radiação e irradiação. Até de outros que alguém – até eu, quem sabe - inventa que tenho de fazer. Creio assim ter uma mais forte probabilidade de, quando partir desta para melhor, ir cheiinho de saúde. O que me dará um gozo que já antecipo.

Gostaria de ter um outro regulador. Forte, valente, arrojado e proactivo (palavra bonita esta, não parece?). De uma sagacidade tal que nada lhe escapará sobre o mercado financeiro, acrescido com um permanente diagnóstico do estado da economia real. Claramente alguém muito melhor que o Madoff. E de cuja acção eu não poderei deixar de prever, com segurança, sublinho, prever com segurança, como melhor poderei fazer as minhas aplicações financeiras.

Já agora, um regulador para as questões culturais. Tarefa principal e árdua. Tendo em atenção o meu orçamento familiar e ciente dos meus gostos garantir as melhoras escolhas. Reduzo-lhe as dificuldades: espectáculos de bailado podem ser as últimas opções. Só se entender que a minha presença num ou noutro em particular irá assegurar benesse futura. Não precisa ficar preocupado com acusações que tempo adiante poderá ditar. Tipo, proporcionar favorecimento pessoal e corrupção activa ou passiva. Isto de ser activa ou passiva é importantíssimo. Tanto ou mais importante do que, naquelas relações ditas contra-natura, aquela posição ou melhor disponibilidade, ser activo ou passivo, parece ser fundamental. E se isso acontecer – as acusações… , para o que vai acontecendo, já não estarei por cá para assistir. E se estiver, arco com as consequências, na certeza porém que vou de tal maneira esticar a corda que estico eu ou estica o processo ou processos. Até à prescrição. Se ainda cá estiver e a prescrição não tiver ocorrido, consiga eu e ele – que não pense que se safa – arte e engenho para ainda aguentar a magnanimidade e eficiência da nossa justiça por muito tempo, È claro que, numa situação destas, extrema como é fácil de adivinhar, o discípulo do Madoff já me tinha conseguido encaixe financeiro tal, sem qualquer sinal de enriquecimento ilícito – vade retrum – que todos argumentos, instrumentos, vírgulas e as suas ausências, seriam utilizadas em defesa da minha honra e bom nome. Isto não é cultura regional, não senhor, de todo. Muito mais pequenos focos de manifestação de poder pacóvio, só isso. Nada de novo, de resto. E neste deambular perdi-me na definição do perfil do meu regulador cultural. Decidido que, bailados, só naquela situação. Depois dos bailados e no sentido ascendente, alguma música dita erudita – teríamos que conversar caso a caso, também não. Claramente fora da lista vernissages. Alto aí, uma excepção. Só se estiver prevista a presença de uma daquelas figuras. Das tais que possam ajudar numa situação futura. Estão a ver? Já estou cansado de falar do regulador cultural.

Vamos lá ver se arranjo um outro para me pôr nos eixos. Ah! Lembrei-me. Um regulador motorizado. Não, nem vem de mota, nem de lambreta, nada disso. Este vai estar atentíssimo a gestão da minha frota automóvel e colecção de motos. Tudo que ela implique. Limpeza, manutenção, compra, venda e já agora dos seguros. E se ele quiser inventar mais uma outra tarefa que avance.

Finalmente, ia-me escapando um outro que é crucial no meu equilíbrio sistémico – esta palavra também é bonita, não é? Então este, em termos de exigências de atenção perante tudo que o rodear, terá de ser “o maior”. Irá estar, unicamente, preocupado com as situações das minhas relações familiares e de amizade. Prioritariamente, é evidente, com o imediato círculo familiar, e depois, alargando o âmbito de intervenção até reencontrar o meu velho amigo da tropa, o Antunes da Meia-Via, no Entroncamento.

Já viram a quantidade de postos de trabalho que irei criar. E tudo com pessoas que irão dar valor acrescentado ao meu ser. Isto garantidamente. Com esta equipa de notáveis poderei concretizar um velho sonho. Demitir-me da vida. Mas tenho que ter cautela, pois às tantas eles não regulam nada. E poderei ir mesmo para o outro lado ou bato com os costados numa choldra. Então a melhor solução é contratar o regulador dos reguladores. Então sim. Estava prontinho, de todo, para a desregulação.

Mas…porra. Eu quero viver. Eu quero Vida. Chatice, Vou ter de resolver este conflito existencial. Aí vem mais outro regulador. Isto não pára, é?

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