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01/05/09

O DESTERRO DA FILOSOFIA

António Mesquita



"A teoria dos jogos e a de projecto de mecanismo imaginam as pessoas actuando pelo interesse próprio e pela manha. A ciência política constrói modelos baseados em votantes interesseiros, senadores interesseiros e congressistas interesseiros, cada um tentando compreender qual é o seu interesse. Será ser eleito outra vez? Maximizar uma posição particular? E de cada vez se constrói um sistema à volta desta ideia dos indivíduos interagindo na tentativa de maximizar o seu próprio benefício."

John Brockman ("The end of universal rationality")


Esta racionalidade egoísta não é, contudo, confirmada pelos factos. "As pessoas sistematicamente e previsivelmente comportam-se de modo muito mais cooperativo do que o previsto pela teoria dos jogos".

Dentro da mesma linha, os anos noventa conheceram a voga da agency theory (que alguns traduziram pela teoria do agente-principal), de Jensen e Murphy, implicando que toda a gente tem tendência para se "desenfiar", como se diz na tropa. A consequência desta doutrina foi a necessidade de sujeitar toda a gente à monitorização, incluindo os próprios monitores. A estes novos "olheiros" (sobretudo os do topo) foram por isso distribuídos generosos incentivos. "Quinze anos depois, vemos múltiplos de 200 e 500", em relação ao que ganha um empregado "alinhado" pelos interesses da empresa.

Esta cultura entre os executivos tornou-se tão esquizofrénica que vimos recentemente os directores duma AIG salva in extremis pelos dinheiros públicos a reclamarem o direito aos seus bónus principescos.

Temos então que todo um sistema financeiro e empresarial baseado numa teoria aparentemente realista sobre o comportamento humano e alicerçada nos mais competentes modelos matemáticos provou, pelos seus resultados catastróficos, que a misantropia e o julgamento da espécie pelo puro egoísmo tem custos tão gravosos como o idealismo mais descabelado e as engenharias do futuro a que nos iniciou o século XX.

E não parece que esta perigosa deriva se possa combater através da simples recentragem, concedendo, por exemplo, mais espaço às motivações altruístas. Se há uma conclusão a tirar deste impasse, é a de que nenhum pensamento digno desse nome preside às nossas escolhas e disso é significativo o abandono da filosofia e o descrédito a que foi votada pelas várias teorias do sucesso. Uma nova casta colonizou todo o espaço de reflexão que escapa à comunicação de massas: a dos gurus e dos spin doctors, com receitas para tudo, desde a psiquiatria à economia e à gestão de empresas.


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