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01/11/20

DEFESA CIVIL

António Mesquita

Diz Marshall Mc Luhan, o profeta canadiano de "Understanding Media" que "Idealmente, a educação é uma estratégia de defesa civil contra as consequências dos 'media'."

Como se sabe, a tese mais conhecida deste pensador é a de que o meio é a mensagem, não o conteúdo desta. "Toda a tecnologia gradualmente cria um ambiente humano totalmente novo. Os ambientes não são envolvidos passivamente, mas como processos ativos". 

No momento em que a Igreja pela voz do Sumo Pontífice alerta para uma "catástrofe educativa mundial" decorrente sobretudo das repercussões duma pandemia que deslaça a sociedade humana e põe em causa a transmissão dos conhecimentos e a herança cultural, é tentador fazer o exercício de sobrevoar uma crise planetária que cavalga uma mudança climática de alto risco e uma revolução tecnológica vertiginosa de que todos somos testemunhas.

Até que ponto as dificuldades e os graves problemas de saúde pública ligados ao Covid 19 seriam menos complexos na ausência daquela conjuntura? Menos angústia e menos medo do futuro, talvez, se as novas armas da medicina e a espectacular capacidade de partilhar conhecimento providas pela tecnologia não fossem também um motivo de esperança.

A ideia de McLuhan de que o chamado progresso tecnológico impõe à sociedade uma "estratégia de defesa civil" não é uma afirmação optimista. Quaisquer que sejam as vantagens da utlização dum novo "medium", são de esperar algumas consequências negativas. Embora seja de crer que o balanço final seja positivo, não temos conhecimento do abandono duma grande novidade tecnológica  se apenas o futuro tiver a última palavra sobre se representa um verdadeiro progresso. Estamos apenas a começar a ganhar consciência de que a informação sobre nós recolhida durante o uso da internet é a "alma do negócio", ou, como diria o pensador canadiano, é a "mensagem."
Esses dados permitem a uma empresa motivar, sem nos darmos conta disso, os nossos actos privados ou públicos e a um estado poupar na força policial e controlar os cidadãos como nem o Orwell do "1984" sonhou. O Big Brother era a infância da arte.

Ora, como é que a escola pública, falemos só nesta, para simplificar, pode escapar a este cerco ambiental? O que se está a passar em França dá-nos algumas indicações. Depois da decapitação de Samuel Paty, o governo prepara-se para "dessequestrar" as crianças árabes, mas francesas de pleno direito, duma educação pela comunidade e à margem da escola laica. A República é laica e quer uma educação cívica de acordo com isso. Se o Estado francês já fosse um CiberEstado, a única esperança para a liberdade seria a estratégia educativa adoptada pelas famílias árabes, em França. Isso é o que corresponderia a uma "estratégia de defesa civil contra as consequências dos 'media'." Resta saber se essa estratégia teria qualquer hipótese fora da democracia, tal como a conhecemos. 

"(...) o surgimento de uma tecnologia não ocorre por uma tentativa isolada do desenvolvimento técnico em si, mas sim por uma tentativa de transformar, reproduzir, e documentar as experiências do homem" (McLuhan)

A pandemia do Covid é, por outro lado, uma espécie de "medium anti-social" de que também temos de nos defender. Os dados que a doença obtém sobre nós não os vende como publicidade ou controle dos cidadãos. Procura apenas expandir-se. Essa sua "cegueira" é a nossa sorte. Não lidamos com um inimigo "diabólico", como só o homem pode ser. 

O tribalismo das redes sociais pode potenciar a desinformação e a intoxicação dos grupos tornando muito mais precário o funcionamento da sociedade como um todo. É o nosso azar. Não é a guerra civil, é a anarquia que "faz a cama" do Ciberestado.

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