Mário Martins
https://www.google.pt/search?q=incendio+pedrogao+grande
Guardo ainda frescas na memória as imagens dantescas da cidade do Funchal a arder na televisão, no fundo da noite, a culminarem a onda avassaladora de incêndios do ano passado. Essas imagens causaram-me uma grande impressão e cheguei a temer o pior. Afinal, o pior estava para acontecer em Pedrógão. Um amigo oriundo da região, que havia dado uma volta por lá há pouco tempo, opinou que era previsível que uma desgraça acontecesse, dada a densidade da floresta com as aldeias no meio dela. Mas li no jornal que um professor de uma faculdade lembrou que há muito que está definida a necessidade de as aldeias da floresta terem um perímetro de segurança, um refúgio e formação da população. Portanto, há uma responsabilidade política traduzida numa demissão do papel do Estado de levar à prática as medidas de prevenção convenientes e de colocar o bem público acima dos interesses particulares. Assim como há uma responsabilidade política pela negra estatística de, ano após ano, Portugal ser o país da União Europeia com o maior número de incêndios florestais e uma área ardida à volta dos 50% da total europeia. Agora, a única maneira de honrar a memória dos mortos é aplicar as medidas de prevenção que não foram tomadas em décadas de laxismo e de aposta nos meios e acções de combate. Desta vez, só de pensar no que terão sido aqueles momentos infernais vividos pelas vítimas, fugi o mais que pude da televisão, tomado de pudor. Perante esta autêntica tragédia nacional, o furto de Tancos, grave em si mesmo, assume contornos de pura comédia.
*do discurso de José Saramago na cerimónia de entrega do prémio Nobel (Dez1998)
Sem comentários:
Enviar um comentário