Mário Faria
(Queer Sci Fi) |
A terceira geração das Máquinas Inteligentes (MI) está cada vez mais próxima do ser humano, numa representação híbrida para não ferir suscetibilidades. Foi recebida de forna entusiástica pelas elites que as projectaram, as distribuíram e pela maioria dos utilizadores. Têm uma gama de aplicações muito diversificada e a sua utilização é bastante frendly. Esta tendência de aproximar a máquina à imagem do homem já era perceptível nas MI da segunda geração, mas ultrapassou as mais optimistas perspectivas. A ideia de criar dois olhos extras nos indicadores das mãos, foi recebida de forma muito entusiástica dadas as vantagens que a nova aplicação vai potenciar. Além do mais, há uma diferenciação inteligente conforme os alvos a que se dirigem. As MI de primeira geração mantêm-se a operar na produção em linha, mas ensaios e novos produtos são testados e algumas novas máquinas estão já em fase de produção e vão revolucionar os transportes e a exploração do espaço. Obviamente, que os protótipos de uso pessoal têm uma dimensão de um micro interruptor que liga os utilizadores à “nuvem” e põe à sua disposição um número ilimitado de aplicações. O trabalho já era e os humanos dedicam-se a algumas tarefas cívicas que lutam por manter. As artes e as actividades desportivas mantêm-se com algum fulgor. O futebol está vivo apesar de todos os esforços das autoridades para o estrangular, dada a sua natureza demasiado conflitual, mas que acabaram por abandonar, “não fora a populaça dirigir esses impulsos a outras actividades, nomeadamente políticas”. A prática religiosa está reduzida a pequenos núcleos pouco representativos, embora Fátima e os Pastorinhos mantenham uma interessante notoriedade; as de origem islâmica têm sido muito perseguidas e com algum êxito: o uso da burka há muito foi extinto e a cor invadiu os trajos outrora negros como a noite. Há (ainda) muito caminho a percorrer, nomeadamente nas zonas em que a implantação das máquinas ainda não cobre as necessidades a muitos povos, de forma sustentável. Mas, o FMI (Fundo de Máquinas Inteligentes) está a tratar bem da coisa.
Os homens e mulheres têm como principal ocupação, a continuidade da espécie, a família e o lazer. Com todos os serviços garantidos a moeda é distribuída de acordo com a dimensão familiar e serve para animar a iniciativa privada em “serviços que prestam pouco valor ao produto”. Têm apenas de cumprir uma série de serviços cívicos que exigem prestar e não ultrapassam as 20 horas semanais, por cidadão. Os Directórios que dirigem e supervisionam toda a actividade dos homens e das máquinas, são os donos de tudo. Os cidadãos estão domados, as máquinas são uma ameaça controlada, por enquanto. A sociedade da felicidade perfeita, está bem encaminhada, segundo reza a informação política dirigida pela poderosa Confederação dos Directórios. A administração territorial está dividida da seguinte forma: Europa, Ásia, África, Oceânia, América e pelos seguintes estados independentes: USA, Rússia e China. Cada uma tem o seu Directório independente e a Confederação estabelece as linhas políticas gerais e decide os conflitos entre as partes. Embora com diferentes velocidades, há um surto de desenvolvimento e paz. Alguns conflitos regionais, particularmente no mundo Islâmico, ainda preocupam. O debate que os cidadãos mais cuidam, prende-se com o poder crescente da máquina em muitas áreas, nomeadamente na segurança e na justiça. As MI da última geração cada vez mais tendem a copiar o homem num estado de perfeição, a que adicionam alguns pormenores menos estáveis para simular uma falsa fragilidade. Querem ser o prometido Homem Novo. Para dar conta da capacidade e poder robótico, repare-se neste pormenor ao nível de decisão a que as máquinas podem aceder no momento da sua própria programação. Repare-se nesta delícia: a língua oficial que cobre todo o território é o inglês a que todos estão obrigados; as línguas indígenas são toleradas, só que os cidadãos de cada região não abdicaram de a fazer a língua de utilização permanente no espaço familiar. O Directório entendeu dar às MI pessoais da da terceira geração o nome de “Saudade” para todo o espaço historicamente reconhecido como Portugal, só que a máquina na sua lógica brutal constatou que a palavra mais usada pelos indígenas era ainda e de forma muito clara, a expressão, Foda-se, e vai daí “resolveram” que essa devia ser a palavra que acharam mais popular e adequada para as novas MI pessoais. Esta ocorrência tem gerado um intenso debate. O povo gostou da mudança. As máquinas aproximaram-se das gentes pela aplicação da lógica pura e dura e os que inundam os corredores dos Directórios estão muito preocupados e anunciam os perigos deste populismo conduzido pela realidade virtual. E vão ao baú da história e lembram as desgraças após o Brexit. E assim vai o mundo em 2517.
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