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01/06/14

DEMOCRACIA VIGIADA

Mário Faria

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O Chico Fininho rendeu-se às virtudes culinárias de D. Beatriz e à sua competitividade na cama, como diz à boca cheia e de forma descarada. Socialista de gema, foi sempre um soarista primário, por assim dizer. O enteado, como gosta de lhe chamar, que apoia o partido maior do arco da governação e que é segurança numa conceituada loja da noite portuense, conta-lhe as histórias inacreditáveis que ouve de gente muito conceituada que sabe do que fala e que provam que o governo socialista de Sócrates foi o único responsável pela situação de bancarrota em que o país caiu. O Chico encaixa com galhardia a rude condenação, a bem da harmonia familiar, da boa mesa e da cama que o acolhe tão bem.

Diga-se em abono da verdade que andava muito descontente com os caminhos que o partido vinha trilhando em linha com o que Mário Soares vinha reclamando de forma sistemática e sem contemplações. De forma solene, o Chico responsabiliza o secretário-geral, o Zorrilho que é uma nódoa e o Assis que se pôs de joelhos para ir para o parlamento europeu, pela falta de tomates na condução do partido. Mas bem pior que o partido, estava o negócio como dizia de forma dilacerada, embora não se soubesse muito bem do que se ocupava. Fazia uns biscates na reparação de persianas, mas ninguém acreditava que aquilo fosse o core business do Chico.

A eleição para o parlamento europeu desanuviou o espírito dele e apareceu mais lampeiro e brejeiro no dia seguinte ao sufrágio. Mas, foi sol de pouca dura. O soco de António Costa custou-lhe a digerir. Já não o gramava desde que se habitou a vê-lo sentado na cadeira de sonho ao lado do Kadafi dos Pneus; agora não lhe perdoa a traição ao partido. Ficou incrédulo e não poupou Mário Soares: acusou-o de radicalismo pequeno burguês. Razão tinha a minha Beatriz que me aconselhou a votar em Marinho Pinto, confessa desiludido. Mais não disse. Muito zangado, foi trabalhar, como gosta de dizer.

Regressei a casa e segui de perto a sessão parlamentar sobre a moção de censura apresentada pelo PCP. Não sei se a moção foi politicamente conveniente e se acrescentou valor aos propósitos do partido comunista para além da corda com que presenteou o PS e que este não rejeitou para se auto mutilar. O governo ficou confortado com o desconforto do PS e Machete e Paulo Portas revisitaram o PREC e utilizaram a retórica do antanho para fugir á incomodidade de discutir temas tabus, como a saída do Euro defendida pelo PCP. O Governo fica aterrorizado com a ideia e só de ouvi-la fica com aos cabelos em pé: teme que os mercados ouçam, retaliem e nos obriguem a um segundo resgate. Uma democracia vigiada para nosso bem. Não pode ser de outra maneira. Num quarto de um doente, não se deve fazer barulho, não vá perturbar a sua convalescença. E o país está doente. Xiu, silêncio que a cura (só) demora para aí uns vinte anos!

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