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01/08/11

CONSUMO LOGO EXISTO

Mário Faria



http://caquiscaidosblog.wordpress.com










Foi uma semana louca. Com o despertador a tocar às seis horas da manhã, madrugava a  praguejar contra a porca da vida e lá corria  para o supermercado. Apesar de estar muito próximo, quando lá chegava a fila já dava quase a volta ao quarteirão. Muita gente, problemas acrescidos. Havia que disciplinar a multidão. O trabalho de controlo, garantido por um comissão ad-hoc constituída no local  (e da qual fiz parte) para evitar os abusos, oportunismos e quebra das regras que a formação de uma fila obriga, foi titânico e longe de ser pacífico. Alguns idosos e um invisual quiseram valer-se da sua condição e resolveram passar  à frente de toda a gente. Foi o fim da macacada. Houve estalada, e até um capachinho voou de um descabelado qualquer. Os seguranças intervieram e a comissão geriu o conflito, só dando prioridade a uma velhinha que comprovou ter 92 anos, sofrer da diabetes e de severa incontinência. Os restantes eram, sem réstia de dúvida,  impostores e tiveram de ir para o fim da fila, sem direito a recurso. O falso ceguinho, a muito custo, livrou-se de levar um enxerto de porrada, mas foi simpaticamente convidado a desistir e pôr-se na alheta. Uma vergonha!


Todos fomos servidos. Foram garrafas de azeite, óleo, vinho, sacos de arroz, feijão, e massas, distribuídos em diferentes dias, e no fim de semana houve direito a pequeno almoço : muito bem servido e variado. Pena que não houvesse cadeiras e que os miúdos metessem a mão em tudo que parecesse comida. Foi extenuante e uma batalha permanente. Mas valeu a pena. Como éramos dois, trouxemos tudo em quadruplicado (passamos duas vezes pelos balcões de recolha dos alimentos) e conseguimos juntar outros tantos produtos que não faziam parte do pacote de ofertas, na sequência de algumas trocas que tratámos de negociar. Nada se consegue sem trabalho e engenho.


A operação poderia ter sido um êxito colossal. Explico : pedi aos meus filhos para me “emprestarem” os meus netos. Precisava de aumentar a minha capacidade produtiva. Fez-se um silêncio ensurdecedor. Foram 180 segundos. Não havia necessidade. Responderam que não. Nem pensar. Disseram-me, ainda, olhos nos olhos:  “oh pai, já tens idade para ter juízo. Se tem algum jeito!”. Não perceberam que estou a agir, premeditadamente, em contra-ciclo. Paciência.


Não fiquei aborrecido. Pelo contrário, sinto-me rejuvenescido. Não há promoção que não registe e não procure. Saldos são um desatino. Não resisto. Não paro. É a procura do melhor preço. Todos os produtos me interessam : faço um estudo exaustivo das características do que valerá a pena comprar, em função do estimado nível de utilização, qualidade, preço e dos prazos de entrega e pagamento, quando aplicáveis. O portátil vai comigo e assento tudo na folha de Excel com um template que formatei para o efeito. Antecipadamente seleccionadas as pechinchas, parto para a aquisição, logo que oportuno.


Parece fácil, mas não é Um plano bem delineado tem de conter um plano “B”. O facto de estudar tudo ao pormenor retira um pouco de emoção. É que o acto de comprar, para dar pica, exige aquele impulso quase compulsivo que o estudo minucioso do mercado retira. E não só. Ando na fase de comprar t-shirts e dos modelos seleccionados só encontrei peças do tamanho “L” e “XXL”. O resto tinha voado num ápice, disseram. Fiquei a ver navios. 


Plano falhado, recorri à versão “B”. Fui ao Continente. Comprei chanatas, bermudas e t-shirts para três toilettes bem modernas para a época balnear, á minha medida e ao preço da uva mijona.  Chegado a casa, experimentei. Estava tudo ok. A minha mulher, viu-me e perguntou : “onde compraste essa porcaria ? pareces maluco!”.
Não liguei nenhuma. Deixei-a a falar sozinha. Sentia-me satisfeito. Tinha de preparar nova acção. Ia virar-me para a área mobiliária e cultural. Aumentar a estante com mais alguns módulos e comprar livros.


Para já,  tenho de ocupar uma inestética brecha que tenho na dita estante. Vou comprar quatro livros editados em inglês que o distinto João Espada, uma das mais proeminentes figuras do (neo)liberalismo, em vertiginosa actividade política/cultural, – Director do Instituto de Estudos Políticos da UCP, titular  da cátedra European Parliament/ Bronislaw Geremek in European Civilization no Colégio da Europa/ Campus de Natolin, Varsóvia – recomendou como uma excelente leitura de Verão. A saber: Dark Continent: Europe´s 20th Century, The coming of the III Reich, Bloodland: Europe between Nazism and Comunism and A History of the English-Speaking Peoples since 1900. Espero que a lombada dos livros corresponda. Excitante, não é?


Venha a próxima semana. Muita pesquisa, observação e negociação, estão na agenda. Sinto-me eufórico, útil e activo. Quase feliz.




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