António Mesquita
Aí está o filme do poder frágil, da majestade a um passo do ridículo que transtorna as nossas ideias feitas sobre uma certa “grandeza”.
Ninguém, no fim da projecção, deixará de se sentir próximo desse homem a quem uma gaguez paralisante impedia de se sentir o rei que tinha de ser. Na era da rádio, com a segunda guerra mundial anunciada, frente a esse “animal da rádio” vociferador exímio que foi Adolf Hitler, Jorge VI não podia apenas mostrar-se como o símbolo supremo, como a “sombra do guerreiro” (Kagemusha) no alto da colina. A tradição que tanto serviu aos seus antecessores não o podia ajudar. Aquele era um novo tipo de desafio que impunha que o monarca descesse à terra e se sujeitasse a ser tratado como um igual por um terapeuta da fala, sem diploma, não reconhecido pela “Ordem”.
A insegurança que Colin Firth nos transmite duma forma tão sensível, a descrença no papel que todos lhe impõem, são vencidas pela coragem e pela vontade que podem ser apanágio do mais humilde e que nada têm de especialmente “glorioso”.
Jorge VI é um homem frágil, apanhado pela máquina dinástica, incapaz de se esquivar com o dandismo do príncipe de Gales, e que carrega um fardo cujo peso todos podemos adivinhar.
A verdade da história não anda longe de certos costumes dos Mares do Sul, revelados pelos antropólogos, que, sob pena de morte, condenavam o “soba” a sentar-se no trono para o resto dos seus dias. Pergunte-se a algum de nós se queria essa prisão, por maior que fosse o harém e por mais requintadas que fossem as iguarias que faziam dele um obeso impotente.
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