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01/11/10

MAD MEN E AS PESSOAS DE BEM

Mário Faria
"Mad Men"


Vi  a TV e ouvi as últimas sobre o acordo entre o Governo e o PSD sobre o OGE para 2011. Fiquei a saber que Catroga é uma pessoa de bem e Teixeira dos Santos virou político e perdeu o bom senso inato a um técnico competente, ainda por cima professor catedrático.

Na Quadratura do Círculo que apareceu depois,  ouvi outras três pessoas de bem a falar da mesma coisa : Lobo Xavier acusava energicamente Sócrates, Pacheco Pereira confessava que os dois partidos de governo se tinham afastado dos cidadãos e se esgotaram na luta pelo poder e António Costa,  perante o cenário de calamidade do país que os colegas denunciavam, enfatizava a obra feita pelo governo e lembrava que Portugal não é a Albânia , e muito menos Lisboa é Tirana. O programa acabou com as três pessoas de bem com um ar muito solene e preocupado, que a câmara mostrou com generosidade, e que só as grandes figuras de estado  são capazes de compor, fundamentalmente em situações de profunda crise, de que felizmente estão a salvo.

Foi assim pela noite fora. Tudo gente de bem que sabe do que fala. Aplicam os termos de forma coerente, estão fartos de fazer e ler orçamentos e reclamam pela presença do FMI, porque somos ignorantes, improdutivos e ingovernáveis. Falam com ar sinistro, próprio de quem vai passar mal nos próximos tempos. Silva Lopes estava mais calmo, talvez porque é um dos justamente contemplados com a multi-reforma que só os cérebros puros e reciclados têm direito.

Fartei-me de ouvir o mesmo e os mesmos : vestem igual e repetem até exaustão as mesmas teorias. Falam do tema como os que relatam o futebol e o comentam. Um rapaz moço, veterano na pesquisa financeira,  proclamava que o rompimento das negociações tinha sido um caso absurdo de pequena política. Explicava indignado :  0,1%  do PIB que não vale mais do que 230 milhões de Euros. Como é possível que o Governo tenha furado esta oportunidade ?

Acordei do pesadelo a tempo de ver o último filme da série 3 (?) de Mad Men.  Don Draper o director criativo da agência Sterling Cooper, sócio minoritário com 12,5% de participação no capital,      regressou da Califórnia duma visita de prospecção a novos clientes, mais demorada que o previsto,  porque aproveitou para uma breve incursão ao passado.  Encontrou a agência em vésperas de fusão com uma congénere inglesa, ansiosa de expandir os negócios daquele lado do Atlântico . O mediador é o director de contas da Sterling, que influenciou o acordo, para disso tirar proveito e passar a director geral da nova unidade em formação. A lógica financeira, o lucro e a ambição prevaleceram. Como é normal, nos negócios.

É uma excelente série. O ambiente dos anos 60 é exemplarmente recriado e as personagens são  misteriosas e de personalidade complexa. Don Draper parece mais Dick Tracy que um director criativo. Uma personagem enigmática : duro, sereno, confiante, distante, certeiro e  com bom coração para alguns dos mais frágeis. Um pouco à imagem dos heróis da cinematografia desses anos. O vilão, o director de contas, foi batido no primeiro round. Afogou-se na azia que destilou. Os novos patrões concluíram que não servia para o lugar, porque não sabia beber. Serviram-se dele, amachucaram e deitaram fora. É assim no mundo dos negócios. Não há que levar a mal,  como não se cansava de repetir Don Corleone.

 Acabado o filme, tornei a passar pelas notícias. Soube que o encontro entre Catroga e Teixeira dos Santos ocorreu em casa do primeiro.  Chegaram a um acordo. A bem da nação. O ambiente familiar foi decisivo. É assim que agem as pessoas de bem, ainda que um dia antes tenham trocado azedas acusações. Portugal no seu melhor.

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