António Mesquita
No quadro de Veronese "Vénus e Adónis", que se encontra no Museu do Prado, há uma geometria secreta que reforça o sentido explícito da cena, para lá da sensualidade dos corpos e da sua luz maravilhosa.
As pernas de Adónis adormecido abrem-se num ângulo recto coberto pelo obtuso formado pelos corpos de Vénus e Cupido, inclinados em direcções opostas. As cores complementares da veste de Adónis e do manto da deusa criam a tensão necessária entre um interior e um exterior simbólicos. A cabeça do jovem, poisada no regaço de Vénus, é a ponta da própria seta do deus do Amor que, desempenhado da sua tarefa, se agarra, ociosamente, a um dos cães.
O pintor quis dar à deusa o olhar ligeiramente estrábico que os Antigos consideravam entre todos o mais erótico (porque parece focar-se a si mesmo?) e que na circunstância transforma a sua conquista (ela empunha uma bandeira) numa experiência quase digestiva.
O maciço de cores sombrias opondo-se ao céu claro reforça a ideia da gravidade. Adónis está ausente, transformado, num mero projéctil.
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