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01/06/18

OPINIÃO

Mário Faria




Segui com atenção o debate sobre o direito à morte medicamente assistida, ou seja sobre o direito ao exercício da eutanásia, segundo as condições legislativas a aprovar. O assunto é complicado porque mexe com os valores (e a consciência) de cada um. Mas, percebo melhor as divergências profundas mais ou menos fundadas em ortodoxias religiosas do que as que decorreram da fundamentação do PCP para se opor à sua aprovação. Ouvi a longa intervenção que me pareceu demasiado rebuscada. A argumentação do primado à vida para combater o aborto, não é substancialmente diferente do que a direita usou agora. É provável que nos países em que a eutanásia está legalizada nem tudo tenha corrido bem, mas isso na minha opinião seria e será inevitável. Tal como a despenalização do aborto que poderá ter provocado alguns efeitos negativos, nomeadamente na vertiginosa quebra de nascimentos no nosso país. Por outro lado, defender que os cuidados paliativos vão chegar a todos os homens e mulheres deles necessitados e que o SNS vai ter todos os meios indispensáveis para cobrir todas as necessidades é uma falácia. Mas ainda que fosse assim, o direito à morte medicamente assistida deve cobrir situações limite: as que criam um sofrimento brutal e sem tréguas, acima do que é humanamente suportável. Nessas circunstâncias, a vontade de viver morre no corpo e sobra a humilhação: o homem que já fora tornou-se um ser sem alma porque a dor a consumiu. A brutalidade da situação, sentida e percebida no seu ponto máximo e sem quaisquer condições de retorno, reclama por piedade. E sim, às vezes são precisas “ajudas” para o pequeno salto para a eternidade. Esse passo tem de ser muito bem articulado e fundamentado. Mas é por aí que devemos caminhar, sabendo que nessas circunstâncias não há soluções perfeitas. Este é um tema fraturante e muito pessoal, mas não entendo que o PCP tenha tido uma intervenção tão “doutrinária” neste debate, muito próxima do que teve o CDS: juntos no voto e na obediência partidária. Foi clara a fratura com o Bloco, e a crispação entre as partes tem aumentado significativamente, desde as últimas eleições autárquicas. Não é grave nem invulgar a rivalidade entre partidos do mesmo espaço político, mas a forma como o PCP e o Bloco dirimiram as suas diferenças foi lamentável. O primeiro porque tratou o tema ao ritmo constitucional, num tom demasiado conservador para o meu gosto, o segundo porque se pôs no pedestal e tratou da coisa de uma forma arrogante, especialmente em relação ao PCP. Reduzir a alternativa ao direito à morte medicamente assistida através da extensão dos cuidados paliativos, continuados ou domiciliários é uma falácia porque há situações limite que reclamam uma atitude que encontre a vontade superior do doente, depois de convocada a legislação aprovada. O sofrimento dói de caraças. O sofrimento insuportável é o grau limite da capacidade de resistência. Pedir ajuda nessas circunstâncias deve ser respeitada e aplicada, conforme a lei. Quem tem um quadro familiar amigo, responsável e de confiança, saberá que pode contar com a ajuda a caminho da eutanásia se for caso disso ou, em alternativa, saberá procederá a aconselhamentos para que essa bomba atómica seja evitada ou nem sequer considerada. A vida sem vida não é vida. E não serve a ninguém. E, por isso, votarei favoravelmente o direito à morte medicamente assistida, se tiver oportunidade disso.


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