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02/01/18

NOVAS IDEOLOGIAS

Mário Martins





É importante não demonizar as ideologias, pois elas representam encruzilhadas a que a nossa humanidade vai chegando (…). Mas é fundamental que as ideologias se deixem criticar e complementar (…)


José Tolentino Mendonça

Revista E(xpresso) 2017-11-25


No seu estimulante artigo, Tolentino Mendonça defende que a época do fim das ideologias está a ser ultrapassada com a recomposição plural do mapa do território. Para o autor, cinco ideologias ganham cada vez mais espaço num cenário de fragmentação. Ei-las, com o atrevimento dos meus comentários (em itálico):

“Uma primeira é o trans-humanismo, que entende o ser humano como pura transição. Como tal, distingue três fases: a do ser humano (que é o ser humano nas suas condições naturais de origem), a do ser trans-humano (que é o ser humano alterado e melhorado nas suas capacidades por meio da técnica) e o ser pós-humano (um ser tão extraordinariamente alterado que já não pode ser classificado como humano, mas é um produto utópico da biotecnologia).”

Não temos escolha: não podemos escapar à força da curiosidade e ao desejo de melhorar e prolongar a nossa vida.

“Uma segunda ideologia é o animalismo, que aposta na implosão de qualquer diferença substantiva entre homem e animal. A diversidade é explicada unicamente como gradual ou acidental e não como ontológica. Nascem daqui as teses radicais que vão na linha de uma quase equiparação entre os direitos dos animais e os dos humanos.”

A diferença fundamental entre homem e animal (e o resto do mundo animado e inanimado) é a inteligência humana. Kant defendia que é a moral, mas esta não existe sem aquela.

“Uma terceira ideologia é o neurocientismo, que não se deve confundir com as neurociências. As suas raízes terão de ser procuradas no materialismo que encara o ser humano como uma espécie de máquina, com distintos componentes e estruturas que constituem um todo complexo, mas que não é capaz de verdadeira liberdade. Pelo contrário, onde julgamos que há uma acção livre, o que temos é um predeterminismo observável nos circuitos neuronais.”

Na medida em que as condições da existência (e a existência, ela-própria) são determinadas pela Natureza (ou, para os crentes, por Deus-es), nada ou ninguém é capaz de verdadeira liberdade. O livre-arbítrio humano é apenas aparente.

“Uma quarta ideologia é a teoria do género, que hoje se manifesta com reivindicações públicas, políticas e éticas de grande impacto. Nesta visão a condição sexual converte-se numa opção que se pode tomar e alterar, pois é parte da vontade humana escolher que condição sexual assumir.”

Independentemente do sexo com que nascemos, é a atracção sexual, seja ela qual for, ou a sua renúncia consciente, que comandam.

“Uma quinta ideologia reporta-se àquilo que Gianni Vattimo chamou pensiero debole (pensamento débil). Um dos seus traços é a consideração de que não há propriamente uma substância ontológica na nossa humanidade. Ela é sim um receptáculo que recebe estímulos de todo o tipo e que a vão configurando no tempo. Desse modo, nós somos o que lemos, o que comemos, o que consumimos. E a vida torna-se uma inevitável categoria líquida, onde o processo se sobrepõe à forma.”

O mundo é sentido e percebido de forma diferente por cada forma de vida e pelo homem. Os sentidos dão-nos a certeza do mundo que nos cerca mas é a inteligência humana que o interpreta e “transforma”. O homem é uma espécie de tradutor (logo, “traidor”) da realidade. Neste contexto, justifica-se uma ontologia, próxima de um inevitável antropocentrismo. 

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