Mário Faria
As eleições em França demonstram bem como vai a desordem político-partidária e como as suas estruturas são postas em causa por organizações emergentes, fruto da fractura social que decorre da intromissão das novas tecnologias no mundo do trabalho, da prevalência das redes sociais na formação da opinião, do efeito da globalização e das políticas neoliberais. O terrorismo e a xenofobia intrometem-se e o medo instalou-se: os muros e o fecho das fronteiras estão na agenda. A UE juntou muitos países com intenções diferentes, cada um jurando ser capaz de se ajustar ao modelo colectivo que se ia desenhando, mas sempre mais vocacionados para valorizar aquilo que mais os poderia beneficiar. O seu projcto aberto, civilizado e defensor do “estado social”, juntou povos com culturas muito diversas e com um potencial económico muito diferenciado. A coisa ia correndo normalmente e sem rupturas, até que o mundo entrou em colapso com a crise do subprime, a falência dos bancos e as dívidas soberanas. A partir daí, a UE nunca mais foi como dantes. E passou a ser uma saudade de uma coisa que se calhar nunca foi.
As eleições em França e na Alemanha prometem muito falatório. Serão o termómetro da UE e marcarão o seu futuro: a uma, duas ou três velocidades. Ou o seu descalabro. Na França já correu a primeira volta e Macron e Marie vão à luta para decidir quem vai ser Presidente. Em Portugal tem-se seguido o processo eleitoral de forma apaixonada. A queda brutal dos partidos tradicionais do sistema gera muita polémica, sobre o presente e o futuro. E o que devem fazer as esquerdas nestas circunstâncias. A profissão aconselhou-me, no quadro de decisões que integravam uma série de propostas bem diferenciadas, a definir ab-initio a que me parecia mais adequada e porquê, anotando cuidadosamente os princípios das minhas opções. Tive isso sempre em consideração em todas as discussões ou debates. Raramente vencia, mas dei sempre luta. No quadro das eleições francesas, confesso que o primeiro impulso foi que, se fosse francês ( e de esquerda como sou ), na segunda volta votaria Macron que me parece um rapaz desempoeirado, jovem, de mangas arregaçadas, amigo da Europa e adverso à xenofobia e ao nacionalismo exacerbado de Marie. Ultimamente, a nossa elite política de centro direita tem desancado forte e feio em Mélenchon porque este não deu indicações de voto para a segunda volta e entendeu o facto como uma forma de favorecimento à extrema-direita, seja pelo voto ou pela abstenção. Sobre este propósito, Tavares tem defendido algo muito semelhante, em nome do cosmopolitismo que Macron garante: repúdio a qualquer tipo de discriminação nacional, étnica, sexual e religiosa; pela defesa da globalização democrática e pela erradicação da pobreza. Tenho dúvidas e fico com urticária quando insistem neste tipo de loas, mas insisto: se me fosse dado o direito de participar nesta eleição continuaria a votar em Macron porque a Frente Nacional é uma ameaça muito séria, mas perfeitamente consciente dos “riscos” de sair enganado e não o faria com um espírito de missão e de confiança como quando votei em Mário Soares, também numa segunda volta.
E perceberia e respeitaria muito bem a abstenção.
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