StatCounter

View My Stats

01/04/16

O ESPELHO INTEIRO

António Mesquita





"O deserto é a única coisa que só pode ser destruída pela construção."

(Boris Vian)


Este deserto é o nada, e é uma abstracção. O construído, como uma cidade abandonada, pode também ser uma espécie de deserto. Mas Vian refere-se a uma cidade viva que só pode matar outra coisa viva que, neste caso, é o deserto real, que nada tem de abstracto. Eis um exemplo do jogo de palavras.

Este jogo pode alimentar uma discussão sem fim. Os defensores de pontos de vista diferentes nunca estarão, de facto, a falar da mesma coisa. 

Edgar Morin ("Le vif du sujet") elaborou uma teoria do sujeito individual que multiplica os efeitos babélicos da linguagem. Segundo ele (na linha de Freud), a unidade do sujeito é um mito. Todos somos duais (ou histéricos: desdobramo-nos num 'ego' e num 'alter ego') e temos múltiplas personalidades, conforme o contexto, os nossos interlocutores e a influência dos nossos 'génios' (o 'daimon' dos Gregos, a que Morin chama 'eloim'). No alto desta estrutura que assenta  no 'Inconsciente' e no 'id' psicanalíticos, temos ainda o Super Ego onde reside o poder do social. Para além disso, ignoramos tudo daquilo a que Morin chama de antropocosmologia, ciência ainda por fundar.

Este indivíduo estilhaçado parece à mercê de inúmeros demónios e potências. Como a rainha da Branca de Neve, precisamos do espelho inteiro que  nos minta completamente.

Eis um outro deserto.




Sem comentários:

View My Stats