Mário Faria
Os Estados Unidos iniciarão as operações militares no Golfo nos primeiros dias de Março, tudo estará terminado menos de uma semana depois, e então começará o processo de divisão do Iraque. É esta a previsão de Ali Abdulla Al-Khayat, analista político kuwaitiano, com ascendência iraquiana."Não há um único kuwaitiano que não queira ver Saddam derrubado", diz Al-Khayat, que viveu no país durante a ocupação iraquiana. "Nós só tivemos aqui as forças iraquianas durante nove meses. Imagine no Iraque propriamente dito. Os iraquianos vivem sob aquele regime há décadas. Também lá, não haverá ninguém que defenda Saddam Hussein. Mal comece a guerra, ele estará sozinho com algumas centenas de guardas pessoais". Ali Abdulla Al-Khayat, que estudou em Oxford e é hoje proprietário e gerente de uma empresa de consultadoria e que edita livros sobre o Kuwait, tem uma visão precisa sobre o que vai acontecer. "No Iraque, já ninguém tem dúvidas de que haverá guerra e qual será o resultado", diz ele, que se mantém em contacto com fontes iraquianas dentro e fora do país. "Neste momento, Saddam está num dilema: ou se recusa a destruir os mísseis Al Samoud, e haverá guerra, ou os destrói, e não terá com que se defender, se houver guerra. Mas ele acredita que os americanos farão a guerra em qualquer caso e por isso não destruirá os mísseis". O ataque começará a partir de 3 de Março, mas nessa altura Saddam já não estará em Bagdad. Estará escondido algures onde ninguém saberá, nem mesmo o filho Uday, em quem não confia. Kusay, o outro filho do Presidente, conhecerá o esconderijo, e será ele a conduzir as operações militares. O que é mais uma garantia de que a defesa será desastrosa, continua a previsão de Al-Khayat. Mal as bombas americanas comecem a cair, rebentará uma insurreição geral no Iraque. Vários grupos organizar-se-ão rapidamente para neutralizar as forças fieis ao regime. Em poucos dias, o comandante americano estará no poder em Bagdad e as várias milícias populares ter-se-ão colocado sob as suas ordens. O passo seguinte será a divisão do Iraque. Quando, no início do século XX, as potências coloniais conceberam os futuros países da região, tiveram em conta o potencial perigo do comunismo, que então começava. "Para conter a União Soviética, os estrategos da época acharam que seria conveniente ter grandes países a funcionar como tampão, a que chamaram mesmo cordão de segurança - o Irão, o Iraque, a Turquia", explica Al-Khayat. Segundo a sua teoria, a realidade hoje é diferente, a URSS desapareceu e os grandes países da região tornaram-se, eles mesmos, a ameaça." O Iraque não tem, hoje, armas de destruição maciça nem é um perigo para ninguém. Toda a gente sabe isso. Até nós, no Kuwait, que seríamos as suas principais vítimas. Mas é, mesmo assim, um perigo potencial. Principalmente, e mais directamente, para Israel". A razão é simples de compreender, segundo o analista. O Iraque é o único país árabe que reúne os três factores necessários para se tornar uma potência. "Tem em abundancia território, população e recursos. A Arábia saudita tem território e recursos. O Egipto tem população. Mas os três factores, só o Iraque". Por isso é necessário neutraliza-lo enquanto é tempo. Depor Saddam e dividir o país. Os curdos, acredita Ali Abdulla Al-Khayat, estão cada vez mais fortes, e não se contentarão com nenhuma espécie de federalismo. Se não for imediata, por causa da pressão da Turquia, a divisão do Iraque ocorrerá em breve, com a criação de um estado curdo e o resto dividido entre sunitas e xiitas. "Tudo isto com a 'ajuda' dos EUA, que se terão então posicionado para aquele que é o seu verdadeiro objectivo, na sua autodesignada guerra contra o terrorismo: o Irão". O país dos mullahs está prestes a possuir poder nuclear, acredita Al-Khayat. "Os reactores que está a construir para produzir energia facilmente se poderão converter em bombas atómicas. E se um dia o Hezbollah tiver acesso a essas bombas, vai usá-las, sem hesitação, mesmo sabendo que matará milhões de civis". O Irão é o verdadeiro ponto de encontro entre armas de destruição maciça e terrorismo. Pelo menos na perspectiva de Israel, que, segundo Al-Khayat, domina, com o seu poder financeiro, a política americana. "Esta é a verdadeira motivação dos americanos. Não o petróleo. Porque esse, os iraquianos forneciam-no de bom grado. Mesmo que os tivesse de o comprar. Ora isso é precisamente o que Saddam Hussein mais gostaria de fazer: vender o petróleo, para ganhar dinheiro. Não é preciso uma guerra para isso". Depois do Afeganistão, o Irão é então o verdadeiro objectivo militar dos EUA. O Iraque é apenas um meio. "Se observarmos o mapa, é fácil compreender que o Irão ficará completamente cercado. A Leste tem o Afeganistão e o Paquistão, que os americanos já controlam. A Norte, as repúblicas da Ásia Central, também cada vez mais dependentes dos EUA. A Oeste a Turquia e o único elo que falta... o Iraque".
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