StatCounter

View My Stats

01/05/15

EM VOLTA DO “SINOCOMUNISMO” (2)

Mário Martins


https://www.expressaopopular.com.br/livros/expressao-popular/
contribuicao-critica-da-economia-politica


Uma das razões porque a marxista Mylène Gaulard considera que a China é um país capitalista é a grande diminuição, nos últimos 35 anos, da participação do Estado no Produto Interno Bruto e na produção industrial. Deste ponto de vista, decerto que não poderá dizer o mesmo da Coreia do Norte. Mas como verá ela a relação dos trabalhadores com os meios de produção no vizinho do Império do Meio, lá onde existe a propriedade colectiva através do Estado dominado pelo Partido dos Trabalhadores da Coreia? Qual é, de facto, nestas relações de produção, a classe dominante? ou já não existem classes ou, pelo menos, luta de classes? E continuarão os marxistas de hoje a pensar, como Jean Elleinstein há 40 anos, que “o fenómeno estaliniano é um acidente do comunismo, e não um seu produto natural e, portanto, inevitável”? ou dão o devido valor à previsão da revolucionária polaco-alemã Rosa Luxemburgo, executada em 1919, da instauração pelo Partido Comunista de uma ditadura totalitária na Rússia?

Na célebre passagem do prefácio da sua obra “Contribuição para a Crítica da Economia Política”, de 1859, Marx defende que “Em certo estádio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que é a sua expressão jurídica, com as relações de propriedade no seio das quais se tinham movido até então. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se no seu entrave. Surge então uma época de revolução social (…)”. Cabe aqui dizer que, neste contexto, Marx analisa todos os modos de produção e não espera pelo fim do capitalismo para o criticar. Por que razão o marxismo actual apenas usa este axioma para criticar o capitalismo e não também as experiências socialistas do século XX? No entanto, é muito provável que a famosa burocracia socialista se tenha constituído num entrave ao desenvolvimento das forças produtivas e conduzido o sistema à ruína, hipótese que explicaria a abertura económica encetada pelo regime chinês.

Toda a experiência acumulada do mundo ensina que, por via de regra, a concentração do poder conduz fatalmente a abusos e a crimes, seja em que sistema ou regime for, mas como o marxismo é optimista quanto à natureza e à evolução humanas e determinista quanto à consciência social*, falha na análise da questão central do exercício do poder.

Mais do que denunciar que a China é, afinal, um país capitalista travestido de socialista/comunista, o que se exige a um marxismo fundamentado nos factos e que se reclama de um método científico de análise da realidade, é dizer-nos o que é que permanece válido na teoria face ao fracasso das experiências socialistas e às mutações do capitalismo. Em última análise precisamos de saber como é que o sistema chinês deveria ser, e os meios de lá chegar, para os centros de estudo marxistas de hoje o considerarem socialista ou comunista.

*O modo de produção da vida material condiciona o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu ser social que, inversamente, determina a sua consciência (Prefácio da Contribuição para a Crítica da Economia Política).


Sem comentários:

View My Stats