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01/12/13

VAI, ALEXANDRA

Alcino Silva


O encanto nasceu há muito, ao longo dos anos, através das suas crónicas e reportagens, mas evoluiu em grandeza com histórias como a de Taha Ali, nas terras milenares de Nazaré. Pelas suas palavras conhecemos vivências dramáticas, pungentes, mas também carregadas de idealismo e romantismo, nesse colorido espantoso que é o mundo. Em Oriente Próximo, sentimos o pulsar da Palestina, a dor da perda, o drama da miséria humana, não apenas económica, mas sobretudo do quadro mental de uma sociedade judaica, religiosa, fanática, violenta e essencialmente impune nos seus crimes e na sua incapacidade de convivência com o resto da Humanidade. Percorremos Jerusalém, escutamos esse chamamento para a oração que parece soltar ao vento o pôr-do-sol, escutamos e sentimos essa barreira quase intransponível nos montes e colinas de oliveiras e laranjais.Em o Caderno Afegão abeiramo-nos duma Idade Média tribalista, guerreira e que ao nosso longínquo olhar, aparece como obscurantista e atemorizadora. Num território submerso numa guerra que parece eterna, um país invadido, um povo que resiste, talvez sem saber para onde vai ou como vai. As montanhas agrestes e nuas, Kandahar debaixo de fogo, Herat dos senhores da guerra e já a caminho de Cabul, o lago de águas com essa cor esmeralda como uma luz em ambiente desolador. Nos antípodas territoriais, Viva México leva-nos sempre entre a natureza e a cultura, mas não conseguimos olvidar a violência de Hérnan Cortéz um desses civilizados europeus que em nome da cruz, de uma qualquer, deu início a um dos maiores genocídios da História e o território mexicano parece viver ainda hoje esse traumático tempo de violência com as suas maquiladoras, os seus barões da droga, os seus políticos corruptos, a sua democracia envenenada a gerar ondas de emigração e pobreza. E no entanto, sentimos a estatura de uma cultura marcante, poderosa e evoluída. E no percurso desta grandiosa viagem que nos vem proporcionando trouxe-nos em tempo de Primavera, um momento de romance e de amor em A Noite Roda, através do qual nos mostra os sentimentos humanos rodando dentro e através dos personagens, e como também no mundo dos afectos, somos capazes de descer do mais elevado ao mais baixo quando conseguimos esquecer o outro em nome de nós próprios.Tahrir foi um pequeno intervalo na chegada do que ansiávamos, uns dias entre o sobressalto egípcio que colocou um comboio em movimento cujo destino ainda não conhecemos. Por fim, com o Outono adiantado, o nº 2 da Granta anunciou a chegada e dias depois numa visita à Bertrand pudemos iniciar a leitura de Vai, Brasil. Alexandra Lucas Coelho, jornalista, escritora, leva-nos agora em navegação por esse imenso e colorido território que é o Brasil, essa vastidão de terra, de floresta, de água, de praias e montanhas, de climas diversos, de gentes, colectiva e individualmente com os seus sucessos, as suas desgraças, os seus dramas, as suas esperanças, o seu actual questionar da história, a reivindicação de terem uma palavra no seu futuro que se vai construindo, ou desconstruindo, no presente. ALC não se limita a contar o que ouve, o que vê, diz-nos o que sente, traz-nos, mais do que os sons, a vida desses sons. Sentimos nas suas palavras, o pulsar da Amazónia, a miséria do Maranhão, a tranquilidade de Aiuruoca, mergulhamos no interior das favelas, escutamos os lamentos de quem vive, os gritos de alarme, a música que se solta como um acto mágico desses seres tropicais, compreendemos a dimensão do Rio, o dinamismo de S. Paulo e quando já tudo parecia visto, leva-nos a Porto Alegre. É difícil descrever o entusiasmo, a alegria, o dinamismo que nos faz viver através das suas crónicas, as quais não se sentem como tal neste livro acabado de dar à estampa, mas antes como uma viagem, uma jornada contínua. ALC deixa-nos sempre suspensos nessa interrogação dequerer saber onde a iremos encontrar da próxima vez, ou dito de outra maneira, onde nos levará de seguida e o sentimento com que nos cativa nos seus relatos, fazem-nos incentivá-la a que prossiga, que nos leve a outros lugares, a outras gentes, a culturas que pela diferença nos enriqueça ainda mais, daí que nos sentimos tentados a usar o título deste seu último livro para lhe dizer, Vai, Alexandra e continua a trazer-nos o mundo que nos rodeia, que acreditamos conhecer, mas que nos chega sempre mais vasto, mais rico, mais enternecedor, nas suas palavras.

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