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Nestes últimos meses os meios de comunicação têm dito e publicado muita coisa sobre a crise financeira que as economias de vários países estão a sofrer. As notícias e os comentários que as acompanham referem-se fundamentalmente sobre a situação da banca dos EUA, resultante do chamado “subprime”, e, também, sobre bancos em dificuldades na Inglaterra, na França, na Dinamarca e na Alemanha que já passaram ao esquecimento da maioria das pessoas.
Notícias sobre as ladroagens, mentiras e falsificações contabilísticas e outras efectuadas nas empresas pelos seus responsáveis com as conivências dos respectivos órgãos de fiscalização, das empresas de auditoria e das entidades reguladoras e supervisoras praticamente não existem nos meios de comunicação.
Notícias sobre os trabalhadores despedidos em consequência dos processos de falência e de fusão e sobre a sua situação também não existem nos meios de comunicação.
Os milhares de trabalhadores que têm sido lançados no desemprego não são só trabalhadores do sector financeiro, mas também da industria, do comércio e outros serviços, pois a crise não é só financeira mas também económica, social e política.
Os nossos governantes, banqueiros e fazedores de opinião, através das televisões, dos jornais e das rádios, declararam durante muito tempo que a nossa economia estava a crescer e a consolidar-se e que as nossas instituições financeiras (bancos) eram sólidas, e que existiam entidades de supervisão que estavam atentas.
Entretanto os problemas aprofundaram-se tão rapidamente que os tais fazedores e manipuladores de opinião não têm vergonha de darem o dito pelo não dito, tentando vender com aparente naturalidade opiniões, nas quais eles próprios já não acreditam.
Curioso é que a actividade seguradora, aparentemente, passou ao lado destas notícias todas até à falência da maior seguradora do mundo, a AIG, que teve repercussões directas em Portugal. Na verdade, os portugueses investiram nesta seguradora mais de sessenta milhões de euros, não considerando os fundos nacionais que investiram em acções da mesma. É uma situação preocupante, apesar do ISP ter garantido a recuperação dos investimentos efectuados.
Fora isto, o sector de seguros passou novamente ao esquecimento. Mas deve merecer toda a nossa atenção.
Segundo Ruy de Carvalho, no texto “Seguros: que poder?”, pag. 232, da obra “ Ciência e Cidadania – Homenagem a Bento de Jesus Caraça”, publicada pela Imprensa de Ciências Sociais, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, o sector de seguros « tem um poder económico e financeiro relevante, visto que o sistema segurador é o maior investidor institucional , dentro da área da OCDE. Não se esqueça que, directa ou indirectamente, o seguro intervém fortemente na gestão dos fundos de pensões, cuja importância cresceu significativamente com o aparecimento das soluções da previdência privada.
O seguro tem, portanto, o poder que lhe confere a sua posição nos mercados financeiros. No caso português, a carteira total de investimentos do sector segurador elevava-se a 4,5 mil milhões de contos, no fim do exercício de 2000. Tem ainda o poder próprio de um prestador de serviços específicos à comunidade, destacando-se a sua contribuição para a estabilidade económica e emocional dos demais sectores de actividade e dos clientes individuais».
Sabendo-se que historicamente a exploração técnica da actividade seguradora é tendencialmente deficitária, quer dizer que os resultados das seguradoras são obtidos fundamentalmente das suas aplicações financeiras.
Será que os balanços das seguradoras vão reflectir nos respectivos mapas de investimento a realidade das cotações dos mercados nacional e internacional ou os valores de cotação vão ajustar-se aos respectivos valores de balanço? Perante o fenómeno da globalização e da liberdade de circulação de capitais, que responsabilidades têm os organismos de supervisão e de fiscalização e os gestores nacionais na organização e nas políticas de investimento de seguradoras multinacionais?
A contabilidade chamada criativa existe há muitos anos na actividade seguradora para apresentação de resultados, ora positivos, ora negativos. Estes serviam para justificar o aumento dos prémios dos seguros. Aqueles para a distribuição dos dividendos engrossados com os aumentos dos prémios. Antes do 25 de Abril era uma situação generalizada. Com as nacionalizações essas práticas foram interrompidas. Hoje, os gestores não têm nada a aprender com os gestores das grandes empresas que surpreendentemente faliram. As pressões que sofrem para a apresentação de resultados para permitir a remuneração dos capitais segundo rácios estabelecidos e para cumprirem objectivos de crescimento sob pena de não receberem chorudas gratificações, são grandes estímulos para a sua criatividade, levando-os a não cumprirem normas legais, não anulando contratos anulados, não anulando recibos de contratos anulados, não emitindo estornos, alterando provisões de sinistros, vendendo a terceiros créditos incobráveis que serão diluídos em exercícios posteriores, o branqueamento das contas correntes de resseguradores, não contabilizando nos respectivos exercícios grandes sinistros, compra de bens do imobilizado paga com produtos financeiros para aumentar os valores das vendas a resgatar em exercícios seguintes. O património imobiliário, que constitui uma parte ainda significativa das reservas obrigatórias, na sua generalidade, está ao abandono, contribuindo para o envelhecimento dos centros das grandes cidades, principalmente de Lisboa e do Porto, Não há restauros nem reparações nem investimentos, pois os cabedais são poucos e todos necessários para pagar dividendos aos accionistas, e prémios aos gestores. São milhões de euros que todos os anos saem para o estrangeiro, desta forma. Portugal é, assim, espoliado das suas riquezas, condenando-se ao empobrecimento e abandono.
Fala-se na necessidade de aumentar os mecanismos de regulação e fiscalização. A legislação existente é mais do que suficiente para acompanhar de muito perto a vida das empresas. O problema é a falta de vontade política de aplicar a legislação vigente. Toda a gente sabe que os lugares dos órgãos de fiscalização são preenchidos quase sempre por pessoas sem competência, sem preparação e sem independência perante o real poder na empresa. As empresas de auditoria, tal como aquelas que tinham essas funções nas empresas que faliram nos EUA e na Itália, pretendem continuar a facturar pelo que não têm a necessária isenção e às vezes competência em virtude de muito do seu trabalho ser efectuado por estagiários sem experiência. As Comissões de Trabalhadores que pela Constituição da República Portuguesa têm competências de acompanhamento e de fiscalização são relegadas e desrespeitadas, quando deveriam ter uma papel fundamental
Algumas seguradoras estão fragilizadas, prontas a serem vendidas.
A grave crise económica-financeira, social e política que o mundo está a viver vai provocar grandes transformações mundiais. Será que muito brevemente vamos assistir a grandes transformações no sector de seguros, tanto a nível nacional com a nível internacional com reflexos em Portugal?
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