"Dai-me um desejo preciso, e eu derrubarei o mundo."
E.M. Cioran
As várias peles de que nos revestimos podem retirar-se uma a uma, as dimensões que nos constituem, desde a linguagem à política e ao social podem ser percorridas pela sonda estatística, mas onde encontraremos o molusco dentro da casca com a explicação do essencial?
O nosso comportamento e o dos que conhecemos não se saberia "ler" sem uma escala do tempo.
Para falar só na política, todos mudámos. Mesmo se alguns parecem estar no mesmo sítio e não ter dado pela queda dos impérios, estão já noutro lugar e o seu discurso assume um novo e anómalo sentido.
Os corpos têm também outro peso. Estão carregados de terra. A agilidade dos pés correspondia às asas do pensamento, mesmo se fossem ilusões o seu motor.
Repetimos, mesmo sem palavras, uns com os outros, o drama ou a comédia de que o "ar do tempo" é o ponto. O ar do tempo impregna-nos e está em todos os nossos gestos e olhares, tanto que as palavras, às vezes, como sentinelas abandonadas pela guarnição ficam ridiculamente expostas.
E se toda esta mudança, este período de paragem, de estagnação, se quisermos, se medisse pelo desejo ou pela sua falta?
O desejo é a plataforma de Arquimedes, a força que traz a montanha para junto do profeta.
O desejo da Revolução, por exemplo. Era ele que explicava o entusiasmo, a abnegação, a vergonha por se pretextar quaisquer outros interesses ou prioridades, o desejo como incorporação e alucinação das ideias.
Não é essa ausência que denunciamos nos mais ínfimos detalhes?
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