Mário Martins
"O que o Estado pagou a mais às PPP (900 milhões de euros em 2011) só é possível porque a sede da política - Assembleia da República - está transformada num centro de negócios."
Paulo Morais
Vice-presidente da Associação de Integridade e Transparência
Diário de Notícias, 2Maio2013
“Dos 230 deputados à Assembleia da República, 117 estão em regime de part-time, acumulando as funções parlamentares com outras actividades profissionais no sector privado (…). Em diversos casos, prestam serviços remunerados a empresas que operam em sectores de actividade fiscalizados por comissões parlamentares que os mesmos deputados integram. Noutros casos exercem cargos de administração ou fornecem serviços de consultoria a empresas que beneficiam, directa ou indirectamente, de iniciativas legislativas, subsídios públicos ou contratos adjudicados por entidades públicas (…).
Sabia que as subvenções vitalícias dos políticos foram criadas numa altura em que Portugal estava sob assistência financeira do FMI? Que foram alvo de um veto presidencial? Que duplicam de valor quando o beneficiário alcança os 60 anos de idade? Que, apesar de terem sido revogadas há 8 anos, o número de beneficiários continua a aumentar? Que a identidade dos beneficiários passou a ser secreta? Ou que há políticos que a requereram com idade inferior a 50 anos?
Contra-capa de “Os Privilegiados”, de Gustavo Sampaio
Editora “a esfera dos livros”, Julho2013
Com os discursos inaugurais do costume está aí mais uma rentrée política. Como a palavra francesa também quer dizer “reabertura dos teatros no começo do ano dramático”, vamos assistir e, ao jeito de cada um, participar em mais uma temporada da comédia em que se tornou a democracia portuguesa, há vários anos no cartaz. E no entanto era preciso qualquer coisa de fresco, qualquer coisa com o sentido com que Nanni Moretti, no seu filme Aprile, grita para o ecrã da televisão (onde decorria um debate com Berlusconi) “D’Alema, diz uma coisa de esquerda, diz uma coisa mesmo que não seja de esquerda, de civilidade, diz qualquer coisa, reage!”. A sociedade portuguesa devia reagir à imoralidade e ao descrédito que assolam a “casa da democracia” e o “arco da governação”. Há cerca de um ano, segundo uma sondagem da Universidade Católica, 87% dos portugueses afirmavam-se desiludidos com a democracia. Isto quer dizer, como uma leitura literal sugere, que estão desiludidos com os princípios da democracia, ou quer dizer, como uma leitura em busca do sentido exige, que estão desiludidos com o modo como os princípios da democracia são ou não aplicados? Ou quererá dizer antes, numa leitura mais complexa, que não acreditam que o regime democrático possa funcionar melhor? No tempo do socialismo soviético, a propaganda do regime sustentava que o socialismo só podia ser o que existia, o “socialismo real”, como lhe chamou. Esta propaganda, aplicada à democracia, só poderia conduzir à ditadura. Mas a existência de democracias mais próximas do ideal democrático, como é o caso das nórdicas, mostra que, afinal, a alternativa à “democracia real” é a luta perseverante pela aplicação dos princípios democráticos.
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