António Mesquita
Franz Kindler é um nazi fugido à justiça e levando uma vida dupla, sob um nome falso,
em Harper, uma cidade de província na América.
Quando um antigo camarada, Meinikef, que 'não foi
enforcado como os outros' atravessa o Atlântico à sua procura ( como no coração
ciumento da Tosca se abrigava Scarpia, o Intendente, Meinike leva a polícia na
sua peugada).
Mas o grande segredo que o camarada de partido tem para
transmitir a Franz é o da sua própria conversão. Meinike tornara-se um homem
religioso 'no primeiro grau' e pede ao camarada de armas que ajoelhe ao seu
lado e se confesse.
Franz, que momentos antes desiludira o amigo dizendo-lhe com
toda a convicção que esperava uma outra guerra,
decide, ainda com os joelhos em terra e repetindo a ladainha do outro,
desfazer-se dele, porque agora representava para si uma séria ameaça.
Os cinéfilos terão adivinhado o início dum filme,
considerado menor, de Orson Welles: "The Stranger"(1946). Franz acabará por ser despistado por uma
verdadeira raposa (Edgar G. Robinson) e encontrará a morte caindo do campanário
da igreja, quando tentava precipitar a mulher com quem ali celebrara o seu
casamento de camuflagem.
A imagem dessa queda corresponde à do seu próprio sucesso
social, casado com a filha do juiz e perfeitamente integrado na comunidade
(excepto quando lhe 'puxam pela língua' e o levam a declarar algumas das suas
perniciosas ideias, mas que são desvalorizadas pelo contexto).
Um povo pragmático e sem passado (durante um tempo foram
assim os Americanos, mas a tecnologia faz-nos correr novos e maiores riscos)
tende a cair em logros como o do professor Franz.
O passado, para Franz Kindler, era representado por
Meinike, mas regressava travestido pelo discurso piedoso. O seu orgulho via-se
confrontado com a ideia do arrependimento que lhe era absolutamente estranha. E
Franz matou para afastar um perigo iminente, mas só para selar o seu destino.
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