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01/10/12

O ESTRANHO

António Mesquita





Franz Kindler é um nazi fugido à justiça  e levando uma vida dupla, sob um nome falso, em Harper, uma cidade de província na América.

Quando um antigo camarada, Meinikef, que 'não foi enforcado como os outros' atravessa o Atlântico à sua procura ( como no coração ciumento da Tosca se abrigava Scarpia, o Intendente, Meinike leva a polícia na sua peugada).

Mas o grande segredo que o camarada de partido tem para transmitir a Franz é o da sua própria conversão. Meinike tornara-se um homem religioso 'no primeiro grau' e pede ao camarada de armas que ajoelhe ao seu lado e se confesse.

Franz, que momentos antes desiludira o amigo dizendo-lhe com toda a convicção que esperava uma outra guerra,  decide, ainda com os joelhos em terra e repetindo a ladainha do outro, desfazer-se dele, porque agora representava para si uma séria ameaça.

Os cinéfilos terão adivinhado o início dum filme, considerado menor, de Orson Welles: "The Stranger"(1946).  Franz acabará por ser despistado por uma verdadeira raposa (Edgar G. Robinson) e encontrará a morte caindo do campanário da igreja, quando tentava precipitar a mulher com quem ali celebrara o seu casamento de camuflagem.

A imagem dessa queda corresponde à do seu próprio sucesso social, casado com a filha do juiz e perfeitamente integrado na comunidade (excepto quando lhe 'puxam pela língua' e o levam a declarar algumas das suas perniciosas ideias, mas que são desvalorizadas pelo contexto).

Um povo pragmático e sem passado (durante um tempo foram assim os Americanos, mas a tecnologia faz-nos correr novos e maiores riscos) tende a cair em logros como o do professor Franz.

O passado, para Franz Kindler, era representado por Meinike, mas regressava travestido pelo discurso piedoso. O seu orgulho via-se confrontado com a ideia do arrependimento que lhe era absolutamente estranha. E Franz matou para afastar um perigo iminente, mas só para selar o seu destino.

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