António Mesquita
"Praticamente, os conhecimentos da Sra. Varian sobre
literatura estavam confinados ao 'New York Interviewer'; como ela muito
justamente dizia, depois de se ler o 'New York Interviewer', toda a fé na
cultura se perde. A sua tendência em relação a isto, era mais precisamente,
manter o 'Interviewer' fora do caminho das suas filhas; estava determinada a
educá-las correctamente, e elas não liam nada."
"The Portrait of a Lady" (Henry James)
O sentimento de protecção da Senhora Varian em relação às
suas filhas faz-me lembrar certas paranóias que associam o sexo e a higiene e
cujo objecto é defender-se a si, ou aos mais chegados, das infecções do
exterior.
Mas, como é sabido, é essa mesma "protecção"
que inibe o organismo de adquirir as suas próprias imunidades, correndo um
risco normal nos seus contactos com o mundo.
Os leitores dum único jornal, ou duma única opinião, lêem
aquilo de que gostam, mas acabam por não recomendar aos filhos o que lêem,
visto que todas as restantes opiniões são apresentadas a uma luz que só
favorece a misantropia.
A revolução tecnológica (a única que não tem detractores
e nem precisa que se acredite nela, porque é um facto que se mete pelos olhos
dentro) dispensou os pais que pensam como a personagem de James de esconder dos
filhos o seu jornal favorito. De qualquer modo, já não é espontaneamente (mas
foi-o alguma vez?) que estes procuram a leitura.
Contudo, veja-se a que se reduz a "grande
diferença" entre as filhas da Sra. Varian que eram dissuadidas de ler e
mantidas na "ignorância" e os novos avessos-à-leitura que têm toda a
informação possível à sua disposição (se quiserem olhar para um écrã), mas não sabem
mais por isso, porque a todos é preciso formar o juízo próprio. A penúria e a
fartura têm, neste caso, o mesmíssimo efeito.
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