A nacionalização é um pecado segundo a cartilha da direita. Menos estado e melhor estado fazia (?) parte da doutrina. As privatizações ou a gestão privada prometiam todas as oportunidades, como se fossem receitas milagrosas. A queda do muro alargou os seguidores do deus mercado que, como todas as coisas simples, enquadraria todas as soluções justas para empresários, trabalhadores, produtores e consumidores.
E deve haver alguma verdade nisso, porque no sector privado não há greves. No sector público - vocacionado para a prestação de serviços sociais – o descontentamento alastra: no ensino, na saúde, na justiça, na administração interna, nos transportes e contempla na mesma luta todos os prestadores de serviços do Estado : contínuos, professores, mestres, doutores, juizes, magarefes, escriturários e magistrados. Todos do mesmo lado da barricada, como se os interesses e as perspectivas unissem umbilicalmente esse caldo tão variado de pessoas num registo homogéneo contra o Estado e o Governo da República.
Para o ensino, por exemplo, basta seguir o modelo de Arte Duncan ( o homem escolhido por Obama) uma competência em matéria de educação que criou um novo modelo : as “charter schools” que são escolas públicas cuja gestão é atribuída a entidades privadas, com e sem fins lucrativos, por contrato. A autonomia é total e o acesso é livre. Basta seguir o guião e temos o problema do ensino resolvido em Portugal.
É certo que os governos, não raramente se põem a jeito, mas dos demais trabalhadores (e sindicatos) só ouvimos queixumes públicos ou publicados, quando as empresas fecham e saem para o desemprego dezenas de trabalhadores. Mas, também nessas situações não falta quem aponte o dedo ao Estado: não há regulação nem fiscalização, a escola não prepara os licenciados e os técnicos para as exigências profissionais, a produtividade é baixa, os juros são altos, a energia anda pela hora da morte, as opções macro económicas um conjunto de equívocos que atrasa o desenvolvimento, o investimento privado e o empreendorismo.
É a insularidade, a interioridade, o centralismo, as obras públicas, os desvios orçamentais, os projectos faraónicos, as faltas no parlamento : uma desgraça. O Estado está pelas horas da morte.
Ao contrário, no sector privado centram-se todas as energias : são a locomotiva da Nação. Não fora o sector financeiro, comercial, industrial, agrícola, dos serviços e as pequenas, médias e grandes empresas em que as coisas se complicaram em função da crise internacional, e tudo estaria a funcionar sobre rodas. A culpa primeira, contudo, só pode ser do governo, que não soube prever os acontecimentos e aplicar os antídotos necessários. Já havia crise antes dela chegar, e o que foi feito : zero !
A nacionalização das dívidas do BPN e do BPP fazem parte do receituário keynesiano, uma espécie de “New Deal” com sotaque luso. Há quem defenda o contrário – que as ervas daninhas são para cortar - e há quem preveja que o paradigma do desenvolvimento tem que passar por novos modelos, que nesta fase precisam de mais estado. Ou seja: nacionalizações em todo o sector financeiro para garantir confiança e muito investimento público, pois sem uma coisa e outra a economia real não funciona, porque a virtual essa felizmente vai de boa saúde. Quando a casa estiver arrumada volta tudo à primeira forma, com o primado da iniciativa privada a tomar conta daquilo que lhe pertence por inerência, até que surjam outras donas brancas, com esquemas irresistíveis neste admirável mundo da ganância.
Dizem-nos que a crise é sistémica e tem que haver um novo paradigma. Falam, falam, mas não explicam como, quando, onde e com quem. O que me espanta é como uma dúzia de financeiros – sem estarem conluiados – conseguiram que esta crise fosse de dimensão global. Um emaranhado de interesses que se liga de forma desconexa e que tem por centro as maiores praças financeiras. É assustador pensar que o sistema afinal é tão frágil. Demasiado frágil diria e facilmente canibalizado, como se verifica. Vamos ficar à espera das receitas dos famosos do costume que sabem tudo sobre esta “porcaria”, como a evitar e como sair dela.
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