"A indiferença cresce. Em lado algum o fenómeno é tão visível como no ensino, onde, em poucos anos, com a velocidade de um relâmpago, o prestígio e a autoridade dos docentes desapareceram quase por completo. Hoje o discurso do Mestre encontra-se banalizado, dessacralizado, em pé de igualdade com o dos media, e o ensino é uma máquina neutralizada pela apatia escolar, feita de atenção dispersa e de cepticismo desenvolto ante o saber."
"A Era do Vazio" (Gilles Lipovetsky)
Perante este desinteresse pelo saber, "torna-se necessário inovar a todo o custo: sempre mais liberalismo, participação, investigação pedagógica, e o escândalo está nisso mesmo, porque quanto mais a escola se põe a ouvir os alunos, mais estes desabitam sem ruído nem convulsões esse lugar vazio." (ibidem)
Esse desinteresse e apatia são a experiência diária dos professores, para não falar das descargas de agressividade que o acumular do tédio às vezes desencadeia. Conhecer o povo escolar é, pois, de extrema necessidade.
E, porque os técnicos já sondaram o fundo da criatura, é que chegaram à conclusão que os exames e uma verdadeira avaliação do saber trariam à luz do dia a falência completa do sistema de ensino.
Porque, de facto, o meio em que crescem os futuros alunos é o duma inversão do saber tradicional: é o neto que ensina o avô a manusear o último gadget e que, quando chega à escola, está convencido de saber mais sobre os computadores do que a sotôra.
Claro que a sua competência é sobretudo lúdica e que o que está por detrás da excitação dos ecrãs é-lhes tão transcendente como as "Quatro Moradas Sublimes" do Brahma-Vihara. Tudo o que a palavra saber designou até aqui, como teoria ou prática, não encontra nos seus órgãos receptores o necessário apoio moral.
E, assim como a criança dos esquálidos reformatórios de Dickens era a carne que a Revolução Industrial pedia para os seus fornos, a família moderna, em crise de autoridade, proporciona o ambiente propício a outro tipo de atenção e de inteligência conformes à revolução mediática, em que o ritmo da música e a perda de importância do real, face ao mundo das imagens desempenham um grande papel.
Sabemos hoje tão pouco do futuro que nos reserva este império da "informação e da expressão", característico do pós-moderno, segundo Lipovetsky, como os pioneiros do século XVIII sabiam das consequências da Revolução Industrial.
Tudo o que temos para responder a este desafio, em grande parte desconhecido, é o recurso a soluções que funcionavam noutro contexto.
Mais rigor no ensino e na avaliação apressarão a mudança da nossa percepção da realidade, tornando-nos mais conscientes das oportunidades.
Mas estamos ainda na fase de esconder as misérias. E o duelo entre o ministério e os docentes é o melhor sinal disso.
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