Na minha opinião, nós devemos despersonalizar Deus, tal como a nova física nos diz que é preciso desmaterializar a matéria. Para mim, não existe no nosso vocabulário, para designar a entidade que assim emergirá, melhor termo do que “última realidade”.
Christian de Duve
1. Se não houvesse outros elementos ou aspectos a ter em conta, teria logicamente concluído a primeira parte deste artigo com a afirmação da probabilidade da existência de Deus. Mas o desenvolvimento da física teórica, em geral, e da mecânica quântica, em particular, não só acabou com o optimismo do fim da física que se vivia em fins do século XIX (após a recente descoberta das leis da força electromagnética), como veio mostrar que a realidade é mais complexa e, mais do que isso, viola o senso comum.
2. Os horizontes da física teórica têm-se expandido de tal modo que há quem sustente mesmo que estão a ultrapassar a fronteira da ciência, devido ao facto de algumas afirmações, para lá da sua coerência interna, não serem previsivelmente testáveis. Essa ousadia da física teórica significaria, assim, uma espécie de retorno à racionalidade pura da filosofia, embora servido pela lógica matemática… E que dizer da estranheza que a mecânica quântica (a qual descreve o mundo atómico e sub-atómico das partículas elementares) provoca nos próprios especialistas, levando-os a considerarem que “quem afirmar que a compreende totalmente, mostra que de facto não a compreendeu”?...
3. Uma das consequências da nova física do século XX foi, precisamente, a crise do conceito de universo. Desde então que se sucedem vários modelos teóricos do universo, do "universo imóvel" (força da gravidade = força centrífuga), ao "universo inflacionário" (força da gravidade < força centrífuga = big freeze ) ou ao "universo colapsante" (força da gravidade > força centrífuga = big crunch), passando pelo “universo oscilante” (expande-se e contrai-se, sucessivamente), mas foi com o surgimento do modelo teórico da existência de um número infinito de universos paralelos, com as suas próprias leis físicas, que o conceito de universo baixou de nível, deixando de significar a totalidade da realidade física (incluindo a desconhecida), para ser apenas o nosso universo (o qual teria brotado de outros universos). Nascia, assim, o multiverso.
4. Como se isto não bastasse, surgiram novos dados que apontam para que o universo seja constituído por 73% de energia negra, 23% de matéria negra e por uns modestos 4% de matéria visível. Energia e matéria negras (do espaço vazio!..., e que seriam responsáveis pela força centrífuga)) porque são invisíveis e, também, porque ninguém sabe o que são…
5. Tudo isto é muito estranho (o universo, no dizer do biólogo teórico J. B. S. Haldane, “não é só mais estranho do que nós supomos; é mais estranho do que nós podemos supor”), como estranho é, por exemplo, o facto de o mesmo estar a expandir-se quando, por definição, o espaço-tempo nasceu com ele no famoso big bang (sem espaço prévio como ou em que meio se expande?), pelo que só posso concordar com a reclamação sensata de Carl Sagan de que “hipóteses notáveis, exigem provas notáveis”…
CONTINUA
Sem comentários:
Enviar um comentário