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01/05/12

A PENÚRIA E A FARTURA

António Mesquita


"Praticamente, os conhecimentos da Sra. Varian sobre literatura estavam confinados ao 'New York Interviewer'; como ela muito justamente dizia, depois de se ler o 'New York Interviewer', toda a fé na cultura se perde. A sua tendência em relação a isto, era mais precisamente, manter o 'Interviewer' fora do caminho das suas filhas; estava determinada a educá-las correctamente, e elas não liam nada."

"The Portrait of a Lady" (Henry James)




O sentimento de protecção da Senhora Varian em relação às suas filhas faz-me lembrar certas paranóias que associam o sexo e a higiene e cujo objecto é defender-se a si, ou aos mais chegados, das infecções do exterior.

Mas, como é sabido, é essa mesma "protecção" que inibe o organismo de adquirir as suas próprias imunidades, correndo um risco normal nos seus contactos com o mundo.

Os leitores dum único jornal, ou duma única opinião, lêem aquilo de que gostam, mas acabam por não recomendar aos filhos o que lêem, visto que todas as restantes opiniões são apresentadas a uma luz que só favorece a misantropia.

A revolução tecnológica (a única que não tem detractores e nem precisa que se acredite nela, porque é um facto que se mete pelos olhos dentro) dispensou os pais que pensam como a personagem de James de esconder dos filhos o seu jornal favorito. De qualquer modo, já não é espontaneamente (mas foi-o alguma vez?) que estes procuram a leitura.

Contudo, veja-se a que se reduz a "grande diferença" entre as filhas da Sra. Varian que eram dissuadidas de ler e mantidas na "ignorância" e os novos avessos-à-leitura que têm toda a informação possível à sua disposição (se quiserem olhar para um écrã), mas não sabem mais por isso, porque a todos é preciso formar o juízo próprio. A penúria e a fartura têm, neste caso, o mesmíssimo efeito.

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